PRIMEIRA TURMA
Processo
AgInt no REsp 1.729.860-SC, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 29/4/2024.
Ramo do Direito
DIREITO TRIBUTÁRIO
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Compensação. Crédito tributário. Pedido de habilitação administrativa. Suspensividade do prazo prescricional.
Destaque
O pedido de habilitação de créditos apresentado ao fisco acarreta a suspensão do prazo prescricional para o pleito compensatório.
Informações do Inteiro Teor
Na origem, trata-se de mandado de segurança para assegurar o direito à compensação dos valores indevidamente recolhidos a título de contribuição para o PIS com outros tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB) por meio do processamento e análise da declaração de compensação de crédito tributário (PER/DECOMP) ou via formulário físico.
O Tribunal de origem, confirmando a sentença de concessão da segurança, assegurou à parte impetrante o direito ao aproveitamento integral do crédito habilitado em processo administrativo, determinando à autoridade impetrada o recebimento da transmissão eletrônica ou mesmo pedidos em formulário físico de PER/DECOMP relacionados ao crédito discutido. Na ocasião, afastou-se a prescrição suscitada pela Fazenda Nacional ao fundamento de que o pedido administrativo de habilitação acarretava a interrupção do curso do prazo prescricional para o aproveitamento dos créditos tributários.
A compensação é espécie de extinção do crédito tributário, conforme preceitua o art. 156 do Código Tributário Nacional, sendo dessa forma disciplinada no art. 170 do mesmo normativo legal, nos seguintes termos: “A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda pública.
Nesse sentido, a Lei n. 9.430/1996, no art. 74, trouxe regulamentação sobre a compensação tributária, forma de ressarcimento de créditos do sujeito passivo pela Fazenda Nacional, assim dispondo: Art. 74. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão.§ 1º A compensação de que trata o caput será efetuada mediante a entrega, pelo sujeito passivo, de declaração na qual constarão informações relativas aos créditos utilizados e aos respectivos débitos compensados. […] § 14. A Secretaria da Receita Federal – SRF disciplinará o disposto neste artigo, inclusive quanto à fixação de critérios de prioridade para apreciação de processos de restituição, de ressarcimento e de compensação.
Diante da permissão legal para a disciplina da compensação tributária, a SRF editou a Instrução Normativa 600, de 28 de dezembro de 2005, já revogada, trazendo a previsão de que: Na hipótese de crédito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado, a Declaração de Compensação, o Pedido Eletrônico de Restituição e o Pedido Eletrônico de Ressarcimento, gerados a partir do Programa PER/DCOMP, somente serão recepcionados pela SRF após prévia habilitação do crédito pela Delegacia da Receita Federal (DRF), Delegacia da Receita Federal de Administração Tributária (Derat) ou Delegacia Especial de Instituições Financeiras (Deinf) com jurisdição sobre o domicílio tributário do sujeito passivo (art. 51).
O § 2º, inciso IV, dessa mesma instrução normativa trazia a previsão de que o pedido de habilitação do crédito seria deferido mediante a confirmação de que tinha sido formalizado no prazo de 5 anos da data do trânsito em julgado da decisão. A instrução normativa em questão foi objeto de sucessivas atualizações ao longo dos anos. Todavia, é possível observar que a administração tributária federal sempre considerou bifásico o procedimento para a compensação administrativa, ou seja, após o reconhecimento judicial do crédito por decisão transitada em julgado, é imprescindível a habilitação administrativa de tais créditos.
Assim definido o procedimento compensatório, é necessária a sua adequação às balizas temporais estabelecidas para a postulação do direito reconhecido e que não estão sujeitas a qualquer modificação por critério das partes. O art. 168 do CTN estabelece que o direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos.
Considerada tal baliza, a questão que se coloca é: a fase prévia de habilitação administrativa do crédito, momento em que se faz a análise de requisitos essenciais para a efetiva compensação tributária, seria capaz de causar a interrupção do prazo prescricional? Pensa-se que não.
Isso porque, apesar de não haver legislação federal com tamanha especificidade sobre o tema, não se pode desconsiderar a previsão contida no Decreto 20.910, de 6 de janeiro de 1932, que regula a prescrição quinquenal das dívidas públicas desde de muito antes do ordenamento constitucional vigente e que, diga-se de passagem, foi por ele recepcionado.
O art. 4º do Decreto n. 20.910/1932 trouxe norma expressa acerca da suspensão do prazo prescricional, nos seguintes termos: “Art. 4º Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, ao reconhecimento ou no pagamento da dívida, considerada líquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la. Parágrafo único. A suspensão da prescrição, neste caso, verificar-se-á pela entrada do requerimento do titular do direito ou do credor nos livros ou protocolos das repartições públicas, com designação do dia, mês e ano”.
Considerando todo o histórico normativo pertinente à controvérsia posta, não se observam motivos para o afastamento das disposições legais ali contidas, razão pela qual o pedido de habilitação de créditos apresentado ao fisco acarreta, de fato, a suspensão do prazo prescricional para o pleito compensatório. A título de complemento, destaco que o Parecer Normativo Cosit 11/2014 solucionou a controvérsia concluindo que, “[n]o período entre o pedido de habilitação do crédito decorrente de ação judicial e a ciência do seu deferimento definitivo, o prazo prescricional para apresentação da Declaração de Compensação fica suspenso no âmbito administrativo”.
Sendo assim, não há como afastar a prescrição da pretensão compensatória postulada porque apresentada fora do prazo quinquenal estabelecido no art. 168 do CTN, quando somados os períodos que antecederam e sucederam tal pedido de habilitação.
Informações Adicionais
Legislação
Código Tributário Nacional (CTN), arts. 156, 168 e 170
Lei n. 9.430/1996, art. 74
Decreto n. 20.910/1932, art. 4º
Processo
AgInt no REsp 2.082.632-DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 18/3/2024, DJe 2/4/2024.
