Mantida decisão que não reconheceu dano moral em cobrança de cirurgia não custeada pelo plano de saúde

O pagamento de cirurgia não coberta pelo plano de saúde, cobrada do paciente por hospital privado mediante cheque caução, mesmo em situações de emergência, não configura, por si só, dano moral passível de indenização.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso de mãe e filho que entraram com pedido de indenização depois de terem de pagar por um procedimento médico não coberto pelo plano de saúde.

Acometida de um mal súbito, a idosa necessitava de cirurgia cardíaca emergencial, e a família foi informada pelo hospital de que o plano não cobriria o procedimento. O filho da paciente assinou quatro cheques como caução, e o procedimento foi realizado.

Na ação judicial, mãe e filho alegaram que a exigência de caução no momento de desespero familiar prévio à cirurgia foi uma prática repudiável, que lhes causou abalos psíquicos e físicos.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial no STJ, a exigência de cheque caução para o pagamento de despesas hospitalares não cobertas pelo plano de saúde não caracteriza dano moral presumido (que dispensa a demonstração de dano efetivo).

Ela afirmou que a análise das razões recursais e das razões de decidir do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) – que negou a pretensão dos recorrentes – não revela motivos suficientes para a reforma do acórdão.

“O pagamento por cheque caução como alternativa para a família ver concretizado o atendimento médico-hospitalar não ganhou contornos de uma aguda aflição capaz de agravar o quadro clínico da paciente, nem mesmo de embaraçar, por conduta maliciosa, o pagamento de quantia extorsiva”, declarou a relatora.

Atividade legítima

De acordo com a ministra, é preciso observar casuisticamente se houve abuso de direito na ação do hospital, “seja pela cobrança de valores extorsivos, seja pelo constrangimento ilegal de pacientes e familiares quanto a tratamentos inadequados ou inúteis”.

No caso, a relatora destacou que, segundo as informações do TJPR, o filho entregou o cheque caução por opção própria após saber que o plano de saúde não iria custear o procedimento.

“É interessante pontuar que houve assinatura de termo de responsabilidade hospitalar em que restou declarada a plena ciência da internação da paciente, com diagnóstico de infarto, e assumida a responsabilidade de pagar todas as despesas oriundas do internamento e tratamento, na hipótese de não cobertura por parte do convênio indicado, a serem realizadas a título particular” – explicou a ministra.

Nancy Andrighi lembrou que, se por um lado aqueles que buscam socorro hospitalar estão cercados de dúvidas e temores pela própria saúde, é fato que os hospitais privados fornecem atendimento ao mercado de consumo geral, inclusive de emergência, mediante o pagamento pelos serviços.

A ministra ressaltou que a cobrança pelo serviço prestado foi decorrente da legítima atividade médico-hospitalar prestada em favor dos consumidores. Dessa forma, segundo a relatora, não houve conduta ilícita do hospital que tenha produzido dano moral passível de ser indenizado.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. SAÚDE SUPLEMENTAR. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. INADMISSIBILIDADE. ATENDIMENTO DE EMERGÊNCIA. CIRURGIA NÃO COBERTA POR PLANO DE SAÚDE. PAGAMENTO POR CHEQUE CAUÇÃO. DANOS MORAIS. INEXISTÊNCIA DE QUALQUER CONSTRANGIMENTO ILEGAL OU COBRANÇA EXTORSIVA PELO HOSPITAL. AVALIAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS CONCRETAS DA RELAÇÃO PACIENTE-HOSPITAL. NECESSIDADE.
1. Ação ajuizada em 1º⁄08⁄16. Recurso especial interposto em 21⁄03⁄18 e concluso ao gabinete em 22⁄10⁄18.
2. Ação de compensação por danos morais ajuizada tendo como causa a abusividade da exigência de cheque caução para realização de procedimento cirúrgico de emergência.
3. O propósito recursal consiste em definir se o pagamento por cirurgia não coberta pelo plano de saúde e cobrado do paciente pelo hospital antes da sua realização em regime de emergência, por si só, configura dano moral presumido.
4. Por um lado, é certo que aqueles que buscam socorro hospitalar estão cercados de dúvidas e temores pela própria saúde, muitas vezes fragilizados pelo desconforto anímico que os moveu até a casa de saúde. Por outro lado, não se pode olvidar que os hospitais privados fornecem atendimento de urgência e emergência ao mercado de consumo em geral mediante pagamento pelos serviços efetivamente prestados.
5. É preciso observar casuisticamente se houve abuso de direito na ação do hospital, seja pela cobrança de valores extorsivos, seja pelo constrangimento ilegal de pacientes e familiares quanto a tratamentos inadequados ou inúteis; sem descurar do interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso (art. 51, §1º, III, do CDC).
6. Na hipótese, a paciente foi acolhida pelo serviço de emergência hospitalar, o diagnóstico médico fornecido, indicado o tratamento correspondente, solicitada a cobertura pelo plano de saúde, assinado termo de responsabilidade hospitalar, disponibilizada ao consumidor a opção de pagamento particular pela cirurgia excluída pelo convênio, realizado o pagamento por meio de cheque caução e efetivamente prestado o serviço de atenção à saúde. Não configurado dano moral no particular.
7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1771308

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