“Conforme firme jurisprudência, o exercício de cargo de confiança, por si só, não torna a testemunha suspeita”. Assim decidiu, por unanimidade, a 10ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT/RJ) ao dar parcial provimento ao recurso do posto de gasolina Fixxoil Comércio de Combustíveis LTDA – EPP. A testemunha da empregadora, ao ser contraditada, foi considerada suspeita pelo juízo de primeiro grau por exercer cargo de confiança na empresa. Acompanhando o voto da relatora Alba Valeria Guedes Fernandes da Silva, o colegiado entendeu que a decisão que determinou a suspeição impediu que a ré realizasse sua prova testemunhal, pelo que foi reconhecido o cerceio de defesa.
Na ação trabalhista, o empregado requereu, dentre outros pedidos, a conversão de sua dispensa por justa causa em dispensa sem justa causa, com o respectivo pagamento das verbas rescisórias devidas. Em sua contestação, a empresa argumentou que o trabalhador incorreu na prática da desídia, pelo que se justificou sua dispensa por justa causa.
Em audiência de instrução realizada no primeiro grau, a testemunha indicada pela empregadora foi contraditada pela parte autora, que alegou sua suspeição por exercer cargo de confiança na empresa. O juízo de primeiro grau decidiu que: “Considerando as informações prestadas pela testemunha, de que exerce cargo gerencial de confiança, reportando-se aos sócios da empresa, reconheço que, de fato, sua posição se confunde com a do próprio empregador em razão do seu poder de mando e gestão e acolho a contradita, sob protestos da reclamada”. O posto de gasolina requereu então que sua testemunha fosse ouvida como informante, o que foi deferido pelo juízo.
A sentença de primeiro grau, proferida pelo juízo da 2ª Vara do Trabalho de Campos dos Goytacazes, converteu a demissão por justa causa aplicada ao autor em dispensa imotivada, condenando a empresa ao pagamento das verbas rescisórias devidas.
Inconformado com a decisão, o posto de gasolina interpôs recurso ordinário. A empresa alegou que o fato de a testemunha indicada exercer o cargo de gerente administrativo não seria suficiente para macular seu depoimento, tampouco para desclassificá-la para informante. Requereu a nulidade da sentença de primeiro grau argumentando o cerceio de defesa, uma vez que sua única testemunha foi ouvida apenas como informante.
No segundo grau, o caso foi analisado pela desembargadora Alba Valeria Guedes Fernandes da Silva. Inicialmente, a relatora observou que, ao converter a justa causa do trabalhador em dispensa imotivada, o juízo de origem julgou em sentido contrário do interesse da empresa, que era quem pretendia produzir a prova testemunhal indeferida. “Nesse contexto, não há dúvida de que a oitiva da testemunha pretendida pela demandada era essencial para dirimir as controvérsias existentes sobre a justa causa”, constatou a relatora.
Ademais, a relatora observou que o motivo do indeferimento da testemunha foi sua suposta suspeição, por ocupar cargo de confiança. “Contudo, tal fato, por si só, não torna a testemunha parcial, não sendo descrito como uma das causas de suspeição ou impedimento”, afirmou a magistrada.
Por fim, apesar de reconhecer o cerceio de defesa, a relatora considerou desnecessária a anulação da sentença, devido à ausência de prejuízo, já que a testemunha foi ouvida na condição de informante. “O depoimento foi realizado, podendo ser aproveitado para o julgamento em 2º grau, bastando que seja valorado da forma adequada, ou seja, como testemunha. Existe, inclusive, a gravação do depoimento, que pode ser vista em 2º grau sem qualquer dano à defesa”, concluiu a relatora.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ORDINÁRIO. CERCEIO DE DEFESA. TESTEMUNHA QUE OCUPA CARGO DE CONFIANÇA. INEXISTÊNCIA DE SUSPEIÇÃO. DEPOIMENTO PRESTADO COMO INFORMANTE QUE PODE SER VALORADO COMO TESTEMUNHAL. NULIDADE NÃO RECONHECIDA. Conforme firme jurisprudência, o exercício de cargo de confiança, por si só, não torna a testemunha suspeita. No entanto, se ela foi ouvida como informante, seu depoimento pode ser aproveitado como testemunhal sem que seja anulada a sentença, considerando a inexistência de prejuízo à defesa com o julgamento do recurso (art. 794 da CLT). JUSTA CAUSA. IMPROBIDADE. A justa causa, sendo a mais severa penalidade aplicada ao empregado, deve ser robustamente comprovada pelo empregador.
Nas decisões proferidas pela Justiça do Trabalho, são admissíveis os recursos enumerados no art. 893 da CLT.
PROCESSO nº 0100546-77.2019.5.01.0282