Declaração de pobreza de mecânico é aceita para concessão de justiça gratuita

Por maioria, a 5ª Turma entendeu que a simples declaração é válida como prova

A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu o direito de um mecânico da Mistral Construção e Engenharia Ltda., de São Paulo (SP), à assistência judiciária gratuita em ação contra a empresa. Por maioria, os ministros entenderam que a declaração de pobreza firmada pelo empregado é prova suficiente para demonstrar a sua insuficiência de recursos.

Justiça gratuita

O caso diz respeito à aplicação das alterações trazidas pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) ao artigo 790, parágrafos 3º e 4º, da CLT, passando a estabelecer que o benefício da justiça gratuita será concedido a quem receber salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social ou que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo. O ponto central da discussão, na Turma, foi a maneira de comprovação da chamada hipossuficiência, em que o empregado não tem condições de arcar com as despesas processuais e os honorários advocatícios sem comprometer a sua subsistência e a de sua família.

Insuficiência

Na reclamação trabalhista, em que pedia o pagamento de diversas parcelas e indenização por fraude contratual, o mecânico afirmou que se encontrava nessa condição e apresentou uma declaração de que era pessoa pobre no sentido jurídico do termo.

O juízo de primeiro grau rejeitou o pedido, por entender que o empregado havia admitido que estava trabalhando e recebia valor superior ao teto da Previdência Social. Esse ponto da sentença foi mantido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP). Segundo o TRT, como a ação fora ajuizada na vigência da Reforma Trabalhista, o mecânico deveria comprovar a insuficiência de recursos. “O empregado não trouxe qualquer documento a fim de comprovar a sua situação de pobreza”, diz a decisão.

Leitura conjunta

No julgamento do recurso de revista do mecânico, prevaleceu o voto do ministro Alberto Balazeiro, para quem a questão requer uma leitura conjunta da nova redação do artigo 790, parágrafo 3º, da CLT, e os artigos 5º, LXXIV, da Constituição Federal, que, entre as garantias constitucionais, assegura o dever do Estado de prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. A matéria inclui, ainda, o artigo 99, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil (CPC), que, ao dispor sobre o pedido de gratuidade da justiça, presume verdadeira a alegação de insuficiência apresentada exclusivamente por pessoa natural.

“A partir da interpretação sistemática desses preceitos, não é possível exigir dos trabalhadores que buscam seus direitos na Justiça do Trabalho – na sua maioria, desempregados – a comprovação de estarem sem recursos para o pagamento das custas do processo”, afirmou. “Deve-se presumir verdadeira a declaração de pobreza firmada pelo autor ou feita por seu advogado.

O ministro lembrou, ainda, que, de acordo com a jurisprudência atual e majoritária do TST (Súmula 463), basta a declaração de hipossuficiência econômica para a comprovação do estado de miserabilidade, “mesmo após a vigência da Lei 13.467/2017”.

No mesmo sentido, o ministro Douglas Alencar assinalou que a Reforma Trabalhista, ao exigir a comprovação da falta de condições econômicas, não alterou essa sistemática, “pois não delimitou meio específico de prova ou afastou a declaração pessoal para aquela finalidade”.

Comprovação

O relator, ministro Breno Medeiros, ficou vencido, ao entender que a Reforma Trabalhista passou a exigir não apenas a mera declaração ou afirmação da parte, mas a efetiva comprovação da situação de insuficiência de recursos.

O recurso ficou assim ementado:

AGRAVO. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. PESSOA FÍSICA. COMPROVAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS POR SIMPLES DECLARAÇÃO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA.

Cinge-se a controvérsia a definir se a simples declaração de hipossuficiência econômica é suficiente para a comprovação do estado de pobreza do reclamante, para fins de deferimento dos benefícios da justiça gratuita, em ação ajuizada após a vigência da Lei n° 13.467/2017. Segundo o artigo 790, §§ 3º e 4º, da CLT, com as alterações impostas pela Lei nº 13.467/2017, o benefício da gratuidade da Justiça será concedido àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, ou àqueles que comprovarem insuficiência de recursos. Já o artigo 5º, LXXIV, da Constituição Federal consagra o dever do Estado de prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos e o artigo 99, § 3º, do CPC, de aplicação supletiva ao processo do trabalho, consoante autorização expressa no artigo 15 do mesmo Diploma, dispõe presumir-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida por pessoa natural. A partir da interpretação sistemática desses preceitos, não é possível exigir dos trabalhadores que buscam seus direitos na Justiça do Trabalho – na sua maioria, desempregados – a comprovação de estarem sem recursos para o pagamento das custas do processo. Deve-se presumir verdadeira a declaração de pobreza firmada pelo autor ou feita por seu advogado, com poderes específicos para tanto.

Agravo Interno e Recurso de Revista conhecidos e providos .

Processo: Ag-RRAg-1001410-91.2018.5.02.0090

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