Ramo do Direito
DIREITO TRIBUTÁRIO
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Imposto de renda da pessoa física – IRPF. Contribuinte portador de Alzheimer. Isenção legal estabelecida para alienação mental.
Destaque
O portador de Alzheimer possui direito à isenção do IRPF quando a doença resultar em alienação mental.
Informações do Inteiro Teor
No caso em discussão, trata-se de ação de repetição de indébito tributário, no qual a parte autora pretendeu a devolução do imposto de renda pago em razão de ser portadora de Alzheimer. Por sentença, o pedido foi julgado procedente, sendo a decisão mantida pelo Tribunal a quo.
No julgamento do REsp n. 1.814.919/DF, pela sistemática dos recursos repetitivos, a Primeira Seção reafirmou entendimento jurisprudencial, segundo o qual a isenção do imposto de renda prevista no art. 6º, inc. XIV, da Lei n. 7.713/1988 só alcança os portadores das moléstias lá elencadas que estejam aposentados. Além disso, por ocasião do julgamento do REsp n. 1.116.620/BA, também na sistemática dos recursos repetitivos, a Primeira Seção definiu ser taxativo o rol das moléstias elencadas no art. 6º, inc. XIV, da Lei n. 7.713/1988, de tal sorte que concessão da isenção deve-se restringir às situações nele enumeradas.
Nesse sentido, a Lei n. 7.713/1988, em seu art. 6º, inc. XIV, dispõe que ficam isentos do imposto de renda os proventos de aposentadoria percebidos pelos portadores de alienação mental, mas não faz referência específica ao Alzheimer. Não obstante, em razão da doença de Alzheimer poder resultar em alienação mental, este Tribunal Superior já decidiu pela possibilidade de os portadores desse mal terem direito à isenção do imposto de renda, na hipótese em que ocorre a alienação mental, consignando que: “Tendo o Tribunal de origem reconhecido a alienação mental da recorrida, que sofre do Mal de Alzheimer, impõe-se admitir seu direito à isenção do imposto de renda” (REsp n. 800.543/PE, relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 16/3/2006, DJ de 10/4/2006).
Informações Adicionais
Legislação
Lei 7.713/1988, art. 6º, XIV
Precedentes Qualificados
REsp n. 1.814.919/DF
REsp n. 1.116.620/BA
SEGUNDA TURMA
Processo
AgInt no REsp 2.085.675-SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, por unanimidade, Segunda Turma, julgado em 18/3/2024, DJe 19/4/2024.
Ramo do Direito
DIREITO ADMINISTRATIVO
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Servidor Público. Lei n. 13.317/2016. Absorção da VPI instituída pela Lei n. 10.698/2003. Data do pagamento do valor previsto no Anexo I da Lei n. 13.317/2016. Janeiro de 2019.
Destaque
O pagamento da Vantagem Pecuniária Individual (VPI) instituída pela Lei n. 10.698/2003 deve ser considerado como interrompido a partir do momento em que os valores constantes no Anexo I da Lei n. 13.317/2016 foram pagos pela Administração Pública.
Informações do Inteiro Teor
A controvérsia diz respeito ao momento em que deve ser interrompido o pagamento da Vantagem Pecuniária Individual (VPI) instituída pela Lei n. 10.698/2003: se em julho de 2016, quando entrou em vigou a Lei n. 13.317/2016, ou se em janeiro de 2019, quando foi paga a última parcela do reajuste.
Nesse sentido, o art. 6º da Lei n. 13.317/2016 dispõe: “A vantagem pecuniária individual, instituída pela Lei nº 10.698, de 2 de julho de 2003, e outras parcelas que tenham por origem a citada vantagem concedidas por decisão administrativa ou judicial, ainda que decorrente de sentença transitada ou não em julgado, incidentes sobre os cargos efetivos e em comissão de que trata esta Lei, ficam absorvidas a partir da implementação dos novos valores constantes dos Anexos I e III desta Lei”.
No Anexo I, por sua vez, encontra-se a tabela remuneratória para os cargos de Analista Judiciário, Técnico Judiciário e Auxiliar Judiciário, enquanto o Anexo III trata dos valores referentes aos cargos em comissão. O Anexo II, por outro lado, explicita, ano a ano – de julho de 2016 a janeiro de 2019 – o escalonamento do pagamento do reajuste previsto no Anexo I.
Dessa forma, art. 6º da Lei n. 13.317/2016 não determinou a absorção da VPI a partir da implementação dos valores previstos no Anexo II, mas no Anexo I. Isso significa que a verba deve ser considerada absorvida a partir do momento em que os valores constantes no Anexo I foram pagos pela Administração Pública.
Informações Adicionais
Legislação
Lei n. 10.698/2003
Lei n. 13.317/2016, art. 6º
Processo
AgInt no REsp 1.641.326-RJ, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 11/3/2024, DJe 15/3/2024.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO TRIBUTÁRIO
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Ação civil pública. Tributo declarado inconstitucional. Pretensão de não cobrança. Natureza tributária da discussão. Ministério Público. Ilegitimidade ativa.
Destaque
A pretensão de fazer cessar a cobrança de tributo, mesmo que já anteriormente declarado inconstitucional, contém discussão de natureza tributária, ensejando a ilegitimidade ativa do Ministério Público para a ação.
Informações do Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia sobre o acerto ou não de decisão que reconheceu a ilegitimidade ativa do Ministério Público para ajuizar ação civil pública cuja pretensão é de obstar a cobrança de tributos já julgados inconstitucionais pelo Órgão Especial da Corte local.
No caso analisado, ainda que a pretexto de dar efetividade ao julgado que reconheceu a inconstitucionalidade do tributo, buscou-se que fosse cessada a cobrança do referido tributo, o que revela a natureza tributária da pretensão, a ensejar a ilegitimidade ativa do Ministério Público para a ação. Nesse sentido, o Tema n. 645 do STF, que assim dispõe: O Ministério Público não possui legitimidade ativa ad causam para, em ação civil pública, deduzir em juízo pretensão de natureza tributária em defesa dos contribuintes, que vise questionar a constitucionalidade/legalidade de tributo.
