Um médico de Florianópolis foi condenado ao pagamento de R$ 100 mil em favor dos pais de um menino de nove anos que morreu após se submeter a uma cirurgia para retirada de amígdalas. Ele também terá de bancar uma pensão até o 65º aniversário de nascimento da vítima.
De acordo com os autos, a criança realizou o procedimento em um hospital particular da Capital e recebeu alta na mesma data, mas sofreu complicações no período pós-operatório, com ocorrência de hemorragia, e falecer alguns dias depois. Autores da ação, os pais do menino apontaram que houve negligência por parte do médico e da unidade de saúde.
Eles narram que o menino apresentou sangramento nos sete dias seguintes à operação, até que foi levado para outro hospital porque o médico responsável pelo procedimento estava em viagem. No dia seguinte, conseguiram consulta com o profissional, que realizou duas cauterizações e liberou o paciente, mas sem cessar o sangramento.
Os pais também apontam que as condições clínicas do filho tiveram agravamento na mesma noite, por isso voltaram a procurar o médico por telefone. Segundo informaram no processo, a orientação recebida foi de que não seria necessário voltar ao hospital, apenas suspender a administração de comida ou bebida e continuar com os procedimentos de gargarejos.
Ainda assim, o menino foi levado até o Hospital Regional de São José, onde morreu por edema/congestão pulmonares e broncoaspiração dois dias mais tarde. Em manifestação de defesa, o médico da criança sustentou que não houve indício de negligência, imprudência ou imperícia médica e que o procedimento cirúrgico a que foi submetido o paciente não estava livre de riscos, os quais foram esclarecidos no pré-operatório. Também manifestou que a causa da morte não foi claramente evidenciada, que tomou todas as medidas necessárias e que ocorreu uma lamentável fatalidade.
Em sentença prolatada em 2013, o médico foi condenado ao pagamento de pensão e indenização aos pais do menino. A sentença, no entanto, foi anulada pelo Tribunal de Justiça com a determinação para que fosse realizada prova pericial. Após isso, com o retorno dos autos à 2ª Vara Cível da Capital, a ação foi julgada novamente pelo juiz Cláudio Eduardo Regis de Figueiredo e Silva. Na sentença, o magistrado conclui que a conduta médica apresentou deficiências em razão da falta de cautela no enfrentamento das contingências do pós-operatório.
\”Observa-se dos autos que, nada obstante a baixa complexidade do procedimento cirúrgico em questão, o agravamento das condições clínicas do filho dos autores no pós-operatório, inclusive com a ocorrência de hemorragia, não foi adequadamente diagnosticado e tratado, com a diligência que se fazia premente, tanto que o quadro clínico do paciente evoluiu para edema e congestão pulmonares, bem como bronco aspiração, apontadas como causa da morte pelo exame necroscópico\”, apontou.
O juiz ainda manifestou que a tese sustentada na defesa, quanto à possibilidade de o paciente ter dado causa às complicações, seja em razão da não observância das prescrições médicas e cuidados com alimentação, não se sobrepõe ao dever de cautela que cumpria ao médico, no sentido de averiguar as reais condições clínicas da criança.
Já o hospital onde ocorreu a operação de retirada das amígdalas restou isento de responsabilidade. Conforme observado na decisão, o médico não era empregado do estabelecimento e apenas utilizou suas dependências para a realização do procedimento. Também é destacado que as complicações do quadro clínico do paciente aconteceram no pós-operatório, bem como os atendimentos que sucederam as complicações ocorreram em outras unidades de saúde.
Assim, o médico foi condenado ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 1.188,00, decorrente de gastos com funeral e sepultamento, e indenização a título de danos morais no valor de R$ 100 mil. Ele também terá de pagar pensão aos pais: 2/3 do salário mínimo até a data em que o menino completaria 25 anos de idade e, a partir daí e até o limite dos 65 anos da vítima, 1/3 do mesmo indexador. O caso ocorreu em 2010. Cabe recurso ao Tribunal de Justiça
Ocorreu recurso e o mesmo ficou assim ementado:
ERRO MÉDICO – AMIGDALECTOMIA – SANGRAMENTO PÓS-CIRÚRGICO OCORRIDO REPETIDO QUE OCORREU DIAS APÓS A CIRURGIA – MORTE DO PACIENTE QUE SE ENCONTRAVA EM CASA, ANTES DE CHEGAR AO HOSPITAL – ALEGAÇÃO DE NEGLIGÊNCIA DO MÉDICO EM DAR A ATENÇÃO DEVIDA À GRAVIDADE DO CASO – PERÍCIA QUE ISENTA O MÉDICO DE RESPONSABILIDADE – SENTENÇA, TODAVIA, DE PROCEDÊNCIA, QUE RECONHECE A CULPA DO CIRURGIÃO E FIXA INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA – RECURSO DAS PARTES.
ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE CULPA E DE QUE O SANGRAMENTO É COMPLICAÇÃO CIRÚRGICA E QUE TODAS AS MEDIDAS ADEQUADAS FORAM TOMADAS PELO MÉDICO – REJEIÇÃO DOS ARGUMENTOS DO RÉU – GRAVIDADE DO SANGRAMENTO EM AMIGDALECTOMIA RECONHECIDA PELA LITERATURA MÉDICA – DOIS ÚNICOS EVENTOS TESTEMUNHADOS PELO CIRURGIÃO AO LONGO DE 27 ANOS DE PROFISSÃO QUE OCORRERAM NO PÓS-CIRÚRGICO, EM AMBIENTE HOSPITALAR – PACIENTE INFANTE QUE APRESENTOU SANGRAMENTO REPETIDOS DIAS APÓS A CIRURGIA E QUE, APESAR DE ATENDIDO PELO CIRURGIÃO, NÃO FOI MANTIDO EM AMBIENTE MONITORADO, COM SIMPLES RECOMENDAÇÃO DE QUE FOSSE LEVADO A UMA EMERGÊNCIA EM CASO DE RECIDIVA – SANGRAMENTO OCORRIDO À NOITE – LIGAÇÃO EFETUADA AO MÉDICO COM AQUELA RECOMENDAÇÃO – SANGRAMENTO QUE SE REPETIU – A CRIANÇA, LEVADA AO HOSPITAL COM URGÊNCIA, LÁ CHEGOU MORTA POR BRONCOASPIRAÇÃO – PERÍCIA JUDICIAL QUE NÃO VINCULA O MAGISTRADO – SUBVALORIZAÇÃO DO RISCO DE UM EVENTO FATAL POR PARTE DO MÉDICO – OBRIGAÇÃO DE MANTER A CRIANÇA EM AMBIENTE MONITORADO PARA O CASO DE EMERGÊNCIA – PAIS DA CRIANÇA QUE SE MOSTRARAM DILIGENTES E RESPONSÁVEIS DURANTE TODO O PROCESSO – CULPA DO MÉDICO NA MODALIDADE DE NEGLIGÊNCIA RECONHECIDA.
DANO MORAL – VALOR ARBRITADO NA ORIGEM QUE SE MOSTRA ADEQUADO AO CASO EM TELA – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
PENSÃO MENSAL – ALTERAÇÃO DO DIES AD QUEM DA SUA FLUÊNCIA – ACOLHIMENTO DO RECURSO DO RÉU NESTE PARTICULAR.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS – MAJORAÇÃO DEVIDA – RECURSO DOS AUTORES PROVIDO NO PONTO.
RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS.
Autos n. 0005231-64.2010.8.24.0082