Admitido recurso ao STF sobre legitimidade do MP para ajuizar ação civil pública que discute isenção tributária para PCD

O vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Og Fernandes, admitiu o recurso extraordinário do Ministério Público Federal (MPF) contra a decisão da Primeira Seção do STJ que entendeu ser inviável o ajuizamento de ação civil pública pelo órgão ministerial para discutir isenção tributária para pessoas com deficiência (PCD).

De acordo com os autos, o MPF ajuizou ação civil pública para contestar a Instrução Normativa (IN) 988/2009 da Receita Federal do Brasil (RFB), que dispõe sobre a isenção de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) na aquisição de veículos automotores por parte de pessoas com deficiência (PCD).

A Primeira Seção do STJ, por maioria de votos, entendeu pela ilegitimidade do MPF, sob o argumento de que o artigo 1º, parágrafo único, da Lei 7.347/1985, que disciplina a ação civil pública, veda o ajuizamento da referida ação para veicular pretensões que envolvam tributos.

Tema está profundamente relacionado com matéria constitucional

No recurso extraordinário, o MPF defendeu inexistir debate puramente tributário na hipótese, uma vez que a isenção de IPI na aquisição de veículos automotores por pessoas com deficiência já é reconhecida, sem nenhuma margem de dúvida, na legislação. O órgão esclareceu que a questão versa sobre a regra da RFB condicionante do benefício à comprovação de renda própria e exclusiva pelo deficiente.

O ministro Og Fernandes destacou que, apesar da IN 988/2009 já ter sido revogada, o interesse na tese permanece existente, pois a IN RFB 1.769/2017, na redação dada pela IN RFB 2.081/2022, mantém a exigência da comprovação de renda.

Segundo o ministro Og Fernandes, o tema debatido no processo está profundamente relacionado com matéria constitucional, uma vez que envolve a tutela de direitos individuais indisponíveis, a concretização de direitos fundamentais consagrados na Constituição Federal e a tutela de direitos da coletividade de pessoas com deficiência.

Além disso, de acordo com Og Fernandes, toda a manifestação contida na decisão da Primeira Seção  está embasada na aplicabilidade do Tema 645 do STF ou no reconhecimento de distinção entre ele e a hipótese dos autos.

“Assim, prudente submeter ao órgão jurisdicional próprio a apreciação da extensão do alcance de seus precedentes, pressupondo a possibilidade de reconhecimento de eventual violação da sua compreensão. Lado outro, verificando a adequação entre o julgado ora recorrido e sua tese vinculante, poderá a Corte destinatária do pleito igualmente reafirmar sua jurisprudência”, declarou.

O recurso ficou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA AJUIZAR AÇÃO CIVIL PÚBLICA SOBRE MATÉRIA TRIBUTÁRIA. LEI N. 7.347⁄1985. VEDAÇÃO.
I – O feito decorre de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal para contestar a IN n. 988⁄2009 da Receita Federal que dispõe sobre a isenção de IPI e IOF na aquisição de veículos automotores por parte dos portadores de “deficiências físicas”.
II – O parágrafo único do art. 1º da Lei n 7.347⁄1985, que disciplina a ação civil pública, veda o ajuizamento da referida ação para veicular pretensões que envolvam tributos. A referida vedação direcionada ao tema impede a utilização da ação coletiva para tutelar direito individual homogêneo disponível, e que pode ser defendido individualmente em demandas autônomas.
III – Nesse contexto é inviável o ajuizamento de ação civil pública pelo Ministério Público para discutir a relação jurídico-tributária. Precedentes: REsp 1.541.275⁄PR, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 17⁄12⁄2015, DJe 18⁄12⁄2015 e AgInt no REsp 1.502.258⁄SP, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 23⁄9⁄2019, DJe 25⁄9⁄2019.
IV – Matéria já apreciada por esta Primeira Seção (EREsp 505.303⁄SC, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11⁄06⁄2008, DJe 18⁄08⁄2008) e na Corte Especial (AgRg na Pet 1.093⁄RS, Rel. Ministro NILSON NAVES, CORTE ESPECIAL, julgado em 24⁄10⁄2002, DJ 16⁄12⁄2002, p. 223 RSTJ vol. 166, p. 21).
V – Refira-se, ainda, o tema 645, STF: “O Ministério Público não possui legitimidade ativa ad causam para, em ação civil pública, deduzir em juízo pretensão de natureza tributária em defesa dos contribuintes, que vise questionar a constitucionalidade⁄legalidade de tributo.”
VI – Embargos de divergência providos.

Leia mais:

MP não pode ajuizar ação civil pública sobre restituição de empréstimo compulsório, decide Primeira Turma

Leia o acórdão no RE no REsp 1.428.611.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): EREsp 1428611

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