Informações Adicionais
Precedentes Qualificados
Tema 645/STF
TERCEIRA TURMA
Processo
REsp 2.088.236-PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 26/4/2024.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Site de intermediação de comércio eletrônico. Notificação extrajudicial. Violação aos termos de uso da plataforma. Requerimento de exclusão de anúncios. Impossibilidade.
Destaque
Não é possível atribuir ao intermediador de comércio eletrônico a obrigação de excluir, em razão de notificação extrajudicial, anúncios de vendas que violem os termos de uso da plataforma.
Informações do Inteiro Teor
Para o Marco Civil da Internet (MCI), os sites intermediadores do comércio eletrônico enquadram-se na categoria dos provedores de aplicações, os quais são responsáveis por disponibilizar na rede as informações criadas ou desenvolvidas pelos provedores de informação.
A publicação de anúncios em plataforma de comércio eletrônico é regida pelos seus termos de uso, os quais são utilizados, entre outras finalidades, para estabelecer as práticas aceitáveis no uso dos serviços, bem como as condutas vedadas. Não há regulamentação, no MCI, das práticas implementadas pelas plataformas de comércio eletrônico em virtude do descumprimento dos termos de uso. Assim, é preciso considerar as disposições aplicáveis aos provedores de aplicações.
Salvo as exceções previstas em lei, os provedores de aplicações apenas respondem, subsidiariamente, por danos gerados em decorrência de conteúdo publicado por terceiro após o desatendimento de ordem judicial específica (art. 19 do MCI). Busca-se evitar o abuso por parte dos usuários notificantes, o monitoramento prévio, a censura privada e remoções irrefletidas.
Nessa linha, conforme jurisprudência do STJ, não é possível impor aos sites de intermediação a responsabilidade de realizar a prévia fiscalização sobre a origem de todos os produtos. Isto é, à exceção das hipóteses estabelecidas no MCI, os provedores de aplicações não têm a obrigação de excluir publicações realizadas por terceiros em suas páginas, por violação aos termos de uso, devido à existência de requerimento extrajudicial.
Informações Adicionais
Legislação
Lei n. 12.965/2014 (Marco Civil da Internet – MCI), art. 19
Processo
REsp 2.108.270-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 26/4/2024.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Plano de saúde coletivo. Reajuste anual. Aumento de sinistralidade. Aplicado de forma complementar ao reajuste por variação de custo. Extrato pormenorizado. Despesas assistenciais e receitas diretas do plano. Ausência de demonstração. Abusividade configurada.
Destaque
O reajuste por aumento de sinistralidade só pode ser aplicado pela operadora, de forma complementar ao reajuste por variação de custo, se demonstrado, a partir de extrato pormenorizado, o incremento na proporção entre as despesas assistenciais e as receitas diretas do plano, apuradas no período de doze meses consecutivos, anteriores à data-base de aniversário considerada como mês de assinatura do contrato.
Informações do Inteiro Teor
O propósito recursal é decidir sobre a apuração, em liquidação de sentença, do índice de reajuste por aumento de sinistralidade aplicado pela operadora do plano de saúde coletivo.
Esclarece a Agência Nacional de Saúde – ANS, sobre o reajuste anual de planos coletivos, que a justificativa do percentual proposto deve ser fundamentada pela operadora e seus cálculos (memória de cálculo do reajuste e a metodologia utilizada) disponibilizados para conferência pela pessoa jurídica contratante com o mínimo de 30 dias de antecedência da data prevista para a aplicação do reajuste.
O reajuste por aumento de sinistralidade só pode ser aplicado pela operadora, de forma complementar ao reajuste por variação de custo, se e quando demonstrado, a partir de extrato pormenorizado, o incremento na proporção entre as despesas assistenciais e as receitas diretas do plano, apuradas no período de doze meses consecutivos, anteriores à data-base de aniversário considerada como mês de assinatura do contrato.
Além de responder administrativamente, perante a ANS, por eventual infração econômico-financeira ou assistencial, a aplicação do reajuste pela operadora, sem comprovar, previamente, o aumento de sinistralidade, torna abusiva a cobrança do beneficiário a tal título.
Se a operadora, em juízo, é instada a apresentar o extrato pormenorizado que demonstra o aumento da sinistralidade e permanece inerte, outra não pode ser a conclusão senão a de que é indevido o reajuste exigido, por ausência do seu fato gerador, impondo-se, pois, o seu afastamento; do contrário, estar-se-ia autorizando o reajuste sem causa correspondente, a ensejar o enriquecimento ilícito da operadora.
Processo
AgInt no REsp 2.104.283-SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 4/3/2024, DJe 6/3/2024.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Embargos de terceiro opostos pelo filho dos executados para desconstituir a penhora do imóvel em que reside de titularidade dos pais. Alegação de impenhorabilidade de bem de família. Pretensão já negada em exceção de pré-executividade apresentada pela mãe, coexecutada. Impossibilidade. Penhora de bem do fiador. Súmula n. 549/STJ. Possibilidade.
Destaque
Embora a jurisprudência do STJ reconheça a legitimidade do filho para suscitar em embargos de terceiro a impenhorabilidade do bem de família em que reside, isso não pode ser usado para, por via transversa, modificar decisão que já rechaçou a impenhorabilidade do referido bem.
Informações do Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia à possibilidade de se rediscutir, em embargos de terceiros opostos pelo filho dos executados, a (im)penhorabilidade de bem de família já analisada em exceção de pré-executividade ajuizada pela coexecutada.
