Para a 7ª Turma, houve violação do princípio da boa-fé objetiva
A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu o direito de um eletricitário ao recebimento das diferenças entre o salário prometido antes da contratação e o salário pago após o início das atividades. Segundo o colegiado, a ACV Tecline Engenharia Ltda. e a Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras) descumpriram a promessa de salário feita na fase pré-contratual, violando o princípio da boa-fé objetiva.
Promessa
Na reclamação trabalhista, o empregado disse que havia se candidatado a uma vaga para trabalhar na Usina Termelétrica de Piratininga, em São Paulo (SP) e que, na plataforma de oferta de empregos Catho, constava a remuneração de cerca de R$ 4,2 mil para jornada de turno de seis horas. Após o recrutamento e o processo seletivo, foi contratado para a função. Entretanto, ao receber o primeiro salário, verificou que o valor depositado era de aproximadamente R$ 2, 6 mil.
Após questionamento ao RH da empresa, obteve resposta de que o valor, de fato, havia sido depositado em quantia inferior e que a complementação seria efetuada. Isso, porém, não ocorreu.
A empresa, em sua defesa, sustentou que o salário informado na plataforma de emprego não vinculava o contrato. Segundo a ACV, o valor anunciado compreendia o salário acrescido de adicional de periculosidade, horas extras e adicional noturno, daí a diferença entre os valores.
Salário indiscriminado
O juízo da 11ª Vara do Trabalho de São Paulo condenou a empresa ao pagamento das diferenças, destacando que, conforme comprovação de e-mails juntados ao processo, a Tecline havia admitido o erro no pagamento e se comprometido a quitar as diferenças, mas não cumpriu o prometido. Para o juízo, as alegações de que a diferença diria respeito ao acréscimo de parcelas sobre um salário-base acarretaria um salário indiscriminado, procedimento vedado no ordenamento jurídico trabalhista.
Expectativa de direito
No entanto, a sentença foi reformada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), que entendeu que o informativo de vaga disponível gerou apenas uma expectativa quanto às condições informadas, que poderiam ou não ser concretizadas. Outro ponto considerado foi o de que, na convocação para tratativas de uma possível contratação, não constava o valor da remuneração. Por último, o TRT destacou a ausência de provas de que a pessoa que admitira o erro no pagamento detivesse poder para decidir sobre a remuneração dos empregados.
Princípio da boa-fé
O relator do recurso de revista do eletricista, ministro Cláudio Brandão, observou que, desde as negociações preliminares à celebração dos contratos, deve vigorar o princípio da boa-fé entre contratante e contratado. “O empregador tem o dever de agir com lealdade, lisura, respeito e consideração com o empregado, ainda mais quando cria a expectativa de contratação que pode causar prejuízo de natureza moral e material”, afirmou.
Segundo o relator, na fase pré-contratual, o empregador e o trabalhador devem proceder com zelo e cautela, visando impedir condutas que criem expectativas reais e consistentes em relação a determinada situação que, no futuro, poderá não ocorrer. Para o magistrado, diante dos fatos narrados pelo TRT, fica evidente que a empresa não cumpriu as promessas de salários na fase pré-contratual, violando o princípio da boa-fé objetiva, devendo, assim, arcar com as diferenças salariais.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. LEI Nº 13.467/2017 . RESPONSABILIDADE NA FASE PRÉ-CONTRATUAL. DIFERENÇAS SALARIAIS. PROMESSA DE SALÁRIO. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA RECONHECIDA . Agravo de instrumento provido para determinar o processamento do recurso de revista, em face de haver sido demonstrada possível afronta ao artigo 427 do Código Civil .
RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. LEI Nº 13.467/2017 . RESPONSABILIDADE NA FASE PRÉ-CONTRATUAL. DIFERENÇAS SALARIAIS. PROMESSA DE SALÁRIO. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. TRANSCENDÊNCIA ECONÔMICA RECONHECIDA . Em relação à transcendência econômica, esta Turma estabeleceu como referência, para o recurso do empregado, o valor fixado no artigo 852-A da CLT e, na hipótese dos autos, há elementos a respaldar a conclusão de que os pedidos rejeitados e devolvidos à apreciação desta Corte ultrapassaram o valor de 40 salários mínimos. Discute-se nos autos a responsabilidade do empregador pelas promessas feitas na fase pré-contratual. Desde as negociações preliminares que antecedem a celebração dos contratos vigora o Princípio da boa-fé no dever de conduta dos sujeitos, conforme dispõe o artigo 422 do Código Civil. A inobservância dos referidos deveres pelo contratante viola a cláusula geral de boa-fé objetiva, adotada no Código Civil (art. 113), que estabelece o dever geral imposto a todos de se comportarem segundo padrões de probidade e de lealdade. Na hipótese , o Tribunal Regional anotou que ” (…) as informações constantes no e-mail indicado pelo reclamante, correspondentes a simples informativo de vaga que se encontrava disponível, onde se encontravam descritos os detalhes relativos ao salário, benefícios, horário e local de trabalho, gera apenas mera expectativa quanto as condições lá informadas, que podem ou não se concretizar, por ocasião da formalização da contratação. “. Registrou ainda a presença de um e-mail enviado ao autor , por preposto da empresa , em que ele afirma que o pagamento havia sido feito de forma errada. Ressaltou que referido documento não altera a conclusão adotada ao caso, por não haver prova de que o preposto tinha poderes para decidir acerca da remuneração. Assim, a partir das premissas fáticas registradas no acórdão, evidencia-se promessa de salário na fase pré-contratual e que, quando da contratação, o empregador não a cumpriu, violando o Princípio da boa-fé objetiva, razão pela qual deve arcar com as diferenças salariais correspondentes. Recurso de revista conhecido e provido .
A decisão foi unânime.
Processo: RR-1001964-40.2017.5.02.0711