Com a apresentação de voto-vista, julgamento foi retomado e concluído na sessão desta quarta-feira, mantendo-se as exigências previstas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação e em normas do CNE.
Por seis votos a cinco, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou constitucional a fixação da data limite de 31 de março para que estejam completas as idades mínimas de quatro e seis anos para ingresso, respectivamente, na educação infantil e no ensino fundamental. A decisão da Corte foi tomada nesta quarta-feira (1º) na conclusão do julgamento conjunto da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 17 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 292, que questionavam exigências previstas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/1996) e em normas do Conselho Nacional de Educação (CNE).
A ADPF 292, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra duas normas do CNE , foi julgada improcedente. Prevaleceu o entendimento do relator, ministro Luiz Fux, no sentido de que as exigências de idade mínima e marco temporal previstas nas resoluções do CNE foram precedidas de ampla participação técnica e social e não violam os princípios da isonomia e da proporcionalidade, nem o acesso à educação. Votaram nesse sentido os ministros Luís Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia.
Os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Dias Toffoli e Celso de Mello divergiram. Para eles, a imposição do corte etário ao longo do ano que a criança completa a idade mínima exigida é inconstitucional.
A ADC 17, ajuizada pelo governador de Mato Grosso do Sul, foi julgada procedente para declarar a constitucionalidade dos artigos 24, inciso II, 31 e 32, caput, da LDB e assentar que a idade limite (seis anos) deve estar completa até o início do ano letivo. Prevaleceu a divergência inaugurada pelo ministro Roberto Barroso no sentido da validade da exigência de idade para o ingresso no ensino fundamental, cabendo ao Ministério da Educação definir o momento em que o aluno deverá preencher o critério etário. Ele foi acompanhado pelos ministros Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Cármen Lúcia.
O relator da ação, ministro Edson Fachin, embora considere constitucionais os dispositivos legais que fixam a idade mínima de ingresso, ficou vencido em parte ao não admitir o corte etário previsto na LDB. Em seu entendimento, a idade exigida para matrícula poderia ser completada até o último mês do ano. Também neste processo, ele foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Dias Toffoli e Celso de Mello.
Voto-vista
O julgamento foi retomado nesta quarta-feira com o voto-vista do ministro Marco Aurélio no sentido da constitucionalidade das normas. Para o ministro, a Constituição Federal dá margem para legislador e órgãos do Executivo definirem os critérios etários para ingresso de alunos na educação básica.
O ministro salientou que a adoção da data de 31 de março como corte de idade para matrícula na educação básica foi precedida de discussões e audiências públicas com especialistas de todo o País, conforme narrado em parecer do CNE anexado à ADPF 292. Destacou, ainda, a existência de estudos acadêmicos reconhecidos internacionalmente apontando prejuízos ao desenvolvimento infantil decorrentes da antecipação do ingresso dos alunos na educação básica. Afirmou também que, não tendo ocorrido violação de núcleo essencial de direito fundamental, não cabe ao STF alterar as normas. “Ao Supremo não cabe substituir-se a eles, considerada a óptica de intérprete final da Constituição, sem haver realizado sequer audiência pública nem ouvido peritos na arte da educação”.
O ministro observou que o corte etário não representa o não atendimento das crianças que completem a idade exigida após 31 de março, pois a LDB garante o acesso à educação infantil por meio de creches e acesso à pré-escola, para as que completarem quatro e seis anos depois da data limite.
Para o ministro Celso de Mello, o acesso à educação é direito básico dos cidadãos, não sendo possível que o poder público disponha de amplo grau de discricionariedade que o permita atuar e, por meio de argumentos meramente pragmáticos, comprometer a eficácia desse direito básico. Nesse sentido, entende não ser possível efetuar o corte etário para impedir as crianças que completem a idade mínima ao longo do ano de ingressarem na educação básica.
A ministra Cármen Lúcia votou pela constitucionalidade das idades limite e do corte temporal. Ela observou que, ao estabelecer os critérios, o CNE não atuou de forma arbitrária, pois levou em consideração estudos e as especificidades estaduais. Segundo ela, sem uma data limite de âmbito nacional, haveria uma desorganização do sistema, porque o início do ano letivo não é igual em todas as unidades da federação.
A ADC 17, ficou assim ementada:
Direito Constitucional. Ação Declaratória de Constitucionalidade. Fixação da Idade mínima de 06 (seis) anos para o ingresso no Ensino Fundamental. 1. Ação declaratória de constitucionalidade que tem por objeto os artigos 24, II, 31, I e 32, caput, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que dispõem que o ensino fundamental obrigatório se inicia aos 06 (seis) anos de idade. 2. É constitucional a norma que fixa a idade de 6 (seis) anos como marco para o ingresso no ensino fundamental, tendo em vista que o legislador constituinte utilizou critério etário plenamente compatível com essa previsão no art. 208, IV, da Constituição, de acordo com o qual a educação infantil deve ser oferecida “às crianças até 5 (cinco) anos de idade”. 3. O critério etário está sujeito a mais de uma interpretação possível com relação ao momento exato em que o aluno deva ter 6 (seis) anos completos. Cabe ao Ministério da Educação a definição do momento em que o aluno deverá preenche-lo, pois se trata de órgão dotado de capacidade institucional adequada para a regulamentação da matéria. 4. Procedência parcial do pedido com a fixação da seguinte tese: “É constitucional a exigência de que o aluno possua 06 (seis) anos de idade para o ingresso no ensino fundamental, cabendo ao Ministério da Educação a definição do momento em que o aluno deverá preencher o critério etário”.