O filho tem legitimidade para suscitar em embargos de terceiro a impenhorabilidade do bem de família em que reside. Contudo, tal ação não pode ser usada para, por via transversa, modificar decisão judicial que já rechaçou a impenhorabilidade do referido bem, proferida em demanda que envolve os próprios proprietários.
No mais, ainda que fosse possível a reabertura da discussão acerca da impenhorabilidade do bem, o Superior Tribunal de Justiça, nos termos do que decidido pelo Supremo Tribunal Federal, possui entendimento firmado no sentido da possibilidade da penhora sobre bem de família pertencente a fiador de contrato de locação. Entendimento esse firmado em recurso repetitivo (REsp 1.363.368/MS, DJe de 21/11/2014, Tema n. 708 do STJ) e consolidado na Súmula 549/STJ: “É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação”.
Informações Adicionais
Precedentes Qualificados
Tema 708/STJ
Súm. 549/STJ
Processo
REsp 1.902.133-RO, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 16/4/2024, DJe 18/4/2024.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Ação declaratória de nulidade. Querela nullitatis insanabilis. Nulidade de citação. Vício insanável. Impossibilidade de preclusão. Legitimidade ativa do terceiro juridicamente interessado. Aplicação, por analogia, da regra do art. 967, inciso II, do CPC/2015.
Destaque
O terceiro juridicamente interessado tem legitimidade para ajuizar a ação declaratória de nulidade (querela nullitatis insanabilis) sempre que houver algum vício insanável na sentença transitada em julgado.
Informações do Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia a definir se há legitimidade de terceiro para ajuizar a ação declaratória de nulidade de sentença, mesmo não tendo participado do respectivo processo, e se a nulidade da citação estaria preclusa.
A coisa julgada, de assento constitucional (e legal), erigida à garantia fundamental do indivíduo, assume papel essencial à estabilização dos conflitos, em atenção à segurança jurídica que legitimamente se espera da prestação jurisdicional. A esse propósito, uma vez decorrido o devido processo legal, com o exaurimento de todos os recursos cabíveis, a solução judicial do conflito de interesses, em substituição às partes litigantes, por meio da edição de uma norma jurídica concreta, reveste-se necessariamente de imutabilidade e de definitividade.
Assim, a coisa julgada, a um só tempo, não apenas impede que a mesma controvérsia, relativa às mesmas partes, seja novamente objeto de ação e, principalmente, de outra decisão de mérito (função negativa), como também promove o respeito e a proteção ao que restou decidido em sentença transitada em julgado (função positiva).
Atento à indiscutível falibilidade humana, mas sem descurar da necessidade de conferir segurança jurídica à prestação jurisdicional, a lei adjetiva civil estabelece situações específicas e taxativas em que se admite a desconstituição da coisa julgada (formal e material), por meio da promoção de ação rescisória, observado, contudo, o prazo fatal e decadencial de 2 anos, em regra, nos termos do que dispõem os arts. 966 e 975 do CPC/2015.
A par de tais hipóteses legais em que se autoriza a desconstituição da coisa julgada por meio da via rescisória, doutrina e jurisprudência admitem, também, o ajuizamento de ação destinada a declarar vício insuperável de existência da sentença transitada em julgado que, por tal razão, apenas faria coisa julgada formal, mas nunca material, inapta, em verdade, a produzir efeitos. Por isso, não haveria, em tese, comprometimento da almejada segurança jurídica.
Trata-se, pois, da querela nullitatis insanabilis, a qual, ao contrário da ação rescisória, que busca desconstituir sentença de mérito válida e eficaz, tem por finalidade declarar a ineficácia de sentença que não observa pressuposto de existência e, por consequência, de validade, logo não pode ser alcançado pela limitação temporal imposta àqueles vícios passíveis de serem impugnados por meio da ação rescisória.
Dessa forma, sendo a nulidade da citação um vício transrescisório, incapaz, portanto, de ser sanado, não há que se falar em ocorrência de preclusão na hipótese, afastando-se, assim, a apontada violação ao art. 278 do CPC/2015.
Considerando a semelhança entre a ação rescisória e a querela nullitatis, bem como a ausência de previsão legal desta, as regras concernentes à legitimidade para o ajuizamento da rescisória devem ser aplicadas, por analogia, à ação declaratória de nulidade. Logo, deve ser reconhecida a legitimidade ativa do terceiro juridicamente interessado para propor a querela nullitatis, a teor do disposto no inciso II do art. 967 do CPC/2015, sempre que houver algum vício insanável na sentença transitada em julgado.
Na hipótese em análise, conquanto não tenha figurado no polo passivo da ação de cobrança, em que se busca a nulidade da citação, possui legitimidade para ajuizar a ação declaratória subjacente, por se tratar de terceira juridicamente interessada. Com efeito, o êxito na referida ação de cobrança acabou resultando no ajuizamento posterior de ação reivindicatória pela ora recorrente contra ela, em que se pleiteou a desocupação do imóvel, objeto de hipoteca pelos fiadores na primeira demanda, no qual havia fixado a sua residência.
Desse modo, não há violação ao art. 18 do CPC/2015, pois o pleito na querela nullitatis – de nulidade da citação na aludida ação de cobrança – está autorizado pelo ordenamento jurídico – art. 967, inciso II, do CPC/2015 -, dada a sua nítida condição de terceira juridicamente interessada.
Informações Adicionais
Legislação
Código de Processo Civil (CPC), art. 18, art. 278, art. 966, art. 967, inciso II e art. 975
QUARTA TURMA
Processo
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL, DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Tema
Saúde e Bem-Estar Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Estupro de vulnerável. Divulgação de matéria jornalística em site de notícias. Texto que relata fatos verídicos. Manchete que induz o leitor a atribuir conduta ativa à vítima menor de idade. Conteúdo manifestamente ofensivo. Ato ilícito. Ocorrência. Responsabilidade civil caracterizada.
