Em despacho publicado no Diário de Justiça Eletrônico do Supremo Tribunal Federal (STF) desta quinta-feira (1º), o ministro Gilmar Mendes, relator, admitiu o Facebook Serviços Online do Brasil como amicus curiae (amigo da Corte) na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 51, ajuizada pela Federação das Associações das Empresas de Tecnologia da Informação (Assespro Nacional). A ação busca validar dispositivos de cooperação internacional referentes à obtenção de conteúdo de comunicação privada sob controle de provedores de aplicativos de internet sediados no exterior.
Os dispositivos em questão fazem parte do Decreto Federal 3.810/2001, que promulgou o Acordo de Assistência Judiciário-Penal entre os governos brasileiro e norte-americano, além de outros dispositivos legais que tratam das relações jurisdicionais do Brasil com autoridades estrangeiras.
Segundo a associação, o acordo, usado habitualmente nas promoções e requisições de provas e em diligências sobre pessoas, bens e haveres situados fora do Brasil, em investigações criminais e instruções penais em curso no país, enfrenta problemas em sua aplicabilidade quanto às empresas do setor de tecnologia, por efeito de decisões judiciais que se baseiam, principalmente, no fundamento da violação ao princípio da soberania nacional brasileira. Isso porque o que se alega é que a não entrega desses dados no Brasil e de forma direta por pessoa jurídica afiliada à provedora do aplicativo situada em território estrangeiro contrapõe-se à soberania nacional, representando afronta ao Poder Judiciário.
A depender do modelo de negócios, contratos e operações adotados, explica a entidade, os provedores de aplicações de internet podem ter um controlador dos dados (data controller) dos usuários de seus serviços no exterior, sujeito apenas à legislação do país estrangeiro. E, de acordo com a lei norte-americana, prossegue a autora da ADC, os provedores de serviços de comunicações eletrônicas ou de serviço de computação remota não devem disponibilizar o conteúdo de comunicações a autoridades estrangeiras.
A entidade afirma que os tribunais brasileiros requisitam informações à pessoa jurídica afiliada à provedora do aplicativo no Brasil, deixando de aplicar os instrumentos de assistência judiciária internacional, por entenderem não ser o acordo ou o procedimento realizado por meio de carta rogatória a via processual cabível para a obtenção do conteúdo de comunicações privadas sob controle de provedor de aplicação estabelecido fora do território nacional. Para a federação, essa requisição a representantes brasileiros representaria uma “declaração branca de inconstitucionalidade” das normas citadas.
Para evitar o afastamento do uso das normas, a Assespro ajuizou a ação no STF buscando reafirmar a constitucionalidade dos procedimentos de cooperação jurídica internacional e, principalmente, demonstrar como eles conciliam a soberania brasileira e a dos Estados estrangeiros. A entidade aponta que essa questão tem status constitucional, uma vez que, nas relações internacionais do Brasil, está prevista a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade, assim como o da solução pacífica dos conflitos (incisos VII e IX do artigo 4º da Constituição de 1988).
Com esses argumentos, a entidade pede que sejam declarados constitucionais o Decreto Executivo Federal 3.810, de 2 de maio de 2001, que promulgou o Acordo de Assistência Judiciário-Penal entre o governo da República Federativa do Brasil e o governo dos Estados Unidos da América; o artigo 237, inciso II, do Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015); e os artigos 780 e 783 do Código de Processo Penal (Decreto-Lei 3.689/1941). E, como consequência, que se declare a aplicabilidade dos procedimentos de cooperação internacional, previstos nos dispositivos em questão, para a obtenção de conteúdo de comunicação privada sob controle de provedores de aplicativos de internet estabelecidos no exterior.
Despacho
No despacho, o ministro Gilmar Mendes determinou que sejam solicitadas informações ao Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional do Ministério da Justiça (DRCI) e à Presidência da República, a serem prestadas em 10 dias e, na sequência, que se remetam os autos à Advocacia-Geral da União e à Procuradoria-Geral da República, para que apresentem manifestação, sucessivamente, em até cinco dias.
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Processo relacionado: ADC 51