Tese
É constitucional a exigência de 6 (seis) anos de idade para o ingresso no ensino fundamental, cabendo ao Ministério da Educação a definição do momento em que o aluno deverá preencher o critério etário.
A ADPF 292, ficou assim ementada:
ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. ARTS. 2º E 3º DA RESOLUÇÃO 1, DE 14 DE JANEIRO DE 2010, E ARTS. 2º A 4º DA RESOLUÇÃO 6, DE 20 DE OUTUBRO DE 2010, DA CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA (CEB) DO CONSELHO NACIONAL DA EDUCAÇÃO (CNE). ALEGAÇÃO DE OFENSA REFLEXA À CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NÃO CONFIGURAÇÃO. MÉRITO. CORTE ETÁRIO PARA MATRÍCULA NO ENSINO INFANTIL E NO ENSINO FUNDAMENTAL. CONSTITUCIONALIDADE. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. NÃO OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO AO PRECEITO DA ACESSIBILIDADE À EDUCAÇÃO INFANTIL. NÃO OCORRÊNCIA. DISCRICIONARIEDADE DO ADMINISTRADOR PÚBLICO. CRITÉRIO DEFINIDO COM AMPLA PARTICIPAÇÃO TÉCNICA E SOCIAL. GESTÃO DEMOCRÁTICA DO ENSINO PÚBLICO. PEDIDO IMPROCEDENTE. 1. As Resoluções CNE/CEB nº 1/2010 e 6/2010, ao estabelecerem um critério único e objetivo para o ingresso às séries iniciais da Educação Infantil e do Ensino Fundamental da criança que tenha, respectivamente, quatro e seis anos de idade, completos até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula, não violam os princípios da isonomia, da proporcionalidade e do acesso à educação. 2. A efetividade das normas consagradoras do direito à educação encontrou suporte nas alterações promovidas pelo constituinte derivado, por meio das Emendas Constitucionais nº 53/2006 e 59/2009, que ampliaram a educação obrigatória a partir dos quatro anos de idade e substituiram o critério da etapa de ensino pelo critério da idade do aluno. 3. A democratização do acesso à leitura, à escrita e ao conhecimento, na primeira infância, acarreta diversos benefícios individuais e sociais, como melhores resultados no desempenho acadêmico, produtividade econômica, cidadania responsável e combate à miséria intelectual intergeracional. 4. A faixa etária não é estabelecida entre as etapas do sistema de ensino porque o que importa é que à criança entre quatro e dezessete anos seja assegurado o acesso à educação, de acordo com sua capacidade, o que não gera inconstitucionalidade na regulamentação da transição entre as etapas de ensino (art. 208, I e IV, da CRFB). 5. Cabe ao poder público desenhar as políticas educacionais conforme sua expertise, estabelecidas as balizas pretendidas pelo constituinte. 5.1 A uniformização da política instituída visa a permitir um percurso escolar contínuo entre os diversos sistemas de ensino e, consoante refletem diversos estudos pedagógicos específicos, permite à criança vivenciar cada etapa de acordo com sua faixa etária. 5.2 Os critérios universalizáveis para o ingresso no ensino fundamental, de cunho impessoal e genérico, são imperiosos em sede de política pública. 5.3 É que a tomada de decisão baseada em regras considera a possibilidade de erros de subinclusão e sobreinclusão e prestigia a teoria da segunda melhor opção (second best), que preserva as virtudes de certeza, segurança, previsibilidade, eficiência, separação de poderes e prevenção de erros de decisão. 6. O corte etário, mercê de não ser a única solução constitucionalmente possível, insere-se no espaço de conformação do administrador, sobretudo em razão da expertise do Conselho Nacional de Educação e de as resoluções terem sido expedidas com ampla participação técnica e social, em respeito à gestão democrática do ensino público (art. 206, VI, da CRFB). 7. As regras objetivas encerram notável segurança jurídica, por isso que a expressão “completos” é inerente a qualquer referência etária, sem que o esforço exegético de se complementar o que já está semanticamente definido possa desvirtuar a objetivação decorrente do emprego de número. 8. O acesso aos níveis mais elevados do ensino, segundo a capacidade de cada um, pode justificar o afastamento da regra em casos bastante excepcionais, a critério exclusivo da equipe pedagógica diretamente responsável pelo aluno, o que se mostra consentâneo com a “valorização dos profissionais da educação escolar” (art. 208, V, da CRFB e art. 206, V, da CRFB) e o apreço à pluralidade de níveis cognitivo-comportamentais em sala de aula. 9. In casu, não se faz necessário verificar a compatibilidade das resoluções expedidas pela Câmara de Educação Básica (CEB) do Conselho Nacional da Educação (CNE) com nenhuma outra norma infraconstitucional, senão diretamente com os parâmetros constitucionais de controle, sendo certo que os dispositivos legais a que fazem remissão apenas atribuem ao Poder Executivo poderes normativos para disciplinar o tema. 10. Pedido improcedente.
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