Plenário confirma que não é necessária autorização prévia para STJ julgar governador

Ao concluir julgamento de três ADIs, Plenário reafirma entendimento de que as unidades federativas não têm competência para editar normas que exijam autorização da Assembleia Legislativa para que o STJ instaure ação penal contra governador .

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, na sessão desta quinta-feira (4), o julgamento de três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs 4798, 4764 e 4797), e confirmou o entendimento de que as unidades federativas não têm competência para editar normas que exijam autorização da Assembleia Legislativa para que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) instaure ação penal contra governador e nem para legislar sobre crimes de responsabilidade. Também foi confirmado que, no caso de abertura de ação penal, o afastamento do cargo não acontece automaticamente.

Ao pacificar esse entendimento, os ministros aprovaram, por unanimidade, uma tese segundo a qual “é vedado às unidades federativas instituírem normas que condicionem a instauração de ação penal contra governador, por crime comum, à previa autorização da casa legislativa, cabendo ao Superior Tribunal de Justiça dispor, fundamentadamente, sobre a aplicação de medidas cautelares penais, inclusive afastamento do cargo”. De acordo com os ministros, o texto será usado como base para a propositura de uma Súmula Vinculante sobre a matéria.

Quanto aos crimes de responsabilidade, os ministros mantiveram entendimento já resumido na Súmula Vinculante 46, segundo a qual a definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são da competência legislativa privativa da União.

Normas questionadas

As ações questionavam as Constituições do Piauí (ADI 4798), do Acre (ADI 4764) e de Mato Grosso (ADI 4797), nos trechos em que tratam da definição de crimes de responsabilidade (infrações político-administrativas), normas sobre processo e julgamento das acusações populares objetivando a decretação de impeachment de governador e que condicionam à prévia autorização da Assembleia Legislativa a instauração, perante o STJ, de ação penal em caso de crime comum supostamente cometido por governador.

Autor das três ações, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) sustentava que os dispositivos questionados nas constituições estaduais violariam o artigo 22, inciso I, da Constituição Federal, que atribui à União a competência privativa para legislar sobre direito processual. Além disso, segundo a OAB, as assembleias legislativas não teriam isenção política para decidir sobre a autorização necessária para a abertura de processo por crime comum contra governador no STJ e também para julgá-lo na própria assembleia nos crimes de responsabilidade.

O julgamento das ações no Plenário do STF começou em agosto de 2015, quando o relator dos três casos, ministro Celso de Mello, alinhou-se à jurisprudência dominante à época no sentido de que eram válidos artigos de constituições estaduais que condicionavam a abertura de ação penal contra governador à autorização prévia da Assembleia Legislativa do respectivo estado. O decano votou, ainda, no sentido de que as unidades federativas não podem editar normas sobre crimes de responsabilidade, uma vez que compete privativamente à União legislar sobre o crime de responsabilidade – entendimento que acabou sendo condensado na Súmula Vinculante 46. O julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso.

Na sessão desta quinta-feira (4), o ministro Barroso apresentou voto-vista em que divergiu parcialmente do relator. Ao defender uma mudança na jurisprudência do Supremo quanto à necessidade de autorização das casas legislativas para a abertura de ação penal contra governadores, salientou que existem três situações que legitimam uma mutação constitucional e a superação de uma jurisprudência consolidada: quando há uma mudança na percepção do direito, quando existem modificações na realidade fática e por força das consequências práticas negativas de uma determinada linha de entendimento. E, para o ministro, no caso concreto, esses três requisitos estão presentes.

Houve uma mudança na percepção do direito e mudou, também, a realidade fática, representada por uma “imensa demanda da sociedade por um pouco mais de decência no mundo político”. Além disso, o ministro salientou as consequências nefastas produzidas pelo entendimento anterior, que culminou na impossibilidade da instauração de ações penais contra governadores, mesmo em caso de evidentes violações à legislação penal.

Quanto ao processamento de ações por crimes de responsabilidade, o ministro manteve o entendimento já assentado na Súmula Vinculante 46, segundo o qual “a definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são da competência legislativa privativa da União”.

Por fim, o ministro Barroso frisou seu ponto de vista contrário ao afastamento automático do governador no caso de abertura de ação penal. O simples recebimento de uma denúncia, um ato de baixa densidade decisória, segundo o ministro, não pode importar em afastamento automático do governador. Esse afastamento só pode ocorrer se o STJ entender que há elementos a justificá-lo. O governador pode ser afastado, mas não como decorrência automática do recebimento da denúncia, explicou o ministro.

Acompanharam esse entendimento a ministra Rosa Weber e os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Cármen Lúcia.

O relator, ministro Celso de Mello, que manteve o voto anteriormente proferido, ficou vencido no ponto referente à necessidade de autorização da casa legislativa para instauração de ação penal. O decano afirmou, contudo, que a partir desse julgamento vai observar em seus votos a nova diretriz jurisprudencial.

Atuação individual

Ao final da sessão, os ministros decidiram que os relatores dos demais casos em tramitação no Supremo sobre a mesma matéria poderão decidir monocraticamente as ações, aplicando o entendimento registrado na tese aprovada.

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