Destaque
Comete ato ilícito, por abuso de direito, o órgão de imprensa que, apesar de divulgar fato verídico e sem a indicação de dados objetivos quanto aos partícipes do fato, relaciona a notícia à manchete de caráter manifestamente ofensivo à honra da vítima de crime de estupro de vulnerável, atribuindo à adolescente conduta ativa ante o fato ocorrido, trazendo menções injuriosas a sua honra.
Informações do Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia em definir se constitui ato ilícito, atribuível a órgão de imprensa, a publicação, em site de notícias, de matéria jornalística que traz em seu bojo relato de um crime de estupro de vulnerável, sem a indicação de dados objetivos quantos aos partícipes do fato, mas que atrela a narrativa do ocorrido a uma manchete de cunho sensacionalista, capaz de colocar em dúvida a conduta moral da vítima por ocasião dos fatos noticiados.
Esta Corte Superior tem reiteradamente assentado que “a liberdade de expressão, compreendendo a informação, opinião e crítica jornalística, por não ser absoluta, encontra algumas limitações ao seu exercício, compatíveis com o regime democrático, quais sejam: (I) o compromisso ético com a informação verossímil; (II) a preservação dos chamados direitos da personalidade, entre os quais incluem-se os direitos à honra, à imagem, à privacidade e à intimidade; e (III) a vedação de veiculação de crítica jornalística com intuito de difamar, injuriar ou caluniar a pessoa (animus injuriandi vel diffamandi)” (REsp n. 801.109/DF, Relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 12/6/2012, DJe de 12/3/2013).
Comete ato ilícito, por abuso de direito, o órgão de imprensa que, apesar de divulgar fato verídico, relaciona a notícia à manchete de caráter manifestamente ofensivo à honra da vítima de crime de estupro de vulnerável, atribuindo à adolescente conduta ativa ante o fato ocorrido, trazendo menções injuriosas a sua honra.
Os cuidados a serem dispensados pelos órgãos de imprensa, quando da divulgação de notícias envolvendo menores de idade, devem ser redobrados, face ao dever imposto a toda sociedade de zelar pelos direitos e o bem-estar da pessoa em desenvolvimento (arts. 16 e 17 do ECA).
Ainda que a notícia não contenha dados objetivos que possam identificar a vítima ao público em geral, é evidente, contudo, que ela própria e aqueles que circundam seus relacionamentos mais próximos têm conhecimento de que os fatos ofensivos lhe foram atribuídos, ressaindo daí dano psíquico-psicológico decorrente dos termos infamantes contidos na chamada da matéria, sobretudo por se cuidar a ofendida de menor de idade e por ter a manchete denotado a ideia de que a menor fora a responsável pelo episódio.
Nesse sentido, a posterior retratação do órgão de imprensa é irrelevante porquanto já consumado o dano moral à vítima da veiculação da notícia. Assim, a responsabilidade civil deve ser reconhecida, face à junção de todos os seus elementos: ato ilícito cometido por abuso de direito aliado ao nexo de causalidade entre o agir e o dano moral impingido.
Informações Adicionais
Legislação
Lei n. 8.069/1190 (ECA), arts. 16 e 17
Processo
REsp 1.784.914-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 30/4/2024.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL, DIREITO EMPRESARIAL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Contratos de colaboração empresarial. Contrato de agência ou distribuição por aproximação. Contrato típico. Disciplina geral. Código civil. Princípio da especialidade. Lei n. 4.886/1965. Norma especial. Cláusula del credere. Vedação legal. Art. 698 do CC/2002. Analogia. Impossibilidade.
Destaque
É vedada a pactuação da cláusula del credere nos contratos de agência ou distribuição por aproximação.
Informações do Inteiro Teor
A controvérsia cinge-se em saber se no contrato de agência ou distribuição por aproximação seria admissível a pactuação da cláusula del credere, pacto pelo qual o colaborador assume a responsabilidade pela solvência da pessoa com quem contratar em nome do fornecedor, na forma dos arts. 688 e 721 do Código Civil.
O contrato em discussão foi qualificado no primeiro grau de jurisdição como contrato de agência e pelo Tribunal de origem como contrato de distribuição por aproximação. A consequência inicial desta categorização é a de que, a despeito da divergência terminológica, se cuida de um contrato socialmente típico, disciplinado pelo Código Civil e, naquilo que for compatível, com a legislação especial, a Lei n. 4.886/1965.
Tal conclusão é inescapável, na medida em que o novo Código Civil conferiu ao provecto contrato de representação comercial a nova denominação de contrato de agência, alinhando-se à terminologia majoritariamente adotada pela legislação estrangeira.
Acerca da disciplina legal, prevê o art. 721 do Código Civil: “Aplicam-se ao contrato de agência e distribuição, no que couber, as regras concernentes ao mandato e à comissão e as constantes de lei especial”. Assim, a novel disciplina instituída pelo estatuto civil não afasta a incidência das normas especiais que não forem substancialmente incompatíveis com a última regulamentação.
Nesse sentido, o critério para a solução da antinomia no caso em questão decorre da aplicação do princípio da especialidade, de modo que a incompatibilidade normativa se soluciona pela aplicação da norma que contém elementos especializantes, subtraindo do espectro normativo da norma geral a aplicação em virtude de determinados critérios que são especiais. Sendo assim, concorrerão, naquilo que forem compatíveis, as disposições do Código Civil e da Lei de Representação Comercial – Lei n. 4.886/1965.
Os doze artigos do Código Civil que tratam dos contratos de agência e distribuição por aproximação não se ocupam, em nenhuma passagem, da cláusula del credere – pacto a ser inserto no contrato e pelo qual o colaborador assume a responsabilidade pela solvência da pessoa com quem contratar em nome do fornecedor, tornando-se solidariamente responsável. Contudo, há disposição no art. 43 da Lei n. 4.886/1965 estabelecendo que “é vedada no contrato de representação comercial a inclusão de cláusulas del credere”.
