O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJ-SC), segundo a qual a concessão de incentivos fiscais pelo estado não pode diminuir o repasse do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) constitucionalmente assegurado aos municípios. A matéria foi discutida no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 572762, que teve provimento negado.
A decisão vale para outros sete recursos que tratam do mesmo tema e, por isso, foram julgados em conjunto. São eles: Recursos Extraordinários 482067, 485541, 485553, 499656, 509517, 526831 e 550518.
O caso
O RE 572762 foi interposto pelo estado de Santa Catarina contra acórdão do Tribunal de Justiça local. Favorável à apelação do município de Timbó, o TJ-SC entendeu correto o fundamento de que viola a Constituição Federal a retenção de parcela do ICMS pertencente ao estado catarinense em razão da concessão de incentivos fiscais.
O estado alegava violação aos artigos 158, inciso V e artigo 160, ambos da Constituição Federal. Sustentava que o Programa de Desenvolvimento da Empresa Catarinense (Prodec) é um mecanismo de desenvolvimento sócio-econômico do estado, o qual permite que empresas instaladas em Santa Catarina sejam beneficiadas com uma das formas de incentivo, isto é, financiamento por meio de uma instituição financeira oficial ou a postergação do recolhimento do ICMS. No caso, está em questão esta última forma de incentivo.
No recurso, o estado argumentava que, como o momento do recolhimento do imposto é diferido, não seria possível falar em arrecadação da tributação e muito menos do direito dos municípios à repartição da receita dele decorrente. Segundo o estado, “o fato de os municípios terem direito à parcela da arrecadação de determinado tributo, não lhes confere qualquer competência sobre este, o que somente ocorre quando deixa de existir como tributo e passar a existir como receita pública, ou seja, quando for arrecadado”.
Segundo o parecer da Procuradoria Geral da República (PGR), “o estado de Santa Catarina vem utilizando a cota relativa ao repasse da arrecadação do ICMS pertencente ao município com o intuito de financiar empreendimentos comerciais e industriais”.
Autonomia financeira
O ministro Ricardo Lewandowski, relator do caso, negou provimento ao recurso. O ministro falou da necessidade de haver autonomia financeira do município “porquanto não pode agir com independência aquele que não possui recursos próprios”.
“Percebe-se, pois, da conclusão do tribunal a quo (TJ-SC), que o tributo em tela já havia sido efetivamente arrecadado, sendo forçoso reconhecer que o estado, ao reter a parcela pertencente aos municípios, interferiu indevidamente no sistema constitucional de repartição de rendas”, afirmou o relator.
Lewandowski entendeu que a lei catarinense ofende também outro preceito constitucional. O ministro explicou que, na medida em que o Prodec se qualifica como Programa de Incentivo Fiscal Estadual instituído por lei ordinária local, viola o artigo 155, parágrafo 2º, alínea “g”, da Constituição. De acordo com esse dispositivo, cabe a lei complementar regular a forma como, mediante deliberação dos estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão revogados.
O relator ressaltou que a jurisprudência da Corte é pacífica no sentido de que benefícios tributários concedidos unilateralmente por estados membros afrontam o princípio federativo “por incentivarem a deletéria guerra fiscal”. Assim, citou as ADIs 1179, 2076 e 2377.
Ao final, o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, registrou a importância da matéria. “Trata-se de um pronunciamento que o tribunal faz, uma matéria técnica de distribuição de receita, mas que enfatiza a importância da autonomia municipal naquilo que ela tem de substancial, que é a autonomia financeira a partir dessa rede, dessa tessitura, concebida pelo texto constitucional”, disse Mendes, ao acompanhar o voto do relator, que foi seguido pela unanimidades dos ministros.
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Processo relacionado: RE 572762