Pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso suspendeu o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4983, ajuizada no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contra a Lei 15.299/2013, do Estado do Ceará, que regulamenta a vaquejada como prática desportiva e cultural.
Na ação, o procurador-geral alega, em síntese, que a vaquejada, inicialmente associada à produção agrícola, passou a ser explorada como esporte, e que laudos técnicos comprovariam danos aos animais.
Voto do relator
Ao votar pela procedência do pedido, o relator da ação, ministro Marco Aurélio, afirmou que o caso é de conflito de normas constitucionais sobre direitos fundamentais. De um lado, está o artigo 215 da Constituição Federal, que garante a todos o pleno exercício dos direitos culturais, de outro, a proteção ao meio ambiente, assegurada pelo artigo 225 da Carta.
No entanto, o ministro salientou que o dever geral de favorecer o meio ambiente é indisputável. “A crueldade intrínseca à vaquejada não permite a prevalência do valor cultural como resultado desejado”, disse. Segundo explicou o relator, o boi, inicialmente, é enclausurado, açoitado e instigado a sair em disparada. Em seguida, a dupla de vaqueiros montados a cavalo tenta agarrá-lo pela cauda. O rabo do animal é torcido até que ele caia com as quatro patas para cima.
O relator afirmou ainda que laudos técnicos contidos no processo demonstram consequências nocivas à saúde dos animais: fraturas nas patas e rabo, ruptura de ligamentos e vasos sanguíneos, eventual arrancamento do rabo, e comprometimento da medula óssea. Também os cavalos, de acordo com os laudos, sofrem lesões. “Ante os dados empíricos evidenciados pelas pesquisas, tem-se como indiscutível o tratamento cruel dispensado às espécies animais envolvidas. Inexiste a mínima possibilidade de um boi não sofrer violência física e mental quando submetido a esse tratamento”, afirmou.
Divergência
O ministro Edson Fachin abriu divergência ao votar pela improcedência do pedido. Segundo o ministro, o próprio Ministério Público Federal, na petição inicial, reconhece a vaquejada como manifestação cultural. Esse reconhecimento, para Fachin, atrai a incidência do artigo 215, parágrafo 1º, da Constituição Federal.
“É preciso despir-se de eventual visão unilateral de uma sociedade eminentemente urbana com produção e acesso a outras manifestações culturais, para se alargar o olhar e alcançar essa outra realidade. Sendo a vaquejada manifestação cultural, encontra proteção expressa na Constituição. E não há razão para se proibir o evento e a competição, que reproduzem e avaliam tecnicamente atividade de captura própria de trabalho de vaqueiros e peões desenvolvidos na zona rural desse país. Ao contrário, tal atividade constitui-se modo de criar, fazer e viver da população sertaneja”, concluiu.
Ao adiantar voto, o ministro Gilmar Mendes seguiu o entendimento do ministro Fachin, julgando improcedente a ação. Em seguida, o ministro Roberto Barroso pediu vista dos autos.
Leia a íntegra do voto do ministro Marco Aurélio (relator).