A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu parcial provimento ao recurso de uma companhia de seguros e reduziu de três para um ano o prazo prescricional referente à restituição de valores pagos a mais por um aposentado depois de migrar para um novo contrato de seguro de vida.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) havia aplicado a prescrição trienal. No entanto, a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, considerou que a decisão do TJRS – apesar de seguir o entendimento do STJ quanto ao fato de que a prescrição não atinge o fundo de direito – divergiu em relação ao prazo prescricional aplicado em casos semelhantes para a pretensão de repetição de indébito.
“A Terceira Turma, em situações análogas, tem proferido o seu entendimento no sentido de que o prazo prescricional para a propositura de ação objetivando a restituição de prêmios em virtude de conduta supostamente abusiva da seguradora, amparada em cláusula contratual considerada abusiva, é de um ano, por aplicação do artigo 206, parágrafo 1º, inciso II, b, do Código Civil”, disse a ministra.
Mudança de plano
Após a vigência do primeiro plano, contratado em 1992, o segurado firmou novo contrato de seguro em 2002. No documento firmado em 1992, a correção do capital e do prêmio do seguro era vinculada à inflação. Contudo, com o novo acordo, além da correção monetária, foi incluída uma atualização anual do prêmio baseada na faixa etária do segurado, que tinha mais de 60 anos à época da aquisição do novo seguro.
Em ação ajuizada em 2010, o aposentado requereu a revisão do contrato por considerar a medida abusiva, uma vez que, no período de 2003 a 2010, o prêmio mensal – segundo afirmou na petição inicial – foi reajustado em 245,8%, enquanto o valor do seguro aumentou apenas 44,4%. Ele requereu a anulação das novas cláusulas, o restabelecimento das condições originais da apólice de 1992 e a restituição dos valores pagos a maior desde 2002.
Em sua defesa, a seguradora sustentou que a pretensão estava prescrita e que a adesão ao novo contrato era facultativa. Alegou também que a mudança estava amparada em cláusula contratual e que a correção conforme a faixa etária era essencial para a manutenção do equilíbrio econômico do contrato.
Trato sucessivo
O juízo de primeiro grau acolheu parcialmente o pedido do aposentado e decretou a nulidade da cláusula da nova apólice. Condenou a seguradora à devolução simples dos valores pagos a maior no período não atingido pela prescrição, que entendeu ser de um ano. O TJRS manteve o entendimento, mas elevou o prazo prescricional para três anos.
Ao analisar o recurso da seguradora, Nancy Andrighi explicou que a relação jurídica estabelecida entre as partes é de trato sucessivo, com renovação periódica do acordo. A ministra também declarou prescrita qualquer pretensão relativa ao contrato de 1992.
“Ainda que, na espécie, se tenha uma pretensão declaratória vinculada a uma pretensão condenatória, tem-se que, por se tratar de relação de trato sucessivo, não há que se falar em prescrição do fundo de direito, motivo pelo qual é lídima a pretensão de restituição ao segurado das parcelas cobradas indevidamente pela seguradora no período de um ano anterior à propositura da ação”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO. SEGURO DE VIDA. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA DECORRENTE DA EXTINÇÃO DO CONTRATO. IMPRESCRITIBILIDADE AFASTADA. INCIDÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL ÂNUO.1. Ação ajuizada em 02⁄12⁄2010. Recurso especial atribuído ao gabinete em 26⁄08⁄2016. Julgamento: CPC⁄732. O propósito recursal é definir o prazo prescricional aplicável às pretensões deduzidas pelo segurado.3. O recorrido, em sua petição inicial, deduz as seguintes pretensões: i) a de manutenção das condições contratuais previstas na “Apólice 40” (apólice já extinta); ii) a declaração de nulidade da cláusula que prevê o reajuste por mudança de faixa etária prevista na “Apólice Ouro Vida Grupo Especial” (apólice ainda vigente); e iii) também, a repetição de indébito relativa aos valores pagos a maior a este título.4. Quanto à pretensão de manutenção das condições gerais contidas na “Apólice 40” (contrato já extinto), mostra-se imperiosa a aplicação do prazo prescricional anual previsto no art. 206, § 1º, II, “b”, do CC⁄02, que versa sobre a pretensão do segurado contra o segurador.5. Quanto às pretensões relativas ao contrato ainda vigente, constata-se que as mesmas não se restringem à declaração de nulidade das cláusulas contratuais, mas, justamente, à obtenção dos efeitos patrimoniais dela decorrentes, ou seja, a indenização pelos prejuízos advindos do pagamento a maior do prêmio, em virtude da previsão de atualização segundo a mudança de faixa etária.6. O prazo prescricional para a propositura de ação objetivando a restituição de prêmios em virtude de conduta supostamente abusiva da seguradora, amparada em cláusula contratual considerada abusiva, é de 1 (um) ano, por aplicação do art. 206, § 1º, II, “b”, do Código Civil.7. A relação jurídica estabelecida entre as partes é de trato sucessivo, com renovação periódica da avença, devendo ser aplicada, por analogia, a Súmula 85⁄STJ. Logo, não há que se falar em prescrição do fundo de direito e, como consequência, serão passíveis de cobrança apenas as quantias indevidamente desembolsadas nos 12 (doze) meses que precederam o ajuizamento da ação.6. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.
Leia o acórdão.