A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu que uma médica cubana pode participar do chamamento público para reincorporação ao Programa Mais Médicos apesar de seu nome não constar na relação dos profissionais fornecida pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
Consta dos autos que a médica participou em 2018 do programa, foi desligada com a finalização do acordo entre Brasil, Cuba e Opas e permaneceu no território nacional até a data de publicação da Medida Provisória nº 890 (que instituiu o Programa Médicos pelo Brasil), de 1º de agosto de 2019, na condição de naturalizada, residente ou com pedido de refúgio.
A União apelou requerendo o indeferimento dos pedidos da autora com fundamento na alocação de vagas e na legitimidade dos critérios adotados para a ocupação dos cargos, mas o relator da apelação, desembargador federal Carlos Augusto Pires Brandão, percebeu que o recurso não poderia sequer ser analisado, já que o assunto não foi debatido no processo.
Conforme o princípio da “congruência recursal” e de acordo com a jurisprudência do TRF1, o magistrado explicou que “não se conhece do recurso quando as razões são dissociadas dos fundamentos da sentença”.
Porém, afirmou o desembargador que quanto ao mérito (a questão central), o processo sim deveria ser analisado em razão da remessa necessária, instituto do Código de Processo Civil (artigo 496), também conhecido como reexame necessário ou duplo grau obrigatório, que exige que o juiz encaminhe o processo ao tribunal, havendo ou não apelação das partes, sempre que a sentença for contrária a algum ente público.
Sentença mantida – Sob essa ótica, o magistrado entendeu que a médica cubana preenche os requisitos estabelecidos no edital de chamamento, quais sejam: estava no exercício de suas atividades, no dia 13 de novembro de 2018, no âmbito do Projeto Mais Médicos para o Brasil; foi desligada do Projeto em virtude da ruptura do acordo de cooperação entre o Ministério da Saúde Pública de Cuba e a Opas e permaneceu no território nacional até a data de publicação da Medida Provisória nº 890 (que instituiu o Programa Médicos pelo Brasil), de 1º de agosto de 2019, na condição de naturalizada, residente ou com pedido de refúgio.
Sendo assim, concluiu o relator, conforme a lei e a jurisprudência da 5ª Turma, “afigura-se desarrazoado impedir a participação do médico no chamamento público de reincorporação ao Programa apenas por seu nome não constar na lista da OPAS”, e a sentença deve ser mantida.
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. INSCRIÇÃO NO CHAMAMENTO PÚBLICO PARA O CARGO DE MÉDICO INTERCAMBISTA. APELAÇÃO QUE VERSA SOBRE O MÉRITO DA AÇÃO. RAZÕES DISSOCIADAS DOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. OFENSA AO PRINCÍPIO DA CONGRUÊNCIA RECURSAL. RECURSO NÃO CONHECIDO.
1. Não se conhece do recurso na hipótese em que as razões de impugnação estão dissociadas dos fundamentos da sentença recorrida. Precedentes.
2. No caso dos autos, a sentença recorrida julgou parcialmente procedente o pedido, garantido à apelada, tão somente, o direito de manifestar o seu interesse na participação do chamamento público. Nesse contexto, a União apelou com fundamento na alocação de vagas e na legitimidade dos critérios adotados para ocupação de cargos. Percebe-se, de plano, que a apelação não está em consonância com a sentença recorrida. A apelante trata de assunto não debatido nos autos, sem impugnar os fundamentos da sentença.
3. Tendo sido comprovado todos os requisitos estabelecidos pelo Edital, afigura-se desarrazoado impedir a participação do médico no chamamento público de reincorporação ao Programa apenas por seu nome não constar na lista da OPAS. Precedentes desta Turma.
4. Apelação não conhecida e remessa necessária desprovida.
A decisão do Colegiado foi unânime acompanhando o voto do relator.
Processo: 1047888-64.2020.4.01.3400