Não cabe mandado de segurança contra decisão que determina desbloqueio de valores

O mandado de segurança não é o meio adequado para reformar decisão judicial que determinou o desbloqueio de bens, por se tratar de decisão definitiva que, embora não julgue o mérito da ação, coloca fim ao incidente processual.

Esse foi o entendimento da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar extinto mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) e restabelecer decisão que liberou mais de R$ 17 milhões bloqueados judicialmente para garantir o ressarcimento de vítimas do suposto esquema de pirâmide financeira conhecido como Sistema BBom. Segundo o MPSP, os valores seriam produto de crimes contra o sistema financeiro e objeto de lavagem de dinheiro.

Hist​órico

Em 2013, o juízo de primeira instância determinou o sequestro de valores recebidos por terceiros de uma empresa envolvida na investigação da pirâmide financeira. A decisão foi reformada em 2016, sob o fundamento de ser inadmissível que bens de terceiras pessoas sem indícios de autoria permanecessem bloqueados por mais de três anos e sem previsão de solução das investigações e da ação penal.

O MPSP pediu a reconsideração da decisão em fevereiro de 2017, o que foi negado pelo juízo, o qual considerou que não havia denúncia criminal contra os terceiros titulares das contas bloqueadas.

Em novembro de 2017, a pedido do MPSP, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) concedeu mandado de segurança para manter o bloqueio. De acordo com o tribunal, naquela altura, a denúncia – por falsidade ideológica e lavagem de dinheiro – já havia sido feita pelo Ministério Público e recebida pela Justiça.

O TJSP concluiu ainda ser cabível o uso do mandado de segurança a fim de evitar lesão de difícil reparação, pois havia o risco de perda dos valores em razão do desbloqueio.

Os donos das contas bloqueadas recorreram ao STJ, alegando que não se admite a impetração de mandado de segurança contra decisão que determina o desbloqueio de valores constritos judicialmente, ante a ausência de indícios suficientes de autoria, como estabelece a Súmula 267 do Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo o enunciado, não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição.

Recurso própr​​​io

Em seu voto na Sexta Turma, o relator do processo, ministro Nefi Cordeiro, lembrou que, de fato, segundo a jurisprudência do STJ, “o mandado de segurança não pode constituir-se em sucedâneo recursal, sob pena de se desnaturar a sua finalidade”.

O magistrado destacou que, para situações como a do caso em análise, havia recurso próprio previsto na legislação processual, capaz de resguardar a pretensão do Ministério Público, como previsto no artigo 593, II, do Código de Processo Penal.

“Não é admissível a impetração de mandado de segurança contra ato jurisdicional que defere o desbloqueio de bens e valores, por se tratar de decisão definitiva que, apesar de não julgar o mérito da ação, coloca fim ao procedimento incidente”, concluiu o relator.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. DEFERIDO O DESBLOQUEIO DOS BENS PELO JUÍZO SINGULAR. IMPETRAÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA.  INADMISSIBILIDADE. DECISÃO PASSÍVEL DE RECURSO DE APELAÇÃO. ART. 593, II, DO CPP. SÚMULA 267⁄STF. RECURSO PROVIDO. PEDIDO DE SOBRESTAMENTO. INGRESSO COMO TERCEIROS INTERESSADOS. INDEFERIMENTO.

1. Incabível aos peticionantes o ingresso, na qualidade de terceiros interessados, para pleitear o sobrestamento do recurso especial, até o trânsito em julgado de Ação Declaratória de Nulidade do Compromisso Particular de Transferência de Cotas e outras Avenças, considerando-se, ainda, a independência das esferas cível e criminal.

2. Não é admissível a impetração de mandado de segurança contra ato jurisdicional que defere o desbloqueio de bens e valores, por se tratar de decisão definitiva que, apesar de não julgar o mérito da ação, coloca fim ao procedimento incidente.

3. O recurso adequado contra a decisão que julga o pedido de restituição de bens é apelação, sendo incabível a utilização de mandado de segurança como sucedâneo do recurso legalmente previsto.

4. Ausente, ainda, teratologia na decisão que determinou o desbloqueio dos valores, tendo em vista o tempo de constrição perdurar mais de 3 anos, à época do julgamento, sem a propositura de ação penal.

5. Recurso especial provido para restabelecer a decisão que determinou a liberação dos valores bloqueados e indeferido o pedido de sobrestamento do recurso às fls. 744-748.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1787449

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