A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Marabá/PA a favor do Ministério Público Federal (MPF). A ação civil pública ajuizada pelo MPF buscou tornar nula a transferência de 407,9968 hectares (ha) de área da União a um ex-prefeito do Município de São João do Araguaia e posteriormente alienado a uma ex-prefeita, pelo valor de R$14.245,00, e da área remanescente de 180,9159 ha que continua na propriedade do município, mas não foi dada a destinação na doação, totalizando 599,1776 ha.
A doação pelo Grupo Executivo de Terras do Araguaia/TO (Getat) dos 599,1776 ha ao município de São João do Araguaia teve por finalidade a expansão de sua sede e a regularização de suas ocupações urbanas mediante o cumprimento de cláusulas do termo de doação.
Desse total, a sentença reconheceu a nulidade do título definitivo expedido em nome do ex-prefeito porque não foram cumpridas as cláusulas do termo de doação; a nulidade da doação das áreas remanescentes e a reversão da área toda ao patrimônio da União.
Inconformados, a ex-prefeita e os representantes do espólio do ex-prefeito recorreram ao TRF1 alegando prescrição porque não se trata de ação civil pública por ato de improbidade administrativa, aplicando-se ao caso o prazo prescricional de cinco anos.
Litígio – Na análise do processo, o relator, desembargador federal Souza Prudente, verificou que as terras ocupadas são objeto de litígio porque não foram cumpridas as cláusulas do termo de doação inicial. O art. 183, § 3º e art. 191, parágrafo único da Constituição Federal (CF) prevê a imprescritibilidade dos bens públicos litigiosos, independentemente de ser ou não ação civil pública por ato de improbidade administrativa, prosseguiu o magistrado.
“Com efeito, a ocupação ilícita de terra pública, derivando de outro ato eivado de nulidade, não pode ser convalidada pelo decurso do tempo, isto é, ocupação de imóvel público não gera posse, mas mera detenção, conforme preconiza o enunciado de Súmula 619 do STJ”, sendo nesse mesmo sentido a jurisprudência do TRF1, observou o relator.
O recurso ficou assim ementado:
CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. NULIDADE DE DOAÇÃO DE TERRAS RURAIS REMANESCENTES. REVERSÃO DO IMÓVEL EM FAVOR DA UNIÃO FEDERAL. CANCELAMENTO DE REGISTRO NA MATRÍCULA. INTIMAÇÃO PARA REGULARIZAR REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. ATO PROCESSUAL NA PESSOA DO ADVOGADO DA PARTE. VALIDADE. INDEFERIMENTO DE PROVA TESTEMUNHAL. INUTILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. AUSÊNCIA. IMPRESCRITIBILIDADE DOS BENS PÚBLICOS. SENTENÇA CONFIRMADA.
I – Não merece prosperar a alegação de nulidade do processo por falta de intimação pessoal de corréu, na medida em que as intimações das partes, em regra, são feitas na pessoa do advogado, a teor dos arts. 269 a 275 do CPC vigente, sendo que a intimação pessoal representa a exceção, nos casos em que a manifestação da parte não exige capacidade postulatória, o que não se verifica, na espécie dos autos, em que os promovidos foram intimados, por meio de seu patrono, a fim de que apresentassem a procuração outorgada àquele, uma vez que a contestação oferecida veio desacompanhada do instrumento procuratório. Ademais, em face da inércia da parte requerida, determinou-se sua revelia, mas sem a aplicação dos seus efeitos, o que afasta qualquer prejuízo processual.
II – No que tange ao indeferimento da prova testemunhal, não há que se falar em nulidade da sentença por cercamento de defesa, na medida em que as provas já colhidas, na hipótese dos autos, mostram-se suficientes para a solução da questão discutida, a justificar a rejeição dos requerimentos de provas inúteis ou meramente protelatórias, a teor do art. 370, parágrafo único, do CPC vigente.
III – A imprescritibilidade dos bens públicos litigiosos, na espécie, decorre de previsão constitucional (CF, art. 183, §3º e art. 191, parágrafo único), e não de eventual natureza jurídica de ação civil pública por ato de improbidade administrativa. Com efeito, a ocupação ilícita de terra pública, derivando de outro ato eivado de nulidade, não pode ser convalidada pelo decurso do tempo, isto é, ocupação de imóvel público não gera posse, mas mera detenção, conforme preconiza o enunciado de Súmula 619 do STJ, que dispõe que “a ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias”.
IV – Apelação dos réus parcialmente provida para reduzir o valor da indenização por danos morais para o montante de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), mantendo, no mais, a sentença recorrida. Inaplicabilidade, no caso, do art. 85, § 11, do CPC, por se tratar de recurso interposto em sede de ação civil pública.
Processo: 0006830-60.2014.4.01.3901