Na sessão desta terça-feira (22), por unanimidade de votos, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu parcialmente denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF), no Inquérito (INQ) 4112, contra o senador Fernando Collor de Mello (PTC-AL), o empresário Pedro Paulo Bergamaschi de Leoni Ramos (apontado como operador particular de Collor) e Luís Pereira Duarte de Amorim (tratado pela acusação como administrador de empresas do senador) pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Os fatos se referem a supostas irregularidades perpetradas no âmbito da Petrobras Distribuidora S/A – BR Distribuidora, objeto de investigação da Operação Lava-Jato.
De acordo com o MPF, em razão do apoio ao governo federal, o PTB, à época legenda do senador, pôde indicar nomes para cargos na BR Distribuidora, o que propiciou, entre os anos de 2010 e 2014, que os denunciados tenham integrado organização criminosa com o propósito de desviar recursos em proveito particular, corromper agentes públicos e branquear valores, a partir da influência, junto à sociedade de economia mista, do senador Fernando Collor.
Além do senador, foram denunciados Luís Pereira Duarte de Amorim, Fernando Antônio da Silva Tiago (assessor parlamentar), Pedro Paulo Bergamaschi de Leoni Ramos, Caroline Serejo Medeiros Collor de Mello (esposa do senador), Eduardo Bezerra Frazão (diretor financeiro de empresa do senador), William Dias Gomes (assessor parlamentar) e Luciana Guimarães de Leoni Ramos (esposa de Pedro Paulo). Outro acusado, Cleverton Melo da Costa, falecido em maio de 2016, teve reconhecida a extinção da punibilidade. Os crimes apontados pelo MPF foram corrupção passiva, lavagem de dinheiro, organização criminosa, peculato, fraude a licitações, violação de sigilo funcional e obstrução às investigações.
Corrupção passiva
Ao receber a denúncia no tocante ao delito de corrupção passiva, com exclusão da apontada causa de majoração, o ministro Edson Fachin, relator, citou trechos da denúncia com depoimentos de colaboradores e testemunhas, bem como provas documentais, como mensagens eletrônicas e espelhos de transações bancárias, que apontam para a suposta prática do delito pelos denunciados Fernando Collor, Pedro Paulo e Luís Pereira Duarte. Citou, ainda, resultado de um relatório elaborado pelo Grupo de Trabalho de Averiguação da Petrobras, que em procedimento interno averiguou irregularidades nos contratos objetos da investigação da Polícia Federal, firmados, entre outros, com a empresa UTC.
Para o ministro, a descrição da denúncia torna plausível imputar ao senador alagoano o poder de influir nos contratos investigados, com objetivo de proveito próprio. Da mesma forma, segundo o relator, provas documentais juntadas aos autos, bem como depoimentos de colaboradores e testemunhas, demonstram a plausibilidade da acusação do MPF segundo a qual Pedro Paulo seria operador particular do parlamentar no suposto esquema, intermediando repasses de valores, em espécie e por meio de depósitos em contas, bem como indícios da atuação de Luís Pereira Duarte Amorim, diretor de uma das empresas do senador.
Lavagem de dinheiro
Ao aceitar a denúncia quanto ao delito de lavagem de dinheiro, o ministro frisou que documentos relativos a movimentações financeiras dos acusados coincidem com as afirmações de colaboradores e testemunhas no sentido do uso de estratégias para dissimular e ocultar a origem ilícita dos recursos, operacionalizada por meio de depósitos bancários fracionados, empréstimos fictícios, aquisições diversas, transferências internacionais e custeios de despesas pessoais. Nesse ponto, o ministro citou como exemplos a compra, em nome de pessoas jurídicas, de cinco carros de luxo – Ferrari, Lamborghini, Bentley, Land Rover e Porsche –, imóveis – como uma casa em Campos do Jordão avaliada em R$ 4 milhões – antiguidades e obras de arte, como um quadro de Di Cavalcanti.
Para o ministro, o MPF conseguiu descrever, com nitidez, os supostos mecanismos utilizados, em tese, para reintegrar os valores advindos de origem ilícita à economia regular, por parte dos acusados Fernando Collor, Pedro Paulo e Luís Pereira Duarte Amorim.
Organização criminosa
Por fim, ao receber a denúncia no ponto em que acusa o senador, Pedro Paulo e Luís Pereira pela prática do delito de integrar organização criminosa, o ministro disse que a descrição do MPF e os elementos juntados aos autos apontam a existência de prova mínima de uma complexa estrutura que atuou entre os anos de 2010 e 2014, com estabilidade e permanência.
Ao finalizar seu voto, o ministro ressaltou que, ao contrário do que apontam as defesas dos acusados, a denúncia, ao menos na parte recebida, não está amparada apenas em colaborações premiadas. Existem inúmeros indícios que reforçam os depoimentos prestados, como testemunhas, dados telemáticos e documentos.
Rejeição
Todas as imputações relativas aos denunciados Fernando Antônio da Silva Tiago, Caroline Serejo Medeiros Collor de Mello, Eduardo Bezerra Frazão, William Dias Gomes e Luciana Guimarães de Leoni Ramos foram rejeitadas pelos ministros da Segunda Turma, com base no voto do relator, por falta de indícios mínimos de autoria dos delitos imputados.
Da mesma forma, foram rejeitadas as imputações ao senador Fernando Collor pelos crimes de peculato e obstrução das investigações (na forma tentada) e a Pedro Paulo pelos crimes de peculato, fraude em licitações e violação de sigilo qualificado.
Continuidade delitiva
Ao final do julgamento, o ministro Gilmar Mendes lembrou que a denúncia apontou cada pagamento como um crime autônomo de corrupção passiva ou lavagem de dinheiro. Contra o senador são apontados 30 crimes de corrupção passiva e 376 de lavagem de dinheiro. Nessa parte, o ministro levantou uma divergência pontual quanto ao voto do relator, por entender que, já no momento do recebimento da denúncia, deveria ser feita a análise da questão pertinente à continuidade delitiva, por entender que, no caso da corrupção passiva, cada contrato investigado deve ser reconhecido como um crime de corrupção passiva, e a continuidade delitiva entre os contratos, se for o caso. E quanto ao delito de lavagem de dinheiro, eventual aumento de pena pela reiteração delitiva deve ser feito, conforme o ministro, com base no artigo 1º, parágrafo 4º, da Lei 9.613/1998. Os demais ministros entenderam, contudo, que essa questão deve ser analisada no julgamento da ação penal.
– Leia a íntegra do voto do relator, ministro Edson Fachin.
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