Nos termos do voto do relator, desembargador federal Hercules Fajoses, a 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a sentença que determinou o pagamento de foro (taxa anual de ocupação) e laudêmio (equivalente a 5% do valor cobrado na venda) de imóvel de propriedade da União, leiloado após a publicação da Emenda Constitucional 46/2005 (EC 46/2005).
No caso do processo, a empresa apelante argumentou que leiloou o imóvel, localizado em ilha costeira, sede do Município de São Luís, capital do Estado do Maranhão, após a vigência da EC 46/2005 e que, portanto, o imóvel não seria de propriedade da União. Sustentou, ainda, que a cobrança de débitos posteriores à alienação do imóvel seria de responsabilidade dos atuais proprietários.
Ao analisar o recurso, o magistrado explicou que o imóvel de que trata o processo, desmembrado do Rio Anil e localizado na ilha que sedia a cidade de São Luís, capital do Maranhão, foi registrado antes da EC 46/2005.
Ou seja, prosseguiu o desembargador federal, havia outro título comprobatório de propriedade da União, o que, na jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), legitima a exigência das taxas, uma vez que “a Emenda Constitucional nº 46/2005 não interferiu na propriedade da União, nos moldes do art. 20, VII, da Constituição da República, sobre os terrenos de marinha e seus acrescidos situados em ilhas costeiras sede de Municípios”.
Destacou o magistrado que a apelante deixou de comunicar à Secretaria de Patrimônio da União (SPU) a transação e que, portanto, permaneceu como responsável pela quitação das taxas de foro e laudêmio.
O recurso ficou assim ementado:
CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. NECESSÁRIA COMUNICAÇÃO PARA A SECRETARIA DE PATRIMÔNIO DA UNIÃO SOBRE TRANSFERÊNCIA DE DIREITO DE IMÓVEL. INTIMAÇÃO ELETRÔNICA DE ADVOGADO. § 3º DO ART. 5º DA LEI Nº 11.419/2006. TAXA DE OCUPAÇÃO. FORO E LAUDÊMIO. IMÓVEL SITUADO EM ILHA COSTEIRA. SEDE DE MUNICÍPIO. DOMÍNIO DA UNIÃO ANTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 46/2005. ENCARGOS DEVIDOS. ORIENTAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, EM REPERCUSSÃO GERAL.
1. O egrégio Superior Tribunal de Justiça reconhece que: “Não havendo comunicação à SPU acerca da transferência de domínio útil e/ou de direitos sobre benfeitorias, bem como da cessão de direitos a eles referentes, permanece como responsável pela quitação da taxa de ocupação aquele que consta originariamente dos registros, no caso, a alienante, e não o adquirente. […]”. (REsp nº 1.969.799/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, DJ de 17/12/2021).
2. No tocante à intimação eletrônica do advogado, a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça reconhece que: “Atente-se para o art. 5º, § 1º, da Lei 11.419/06: Art. 5º As intimações serão feitas por meio eletrônico em portal próprio aos que se cadastrarem na forma do art. 2º desta Lei, dispensando-se a publicação no órgão oficial, inclusive eletrônico. § 1º Considerar-se-á realizada a intimação no dia em que o intimando efetivar a consulta eletrônica ao teor da intimação, certificando-se nos autos a sua realização” (REsp 1.938.915, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, DJ de 15/12/2021).
3. A Constituição Federal estabelece em seu art. 20, VI, que: “São bens da União: […] IV – […] as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II” (trecho introduzido pela EC nº 46 de 05/05/2005).
4. O tema em análise foi apreciado pelo egrégio Supremo Tribunal Federal, em julgamento realizado sob o rito da repercussão geral a que alude o art. 543-B do Código de Processo Civil de 1973 (RG-RE 636.199/ES), reconhecendo que: “[…] A EC nº 46/2005 não alterou o regime patrimonial dos terrenos de marinha, tampouco dos potenciais de energia elétrica, dos recursos minerais, das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e de nenhum outro bem arrolado no art. 20 da CF. […] Ausente fator de discrímen a legitimar a geração de efeitos desuniformes, no tocante ao regramento dos terrenos de marinha e acrescidos, entre municípios insulares e continentais, incide sobre ambos, sem distinção, o art. 20, VII, da Constituição da República. 7. Tese firmada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal: Ao equiparar o regime jurídico-patrimonial das ilhas costeiras em que sediados Municípios àquele incidente sobre a porção continental do território brasileiro, a Emenda Constitucional nº 46/2005 não interferiu na propriedade da União, nos moldes do art. 20, VII, da Constituição da República, sobre os terrenos de marinha e seus acrescidos situados em ilhas costeiras sede de Municípios, incólumes as relações jurídicas daí decorrentes. […] 9. Recurso extraordinário conhecido e não provido” (RE 636.199, Rel. Ministra Rosa Weber, Tribunal Pleno, DJe-170 de 03/08/2017).
5. Dos documentos acostados aos autos, destaca-se que o imóvel caracterizado como “Nacional Interior”, desmembrado da área denominada Rio Anil, foi objeto de aforamento transcrito em registro imobiliário em 13/03/1973, ou seja, em data anterior à vigência da Emenda Constitucional nº 46/2005.
6. Legítima, portanto, a exigência da taxa de ocupação, foro e laudêmio previstos nos arts. 1º e 3º do Decreto-Lei nº 2.398/1987.
7. Conforme já decidiu esta egrégia Corte: “Imóvel localizado em ilha costeira (‘nacional interior’) de que a União tem o ‘domínio pleno’ constituído antes da vigência da EC 46/2005 dispensa ‘demarcação administrativa’. Nada tem a ver com imóvel situado em “terreno de marinha”, não se aplicando assim os correspondentes dispositivos legais nem o precedente do STF na ADI 4.264-PE acerca da nulidade da demarcação administrativa desse terreno” (EDcl na ApelRemNec 0017361.66.2013.4.01.3700, Rel. Desembargador Federal Novély Vilanova da Silva Reis, julgado em 28/04/2021).
8. Apelação não provida.
Com essas considerações, o relator declarou seu voto no sentido de manter a sentença e negar provimento à apelação.
Processo: 1000760-89.2018.4.01.3700