Dessa forma, constituindo a vedação à cláusula del credere nos contratos de agência ou distribuição por aproximação disposição veiculada por legislação especial compatível com a posterior disciplina introduzida por norma geral, infere-se que se mantém no ordenamento jurídico a proibição da disposição contratual que transforme o agente solidariamente responsável pela adimplência do contratante.
Ademais, descabe cogitar em aplicação analógica no art. 698 do Código Civil, que estabelece que, se do contrato de comissão constar a cláusula del credere, responderá o comissário solidariamente com as pessoas com que houver tratado em nome do comitente, caso em que, salvo estipulação em contrário, o comissário tem direito a remuneração mais elevada, para compensar o ônus assumido. Com efeito, não há falar-se em omissão legislativa que tenha o condão de autorizar a aplicação da analogia pelo simples motivo de que existe norma especial que regula integralmente a questão.
Informações Adicionais
Legislação
Código Civil (CC), arts. 688, 698 e 721
Lei n. 4.886/1965, art. 43
Processo
REsp 1.852.165-MG, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 30/4/2024.
Ramo do Direito
DIREITO FALIMENTAR
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Instituição financeira. Falência. Prévia submissão a regime de liquidação extrajudicial. Pedido de falência pelo liquidante. Ex-administradores e Controladores. Legitimidade para intervir. Processo estrutural. Autorização da assembleia-geral. Desnecessidade.
Destaque
Os acionistas ex-administradores e controladores da instituição financeira têm legitimidade para intervir no processo de falência instaurado a pedido do liquidante e não há necessidade de prévia autorização da assembleia geral em se tratando de falência decorrente de procedimento de liquidação extrajudicial.
Informações do Inteiro Teor
Os direitos do falido foram expressamente previstos no art. 103 da Lei n. 11.101/2005 porque, com a decretação da quebra, ele perde o direito de administrar seus bens ou deles dispor, passando a geri-los o administrador judicial nomeado pelo juiz ou, na hipótese de falência de instituição financeira, o liquidante previamente nomeado pelo Banco Central do Brasil. Isso não significa, contudo, que o empresário ou sociedade falida sejam extintos ou percam a capacidade processual, tanto que os dispositivos legais em referência permitem fiscalizar a administração da falência, adotar providências necessárias para a conservação de seus direitos ou dos bens arrecadados ou ainda intervir nos processos em que a massa falida seja parte ou interessada.
Não se pode recusar, outrossim, a legitimidade da falida ainda na fase cognitiva ou pré-falimentar. Com efeito, se a lei confere determinados direitos à massa falida no que tange à fiscalização da administração da massa e ao zelo pela conservação de seus direitos e bens arrecadados, com muito mais razão pode opor-se à própria decretação da falência, momento em que o poder judiciário se volta a verificar o estado patrimonial do devedor e a constatação da insolvência. Diversos efeitos jurídicos da quebra em relação aos acionistas ex-administradores e controladores revelam interesse jurídico em intervir no feito e impugnar a decretação da falência.
A falência constitui processo em que se relacionam múltiplos interesses que circundam a companhia e mesmo o interesse público de tutela do crédito e do saneamento do mercado em contraposição ao interesse da própria falida, muitas vezes colidente com o destino liquidatório, permitindo-se qualificá-la como processo estrutural, multifacetado e policêntrico, com interesses plurais e setoriais que demandam um desencadeamento decisório especial que contemple os diversos atores e perfis envolvidos. Nesse contexto, é imperioso reconhecer a legitimidade dos sócios e, sobretudo, dos administradores, para acompanhar o procedimento e conduzir seus interesses para que sejam sopesados na arena decisional.
O regime de liquidação extrajudicial constitui uma das modalidades do sistema de resolução das instituições financeiras, procedimento administrativo que se assemelha à falência – especialmente em razão de sua finalidade – e visa, por conseguinte, à remoção da instituição financeira e à paralisação de suas atividades. A decretação da liquidação extrajudicial implica, automaticamente, o afastamento dos administradores da instituição financeira (art. 50 da Lei n. 6.024/1976). Consequentemente, o pedido de falência da instituição financeira submetida a regime de liquidação extrajudicial compete exclusivamente ao liquidante, mediante autorização do Banco Central do Brasil, excluindo-se, a partir da decretação da liquidação, a legitimidade da própria instituição financeira, seus acionistas ou credores.
Em se tratando de falência decorrente de anterior procedimento de liquidação extrajudicial, não há exigência da prévia autorização da assembleia geral, como prevê o art. 122, IX, da Lei n. 6.404/1976. A Lei n. 6.024/1976 é norma especial em relação à Lei n. 11.101/2005 – que prevê procedimentos recuperatório e liquidatório da generalidade das sociedades empresárias e empresários -, afastando-se, pelo princípio da especialidade e pelas peculiaridades dos procedimentos resolutórios das instituições financeiras, a disposição da legislação das companhias.
Informações Adicionais
Legislação
Lei n. 11.101/2005, art. 103
Lei n. 6.024/1976, art. 50
Lei n. 6.404/1976, art. 122, IX
QUINTA TURMA
Processo
AgRg no AREsp 2.318.334-MG, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 16/4/2024, DJe 23/4/2024.
Ramo do Direito
DIREITO PENAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Agente infiltrado no plano cibernético. Espelhamento de mensagens via Whatsapp web. Possibilidade. Cláusula de reserva de jurisdição e critérios de proporcionalidade (utilidade, necessidade). Observância.
Destaque
É possível a utilização de ações encobertas, controladas virtuais ou de agentes infiltrados no plano cibernético, inclusive via espelhamento do Whatsapp Web, desde que o uso da ação controlada na investigação criminal esteja amparada por autorização judicial.
Informações do Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia a aferição da possibilidade de utilização, no ordenamento jurídico pátrio, de ações encobertas, controladas virtuais ou de agentes infiltrados no plano cibernético, inclusive via espelhamento do Whatsapp Web.
