STF reconhece desnecessidade de registro em cartório de alienação fiduciária de veículo

Ao analisar três processos sobre o tema, o Plenário considerou não ser obrigatória a realização de registro público dos contratos de alienação fiduciária em garantia de veículos automotores pelas serventias extrajudiciais de registro de títulos e documentos.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu não ser obrigatória a realização de registro público dos contratos de alienação fiduciária em garantia de veículos automotores pelas serventias extrajudiciais de registro de títulos e documentos. A decisão unânime ocorreu durante a sessão realizada nesta quarta-feira (21) em que os ministros analisaram as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4227, 4333 e o Recurso Extraordinário (RE) 611639, com repercussão geral reconhecida.

Para o relator da matéria, ministro Marco Aurélio, no caso, o simples pacto entre as partes “é perfeitamente existente, válido e eficaz” sem que seja necessário qualquer registro, “o qual constitui mera exigência de eficácia do título contra terceiros”. Segundo ele, embora o exercício em caráter privado da atividade notarial e de registro esteja previsto no artigo 236 da Constituição Federal, “não há conceito constitucional fixo e estático de registro público”. “Ao inverso, compete à lei ordinária a regulação das atividades registrais”, afirmou.

Em princípio, conforme o ministro Marco Aurélio, o legislador pode definir os atos jurídicos sujeitos a registro nas serventias extrajudiciais, em especial quando, após analisar o custo benefício, verifica-se que a transcrição do título não apresenta “segurança adicional suficiente ao ato para compensar a burocracia e os ônus impostos às partes sujeitas ao cumprimento da obrigação”. De acordo com ele, é evidente a necessidade de conferir publicidade ao contrato de alienação fiduciária em garantia de automóveis para que o ato tenha eficácia contra terceiros.

“Como no pacto a tradição é ficta e a posse do bem continua com o devedor, uma política pública adequada recomenda a criação de meios conducentes a alertar eventuais compradores sobre o real proprietário do bem, evitando fraudes, de um lado, e assegurando o direito de oposição da garantia contra todos, de outro”, ressaltou.

Porém, o ministro afirmou que, de acordo com o legislador, a exigência de registro em serventia extrajudicial acarreta ônus e custos desnecessários ao consumidor, além de não conferir ao ato a publicidade adequada. “Para o leigo, é mais fácil, intuitivo e célere verificar a existência de gravame no próprio certificado do veículo em vez de peregrinar por diferentes cartórios de títulos e documentos ou ir ao cartório de distribuição nos estados que contam com serviço integrado em busca de informações”, destacou o relator.

O ministro Marco Aurélio entendeu que o Congresso Nacional não age de maneira inconstitucional quando extingue o procedimento registral, “mesmo porque inerente à ideia de serviço público exercido em âmbito público ou privado está o oferecimento de alguma garantia ou comodidade material à coletividade”.

O relator frisou que a transcrição do negócio nas serventias extrajudiciais não é a única forma autorizada pelas normas para conferir publicidade a atos jurídicos. Conforme ele, há diversas atividades análogas realizadas pelo poder público, a despeito do disposto no artigo 236 da Carta Federal, como é o caso do registro da propriedade industrial no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Lei 9.279/96), o registro centralizado de aeronaves (Código Brasileiro de Aeronáutica), entre outros.

Em seu voto, o ministro Marco Aurélio observou que nos processos se pretendeu retirar do legislador ordinário “qualquer liberdade para delimitação da atividade”, fato que colocaria todos os cadastros de informações em banco de dados com acesso geral, sujeitos à disciplina do artigo 236 da CF, o que atingiria atividade realizada por outros entes privados, tais como o serviço de proteção ao crédito. “Não é esse o alcance do preceito do artigo 236”, avaliou.

“Os limites da atividade registral das serventias extrajudiciais, exercida em caráter privado, não são previamente definidos na Constituição Federal”, ressaltou o ministro. Conforme ele, “a imprecisão e o caráter indeterminado da atividade, que não decorre da natureza das coisas, conferem ao legislador maior liberdade para, obedecida a proporcionalidade e o conteúdo mínimo dos conceitos indeterminados, limitar-lhe a amplitude”. O relator considerou, ainda, que não houve ofensa ao princípio da separação dos poderes, “pois a atividade fiscalizatória desempenhada pelo Judiciário é restrita aos serviços prestados pelos cartórios extrajudiciais”.

Ao final, o ministro não admitiu o pedido contido na ADI 4227, em razão de deficiência na petição inicial, uma vez que não houve impugnação de todos os dispositivos relativos à matéria. O relator deferiu parcialmente os pedidos formulados na ADI 4333, assentando que os parágrafos 1º e 2º do artigo 6º da Lei 11.882/2008 não se aplicam aos convênios celebrados antes da publicação da norma, declarando a constitucionalidade do artigo 1.361, parágrafo 1º, segunda parte, do Código Civil, e do artigo 14, parágrafo 7º, da Lei 11.795/2008. Por fim, o ministro Marco Aurélio deu provimento ao RE 611639 para assentar a constitucionalidade do artigo 1.361, parágrafo 1º, segunda parte, do Código Civil, reformando o acórdão recorrido quanto à desnecessidade do registro em cartório do contrato de alienação fiduciária de veículos. O voto do relator foi seguido por unanimidade.

Os ministro Roberto Barroso não votou por estar impedido nos três processos. O ministro Dias Toffoli estava impedido na ADI 4227 e o ministro Luiz Fux na ADI 4333.

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