A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve condenação imposta à Hyundai Caoa do Brasil por propaganda enganosa, consistente em repassar a veículos de comunicação especializados que a versão básica do modelo i30 seria comercializada com itens de série que mais tarde foram oferecidos apenas nas versões mais luxuosas do modelo.
Condenada a pagar R$ 1 milhão por danos morais difusos, a empresa alegou, no recurso ao STJ, que os fatos não configuraram publicidade ilícita, nem justificam a indenização. Segundo ela, houve confusão por parte das revistas especializadas quanto aos itens de série do i30.
De acordo com o Ministério Público, uma das matérias publicadas em uma revista automotiva afirmava que o i30 versão básica viria equipado com diversos air bags, freios ABS, CD/MP3, além de comandos de som no volante, sensor de estacionamento e ar-condicionado.
Questionada, a revista declarou que os dados foram fornecidos única e exclusivamente pela Hyundai. Nem todos esses itens, segundo o processo, estavam presentes na versão básica.
Informações falsas
Para o ministro Villas Bôas Cueva, relator do recurso, é impossível negar o intuito de ludibriar o consumidor no comportamento adotado pela montadora meses antes do lançamento do carro, ao “inundar” a imprensa especializada com informações falsas, “de modo a criar no imaginário popular a falsa impressão de que seria infinitamente superior aos veículos de mesma categoria oferecidos por suas concorrentes”.
Ele lembrou que o sistema de tutela da publicidade trazido pelo Código de Defesa do Consumidor está orientado por uma série de princípios que se propõem a limitar o uso das técnicas publicitárias, com o objetivo de evitar “a exposição do público consumidor a eventos potencialmente lesivos aos direitos tutelados pelo referido diploma legal”.
Dentre esses princípios, o relator destacou os da identificação obrigatória, da publicidade veraz, da vinculação contratual e da correção do desvio publicitário.
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Villas Bôas Cueva rejeitou a tese da Hyundai de que teria havido confusão por parte dos jornalistas que escreveram sobre o i30. Ele observou que, tanto em primeira quanto em segunda instâncias, ficou reconhecido que a empresa veiculou anúncios publicitários reiterando as informações, “fato que joga pá de cal na tentativa de convencer esta Corte Superior que tudo não passou de equívoco cometido pelos jornalistas”.
O relator disse que as técnicas publicitárias utilizadas (informações falsas em matéria de aparência jornalística) revelam o nítido propósito de dificultar que o público as identificasse como tais, caracterizando concorrência desleal e ofensa ao princípio da publicidade veraz.
Sobre os danos morais difusos, o ministro explicou que eles foram arbitrados após minuciosa análise das provas do processo, e foi justamente a gravidade dos fatos que levou as instâncias ordinárias a reconhecerem a necessidade da indenização. A revisão dessa conclusão pelo STJ é inviável devido à Súmula 7, ressaltou Villas Bôas Cueva.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROPAGANDA ENGANOSA. VEÍCULO AUTOMOTOR. INTRODUÇÃO NO MERCADO NACIONAL. DIFUSÃO DE INFORMAÇÕES EQUIVOCADAS. ITENS DE SÉRIE. MODELO BÁSICO. LANÇAMENTO FUTURO. DANO MORAL DIFUSO. CONFIGURAÇÃO. REEXAME DA MATÉRIA. REVOLVIMENTO DE PROVAS E FATOS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7⁄STJ.1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3⁄STJ).2. Na origem, trata-se de ação Ação Civil Pública promovida em desfavor da empresa fabricante de veículos com o propósito de reprimir ações publicitárias enganosas do automóvel modelo i30, que trariam indicações falsas a respeito das características e dos chamados itens de série de sua versão mais básica. Inicial que contém pedido indenizatório (por danos morais difusos) e cominatório (obrigação de realizar contrapropaganda).3. Acórdão recorrido que, mantendo hígida a sentença condenatória no tocante ao reconhecimento da prática publicitária ilícita, majora a indenização fixada a título de compensação por danos morais difusos para o patamar de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).4. Recurso especial interposto pelo empresa ré objetivando desconstituir o julgado sob a alegação de que os fatos ocorridos não configurariam propaganda enganosa e também não dariam azo a ocorrência de danos morais difusos.5. O sistema de tutela da publicidade trazido pelo Código de Defesa do Consumidor encontra-se assentado em uma série de princípios norteadores que se propõem a direcionar e limitar o uso das técnicas de publicidade, evitando, assim, a exposição do público consumidor a eventos potencialmente lesivos aos direitos tutelados pelo referido diploma legal. Dentre estes princípios, merecem destaque, os da identificação obrigatória, da publicidade veraz, da vinculação contratual e da correção do desvio publicitário.6. O acervo probatório carreado nos autos (que não pode ser objeto de reexame na via especial por força do que dispõe a Súmula nº 7⁄STJ) apontou para a existência de ação deliberada da fabricante com o propósito de levar a erro a imprensa especializada e, consequentemente, o público consumidor, ao repassar a veículos de comunicação especializados a respeito da indústria automotiva, a falsa informação de que a versão mais básica do automóvel Hyundai i30, seria comercializado no país contendo determinados itens de série que, mais tarde, se fizeram presentes apenas em versões mais luxuosas do referido veículo.7. Impossível negar o intuito de ludibriar o consumidor, no comportamento adotado por empresa revendedora de automóveis que, meses antes do lançamento de determinado modelo no mercado nacional, inunda a imprensa especializada com informações falsas a respeito do mesmo, de modo a criar no imaginário popular a falsa impressão de que seria infinitamente superior aos veículos de mesma categoria oferecidos por suas concorrentes.8. O dano moral difuso, compreendido como o resultado de uma lesão a bens e valores jurídicos extrapatrimoniais inerentes a toda a coletividade, de forma indivisível, se dá quando a conduta lesiva agride, de modo injusto e intolerável, o ordenamento jurídico e os valores éticos fundamentais da sociedade em si considerada, a provocar repulsa e indignação na própria consciência coletiva. A obrigação de promover a reparação desse tipo de dano encontra respaldo nos arts. 1º da Lei nº 7.347⁄1985 e 6º, VI, do CDC, bem como no art. 944 do CC.9. A hipótese em apreço revela nível de reprovabilidade que justifica a imposição da condenação tal e qual já determinada pelas instâncias de origem. Além disso, a revisão das conclusões do acórdão ora hostilizado encontra, também nesse ponto específico, intransponível óbice na inteligência da Súmula nº 7⁄STJ.10. Recurso especial não provido.
Leia o acórdão.