No ordenamento pátrio, as ações encobertas recebem a denominação de infiltração de agentes. A Lei que trata acerca de organizações criminosas, Lei n. 12.850/2013, prevê que, em qualquer fase da persecução penal, serão permitidos, sem prejuízo de outros procedimentos já previstos em lei, infiltração, por policiais, em atividade de investigação, mediante motivada e sigilosa autorização judicial. Objetiva-se a outorga, ao agente estatal, da possibilidade de penetrar na organização criminosa, participando de atividades diárias, para, assim, compreendê-la e melhor combatê-la pelo repasse de informações às autoridades.
De se mencionar, ainda, que a lei que regulamenta o Marco Civil da Internet (Lei n. 12.965/2014), estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para uso da Internet no Brasil, garante o acesso e a interferência no “fluxo das comunicações pela Internet, por ordem judicial”. De idêntica forma, a referida Lei n. 12.850/2013 (Lei da ORCRIM), com redação trazida pela Lei 13.694/2019, passou a prever, de forma expressa, a figura do agente infiltrado virtual, em seu art. 10-A.
Por sua vez, a Lei n. 9.296/1996 (Interceptação Telefônica), permite em seu art. 1º, parágrafo único, a quebra do sigilo no que concerne à comunicação de dados, mediante ordem judicial fundamentada. Nesse ponto reside a permissão normativa para quebra de sigilo de dados informáticos e de forma subsequente, para permitir a interação, a interceptação e a infiltração do agente, inclusive pelo meio cibernético, consistente no espelhamento do Whatsapp Web. A lei de interceptação, em combinação com a Lei das Organizações Criminosas outorga legitimidade (legalidade) e dita o rito (regra procedimental), a mencionado espelhamento, em interpretação progressiva, em conformidade com a realidade atual, para adequar a norma à evolução tecnológica.
A potencialidade danosa dos delitos praticados por organizações criminosas, pelo meio virtual, aliada a complexidade e dificuldade da persecução penal no âmbito cibernético devem levar a jurisprudência a admitir as ações controladas e infiltradas no mesmo plano virtual. De fato, nos últimos anos, as redes sociais e respectivos aplicativos se tornaram uma ferramenta indispensável para a comunicação, interação e compartilhamento de informações em todo o mundo. Entretanto, essa rápida expansão e influência também trouxeram consigo uma série de desafios e problemas no âmbito da investigação, no meio virtual, tornando-se a evolução da jurisprudência acerca do tema questão cada vez mais relevante e urgente.
Impositivo se mostra o estabelecimento de regras processuais compatíveis com a modernidade do crime organizado, porém, sempre respeitando, dentro de tal quadro, os direitos e garantias fundamentais do investigado. Tal desiderato restou alcançado na medida em que, no ordenamento pátrio, a infiltração, igualmente a outros institutos que restringem garantias e direitos fundamentais, está submetida ao controle e amparada por ordem de um juiz competente.
Não há empecilho, portanto, na utilização de ações encobertas ou agentes infiltrados na persecução de delitos, pela via dos meios virtuais, desde que, conjugados critérios de proporcionalidade (utilidade, necessidade), reste observada a subsidiariedade, não podendo a prova ser produzida por outros meios disponíveis.
É o que se dá na hipótese em análise, com o autorizado espelhamento via Whatsapp Web, como meio de infiltração investigativa, na medida em que a interceptação de dados direta, feita no próprio aplicativo original do Whatsapp, se denota, por vezes, despicienda, em face da conhecida criptografia ponta a ponta que vigora no aplicativo original, impossibilitando o acesso ao teor das conversas ali entabuladas. Concebe-se plausível, portanto, que o espelhamento autorizado via Whatsapp Web, pelos órgãos de persecução, se denote equivalente à modalidade de infiltração do agente, que consiste em meio extraordinário, mas válido, de obtenção de prova.
Pode, desta forma, o agente policial valer-se da utilização do espelhamento pela via do Whatsapp Web, desde que respeitados os parâmetros de proporcionalidade, subsidiariedade, controle judicial e legalidade, calcado pelo competente mandado judicial. De fato, a Lei n. 9.296/1996, que regulamenta as interceptações, conjugada com a Lei n. 12.850/2013 (Lei das Organizações Criminosas), outorgam substrato de validade processual às ações infiltradas no plano cibernético, desde que observada a cláusula de reserva de jurisdição.
Informações Adicionais
Legislação
Lei n. 12.850/2013, art. 10-A
Lei n. 12.965/2014
Lei n. 9.296/1996, art. 1º, parágrafo único
SEXTA TURMA
Processo
HC 889.618-MG, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 26/4/2024.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Evasão do acusado em posse de sacola ao avistar os policiais. Abordagem policial em via pública. Fundadas razões. Ocorrência.
Destaque
A tentativa de se esquivar da guarnição policial evidencia a fundada suspeita de que o agente ocultava consigo objetos ilícitos, na forma do art. 240, § 2º, do Código de Processo Penal, a justificar a busca pessoal, em via pública.
Informações do Inteiro Teor
Segundo o disposto no art. 244 do Código de Processo Penal, a busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar.
Em julgamento sobre o tema, ao apreciar o RHC n. 158.580/BA (DJe 25/4/2022), a Sexta Turma do STJ estabeleceu, interpretando o referido dispositivo legal, que em termos de standard probatório para busca pessoal ou veicular sem mandado judicial, exige-se a existência de fundada suspeita (justa causa) – baseada em um juízo de probabilidade, descrita com a maior precisão possível, aferida de modo objetivo e devidamente justificada pelos indícios e circunstâncias do caso concreto – de que o indivíduo esteja na posse de drogas, armas ou de outros objetos ou papéis que constituam corpo de delito, evidenciando-se a urgência de se executar a diligência.
