Ministro Ayres Britto vota pela constitucionalidade de normas que vedam o uso do amianto

No julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 3357 e 3937, que questionam as Leis estaduais 11.643/01 (RS) e 12.684/07 (SP) que tratam da proibição do uso, produção e comercialização de produtos que contenham amianto, o ministro Ayres Britto, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), votou pela improcedências das ações. Ele foi o primeiro ministro a votar sobre a matéria, tendo em vista ser o relator da ADI 3357.

O ministro Ayres Britto afirmou que a Constituição Federal deve ser aplicada de forma imediata, ou seja, sem a mediação de outro diploma normativo. Assim, ele afirmou que “por se cuidar de competência legislativa, igualmente primária, a União não precisa esperar pelos estados e os estados não precisam esperar pela União”. “Se a União resolve tomar a dianteira do ato de legislar pode fazê-lo, mas há de se conter na produção de normas gerais”, completou.

Segundo o presidente do STF, os estados e o Distrito Federal deverão produzir normas do tipo suplementar. “A norma suplementar é para acudir, solver os eventuais déficits de que venham a padecer as normas gerais editadas pela União”, explicou, ressaltando que essas normas não têm caráter nacional, portanto apenas são válidas no território dos estados e do DF. “Como as normas gerais não são plenas e as normas suplementares não são plenas, é dessa adição das normas gerais da União e suplementares dos estados que se alcança a plenitude normativa, que se perfaz em torno de um bem jurídico de matriz constitucional”, afirmou.

O relator salientou que os bens jurídicos contidos na Constituição Federal – como meio ambiente e saúde, entre outros – “têm um invariável sentido digno de toda a proteção normativa”. “Essa ideia de defesa e proteção tanto do consumidor quanto da saúde, já decola da verificação de serem ambos os bens jurídicos classificados como fundamentais”, disse.

O Supremo, conforme o ministro Ayres Britto, já firmou a tese que a Convenção 162, da OIT, pelo menos quando dispõe sobre a proteção da saúde dos trabalhadores [direitos humanos] “tem status de norma supralegal porque a própria Constituição Federal lhe deu primazia”. Ele recordou que o artigo 59 da CF lista os atos que inovam primariamente a ordem jurídica, ou seja, estão logo abaixo da Constituição sem precisar de outra mediação legislativa. Também afirmou que os tratados internacionais também são veículos primários de direitos e deveres.

Ao analisar a ADI 3357, o presidente da Corte entendeu que a norma estadual questionada ao proibir a comercialização de produtos à base de amianto, “em verdade, cumpre muito mais a Constituição Federal no plano da proteção da saúde – inclusive evita riscos à saúde da população em geral, dos trabalhadores em particular, do meio ambiente – do que a lei federal”. Para ele, “a legislação estadual está muito mais próxima do sumo princípio da eficacidade máxima da Constituição em tema de direitos fundamentais”.

De acordo com o ministro, a lei gaúcha está em sintonia também com outra norma constitucional, contida no artigo 7º, inciso XII, que diz que é direito dos trabalhadores a redução dos riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança. Além disso, ele acrescentou que “a norma é precedida de estudos e debates conclusivamente demonstradores das nocividades do amianto em qualquer das suas modalidades”.

Livre iniciativa

Ao final de seu voto, o ministro Ayres Britto destacou que a legislação atacada não contrariou o princípio da livre iniciativa. Segundo ele, a Constituição, ao tratar da ordem econômica, determina que tal ordem é também fundada na valorização do trabalho humano e tem por fim assegurar a todos uma existência digna. “E entre os princípios a serem observados estão, igualmente, a defesa do consumidor e do meio ambiente (artigo 170, incisos V e VI), valores a que deve se conformar a livre iniciativa como elemento de sua própria compostura jurídica, porque a ordem econômica que consagra a livre iniciativa também consagra a proteção e defesa do consumidor e do meio ambiente”, avaliou.

O ministro considerou que a norma estadual concretizou o princípio econômico da função social da propriedade e da defesa do meio ambiente “de parelha com a proteção do trabalhador, da saúde pública e da defesa dos direitos humanos, sendo induvidoso o dano que, à saúde humana, é causado por qualquer variedade de amianto, donde o próprio parágrafo único do artigo 2º da Lei 9.055/95 certifica a nocividade do ambiente crisotila, inclusive”.

“Considerando que a legislação internacional impõe a substituição desse produto, não vejo como reconhecer a inconstitucionalidade”, ressaltou o ministro, ao votar pela improcedência das ADIs. Ele finalizou esclarecendo que a lei gaúcha previu o estabelecimento de prazos razoáveis de três e quatro anos para que os estabelecimentos industriais e comerciais se adequassem às novas regras. “Houve tempo suficiente para o sereno planejamento e execução das medidas que então se impunham”, completou.

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