Cheiro de maconha no suspeito justifica busca pessoal, mas falta de outras provas impede entrada no domicílio

Para a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao sentirem cheiro forte de maconha em pessoa que já é investigada sob a suspeita de tráfico de drogas, os policiais podem revistá-la em busca de provas. Contudo, o fato de a busca se mostrar infrutífera não autoriza a polícia a entrar na casa do suspeito sem mandado judicial, ainda que com autorização de outro morador.

Com esse entendimento, o colegiado confirmou decisão monocrática do relator, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, que concedeu habeas corpus para reconhecer a ilicitude das provas e absolver um réu acusado de tráfico.

De acordo com o processo, a polícia vinha investigando informações anônimas sobre possível traficância por parte do indivíduo. Após ele receber uma visita suspeita, a Polícia Militar foi chamada pelo investigador de campana. Ao abordar o morador diante da residência, os policiais perceberam que ele exalava cheiro de maconha e fizeram uma busca pessoal.

A revista não encontrou nada de ilícito. Mesmo assim, os policiais entraram na residência, com suposta autorização da mãe do investigado, e encontraram aproximadamente três gramas de cocaína e dois de maconha no local. O suspeito confessou que era usuário de drogas, mas acabou sendo denunciado por tráfico.

Entrada forçada em domicílio exige indícios concretos de crime no local

O ministro Reynaldo Soares da Fonseca explicou que, conforme decido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no RE 603616, a entrada forçada da polícia na residência, sem mandado judicial, mesmo na hipótese de crime permanente – como o tráfico de drogas –, depende da existência de razões concretas que justifiquem a mitigação do princípio da inviolabilidade do domicílio.

“Somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito em questão”, completou.

Como exemplo de situações que podem convalidar a entrada dos agentes de segurança na casa do suspeito, o relator citou a fuga sem motivação e a posterior confirmação de flagrante, a comprovação de que houve ação de inteligência prolongada antes da entrada na residência e a confirmação de que o domicílio é utilizado para o tráfico de drogas.

No caso dos autos, embora tenha entendido que a abordagem policial e a busca pessoal tenham sido devidamente justificadas em razão da investigação prévia e do cheiro de maconha no suspeito, Reynaldo Soares da Fonseca apontou que os agentes não tinham justificativa para, após a revista do investigado, entrar no imóvel e prosseguir na diligência.

“Dessa forma, embora a abordagem tenha sido efetivamente lícita, o fato de não ter sido encontrado nada de ilícito com o paciente impede o posterior ingresso no seu domicílio, ainda que tenha havido a autorização de sua genitora, haja vista a ausência de dados concretos e objetivos que revelassem fundadas razões para a diligência. Reitero que nada de ilegal foi encontrado com o paciente na busca pessoal, não se justificando, portanto, o ingresso em seu domicílio”, concluiu o ministro.

O recurso ficou assim ementado:

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. 1. BUSCA PESSOAL. FUNDADAS RAZÕES PRESENTES. FORTE CHEIRO DE MACONHA. 2. BUSCA DOMICILIAR. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. NADA DE ILÍCITO ENCONTRADO NA BUSCA PESSOAL. AUTORIZAÇÃO DA GENITORA. IRRELEVÂNCIA. PRECEDENTES DESTA CORTE. 3. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

  1. Não há dúvidas sobre a legalidade da busca pessoal realizada no paciente, porquanto devidamente indicados elementos concretos indicativos de justa causa, uma vez que o paciente já vinha sendo investigado e exalava “forte cheiro de maconha”. Entretanto, “realizada a busca pessoal no denunciado, nada de ilícito foi encontrado”, tendo ele próprio confessado aos policiais ser mero usuário de drogas.
  2. Embora a abordagem tenha sido efetivamente lícita, o fato de não ter sido encontrado nada de ilícito com o paciente impede o posterior ingresso no seu domicílio, ainda que tenha havido a autorização de sua genitora, haja vista a ausência de dados concretos e objetivos que revelassem fundadas razões para a diligência. Reitere-se que nada de ilegal foi encontrado com o paciente na busca pessoal, não se justificando, portanto, o ingresso em seu domicílio, onde foram encontrados 3,81g de cocaína e 2,9g de maconha.

– “O fato de a abordagem ao agravado provir de denúncia anônima apenas se convalidaria se algum indício de crime fosse observado pelos policiais em sua observação prévia, na via pública, o que não ocorreu.

Nesse contexto, o consentimento do morador não parece ser suficiente para autorizar o ingresso sem mandado judicial na residência do agravado”. (AgRg no HC n. 762.608/RJ, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 6/9/2022, DJe de 15/9/2022.)

  1. Agravo regimental a que se nega provimento

Leia o acórdão no HC 838.089.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): HC 838089

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