Concluiu-se, ainda, que não satisfazem a exigência legal, por si sós, meras informações de fonte não identificada (e.g. denúncias anônimas) ou intuições/impressões subjetivas, intangíveis e não demonstráveis de maneira clara e concreta, baseadas, por exemplo, exclusivamente, no tirocínio policial.
Contudo, no caso, há de se destacar a evasão do acusado em posse de uma sacola, ao avistar os policiais militares, sendo revistado após desdobramento da ação policial em via pública, em diligência para averiguar a prática do delito de tráfico de drogas na localidade, após notitia criminis inqualificada.
Sobre o tema, a Quinta Turma desta Corte Superior vem reiterando que, segundo consignado no RHC n. 229.514/PE, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, se um agente do estado não puder realizar abordagem em via pública a partir de comportamentos suspeitos do alvo, tais como fuga, gesticulações e demais reações típicas, já conhecidas pela ciência aplicada à atividade policial, haverá sério comprometimento do exercício da segurança pública.
Ademais, segundo a doutrina, “[n]ão se pode igualar a proteção do domicílio (que é asilo inviolável do indivíduo, na dicção da Constituição) com a proteção da integridade física de quem está em via pública. São níveis diferentes de tutela e proteção”.
Nesse contexto, considerando o art. 926 do Código de Processo Civil, pelo qual os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente, no caso, a tentativa de se esquivar da guarnição evidencia a fundada suspeita de que o agente ocultava consigo objetos ilícitos, na forma do art. 240, § 2º, do Código de Processo Penal, a justificar a busca pessoal, em via pública.
Por fim, sublinhe-se que o acima referido caso paradigmático da Sexta Turma busca evitar o uso excessivo da busca pessoal, garantir a sindicabilidade da abordagem e evitar a repetição de práticas que reproduzem preconceitos estruturais arraigados na sociedade, premissas atendidas na espécie.
Informações Adicionais
Legislação
Código de Processo Penal (CPP), art. 240, § 2º e art. 244
Código de Processo Civil (CPP), art. 926
RECURSOS REPETITIVOS – AFETAÇÃO
Processo
ProAfR no REsp 2.077.135-RJ, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 9/4/2024, DJe 24/4/2024. (Tema 1248).
ProAfR no REsp 2.077.138-RJ, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 9/4/2024, DJe 24/4/2024 (Tema 1248).
ProAfR no REsp 2.077.319-RJ, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 9/4/2024, DJe 24/4/2024 (Tema 1248).
ProAfR no REsp 2.077.461-RJ, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 9/4/2024, DJe 24/4/2024 (Tema 1248).
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO TRIBUTÁRIO
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
A Primeira Seção acolheu a proposta de afetação dos REsps n. 2.077.135-RJ, 2.077.138-RJ, 2.077.319-RJ e 2.077.461-RJ ao rito dos recursos repetitivos, a fim de uniformizar o entendimento a respeito da seguinte controvérsia: “definir se, para efeito de cabimento do recurso de apelação em execução fiscal do mesmo tributo, deve ser observado o montante total do título executado ou os débitos individualmente considerados, nos termos do art. 34, caput e § 1º, da Lei n. 6.830/1980”.
RECURSOS REPETITIVOS – AFETAÇÃO
Processo
ProAfR no REsp 2.070.717-MG, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 19/3/2024, DJe 26/4/2024. (Tema 1249).
ProAfR no REsp 2.070.857-MG, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 19/3/2024, DJe 26/4/2024 (Tema 1249).
ProAfR no REsp 2.070.863-MG, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 19/3/2024, DJe 26/4/2024 (Tema 1249).
ProAfR no REsp 2.071.109-MG, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 19/3/2024, DJe 26/4/2024 (Tema 1249).
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
A Terceira Seção acolheu a proposta de afetação dos REsps n. 2.070.717-MG, 2.070.857-MG, 2.070.863-MG e 2.071.109-MG ao rito dos recursos repetitivos, a fim de uniformizar o entendimento a respeito das seguintes controvérsias: “I) natureza jurídica das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha; II) (im)possibilidade de fixação, pelo magistrado, de prazo predeterminado de vigência da medida”.
RECURSOS REPETITIVOS – AFETAÇÃO
Processo
ProAfR no REsp 2.031.813-SC, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Primeira Seção, julgamento virtual iniciado em 14/4/2024 e finalizado em 16/4/2024. (Tema 1251).
ProAfR no REsp 2.032.021-RS, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Primeira Seção, julgamento virtual iniciado em 14/4/2024 e finalizado em 16/4/2024 (Tema 1251).
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
A Primeira Seção acolheu a proposta de afetação dos REsps n. 2.031.813/SC e 2.032.021/RS ao rito dos recursos repetitivos, a fim de uniformizar o entendimento a respeito da seguinte controvérsia: “definir o termo inicial dos juros de mora, nos casos em que reconhecido judicialmente o direito à indenização, por danos morais, a anistiado político ou aos seus sucessores, nos termos da Lei n. 10.559/2002”.
Processo
ProAfR no REsp 2.050.498-SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgamento virtual iniciado em 3/4/2024 e finalizado em 9/4/2024. (Tema 1252).
ProAfR no REsp 2.050.837-SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgamento virtual iniciado em 3/4/2024 e finalizado em 9/4/2024 (Tema 1252)
ProAfR no REsp 2.052.982-SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgamento virtual iniciado em 3/4/2024 e finalizado em 9/4/2024 (Tema 1252)
Ramo do Direito
DIREITO TRIBUTÁRIO
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
A Primeira Seção acolheu a proposta de afetação dos REsps n. 2.050.498/SP, 2.050.837/SP e 2.052.982/SP ao rito dos recursos repetitivos, a fim de uniformizar o entendimento a respeito da seguinte controvérsia: “definir se a Contribuição Previdenciária incide ou não sobre os valores despendidos a título de Adicional de Insalubridade”.