Simples modificação do nome da ação não afasta decadência e prescrição

O uso do nome “ação de sonegados” foi irrelevante para afastar a decadência e a prescrição no caso de uma ação anulatória de escritura pública proposta em 2009 acerca de suposta ilegalidade na doação de um imóvel de pai para filha ocorrida em 1985.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a um recurso que buscava afastar o reconhecimento de decadência e prescrição e possibilitar o prosseguimento da demanda.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora, há uma pretensão deduzida pelas recorrentes – anulação da escritura pública alegadamente lavrada mediante simulação – que é apta a invalidar o negócio jurídico celebrado anteriormente.

Objeto da ação

“A despeito de a redação dada ao pedido não ser suficientemente clara no que se refere à natureza da postulação e ao objeto da ação, verifica-se, a partir da leitura da petição inicial e das causas de pedir aduzidas, que não se trata de uma ação de sonegados, a despeito de ter sido assim nominada pelas recorrentes”, disse a ministra ao explicar que a pretensão autônoma formulada no pedido é a anulação da escritura.

Nancy Andrighi afirmou que a exata delimitação dos pedidos e das suas respectivas causas de pedir é essencial, já que a jurisprudência do STJ se consolidou no sentido de que, para a determinação do prazo prescricional ou decadencial aplicável, deve-se analisar o objeto da ação, sendo irrelevante o nome ou o fundamento legal apontado no pedido.

Prazo perdido

Segundo a relatora, o direito de anular escritura pública lavrada em 1985 sob o fundamento de que o negócio foi simulado se extingue no prazo de quatro anos, de acordo com o Código Civil de 1916.

Ela explicou que, mesmo que fosse aplicado o prazo prescricional de 20 anos previsto no artigo 177 do mesmo código, ainda assim a pretensão estaria prescrita, já que a ação foi proposta apenas em 2009. A ministra destacou que a ciência inequívoca dos fatos ocorreu em 1987, e também utilizando esse marco temporal é preciso reconhecer que se escoou o prazo para invalidar o negócio jurídico alegadamente simulado.

“Em síntese, conclui-se que, aparentemente, buscaram as recorrentes, com a simples modificação do nomen iuris (de ação anulatória de escritura pública para ação de sonegados), tangenciar a decadência e a prescrição, sem, contudo, observar que o objeto litigioso é definido pelo pedido à luz das causas de pedir, sendo absolutamente irrelevante, nesse aspecto, o nome atribuído à ação”, concluiu a relatora.

O recurso ficou assim ementado:

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ANULATÓRIA DE ESCRITURA PÚBLICA NOMINADA COMO AÇÃO DE SONEGADOS. IRRELEVÂNCIA DO NOMEN JURIS. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DA CONTROVÉRSIA A PARTIR DO PEDIDO E DAS CAUSAS DE PEDIR. DIREITO DE ANULAR NEGÓCIO JURÍDICO SIMULADO. PRAZO DECADENCIAL QUADRIENAL, QUE SE INICIA COM A REALIZAÇÃO DO ATO OU CONTRATO. INVABILIDADE DO PLEITO TAMBÉM SOB A ÓTICA DO PRAZO PRESCRICIONAL VINTENÁRIO. APLICAÇÃO DA TEORIA DA ACTIO NATA.
1- Ação distribuída em 21⁄10⁄2009. Recurso especial interposto em 17⁄10⁄2014 e atribuído à Relatora em 25⁄08⁄2016.
2- O propósito recursal consiste em definir, a partir do pedido e das causas de pedir da ação proposta, a natureza jurídica do pedido e o prazo prescricional ou decadencial aplicável à hipótese em que se pretende anular escritura pública de compra e venda e, consequentemente, colacionar ao inventário bem imóvel alegadamente sonegado.
3- Para a adequada delimitação do objeto litigioso, inclusive para o fim de definir a ocorrência ou não de decadência ou prescrição, é imprescindível o exame do pedido e das causas de pedir delineadas na petição inicial, sendo irrelevante o nome atribuído à ação ou o fundamento legal indicado na petição inicial. Precedentes.
4- Hipótese em que se pretende a anulação de escritura pública de compra e venda de imóvel alegadamente lavrada mediante simulação entre vendedor, genitor falecido e herdeira, cujo acolhimento levaria à necessidade lógica de colação do bem ao inventário do de cujus.
5- O direito de anular escritura pública sob o fundamento de que o negócio foi simulado se extingue no prazo decadencial quadrienal previsto no art. 178, §9º, V, “b”, do CC⁄1916. Precedentes.
6- Inviabilidade de acolhimento do pleito autoral também sob a ótica do prazo prescricional vintenário previsto no art. 177 do CC⁄1916, tendo em vista que, de acordo com a teoria da actio nata, a pretensão nascer quando há ciência inequívoca da lesão e de sua extensão, permitindo-se o ajuizamento da ação que, na hipótese, apenas foi proposta mais de 20 (vinte) anos após o termo inicial do prazo prescricional.
7- Recurso especial conhecido e desprovido.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1694417

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