A empresa não justificou a suspensão do pagamento.
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalhou deferiu a incorporação de gratificação de função a um empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) que exerceu cargos de confiança por nove anos e cinco meses. Segundo a Turma, o recebimento de gratificações por todo esse período sedimentou uma condição financeira diferenciada que não poderia ser modificada sem justo motivo.
Estabilidade financeira
Na reclamação trabalhista, o empregado, admitido em 1984 como assistente administrativo em Brasília, afirmou que, entre dezembro de 2002 e agosto de 2014, exerceu várias funções de confiança (coordenador técnico, analista, coordenador de CAD e apoio técnico). A retirada da gratificação, segundo ele, abalou sua estabilidade financeira.
Mudança
Em sua defesa, a ECT afirmou que em seu Manual de Pessoal, implantado em maio de 2012, foram extintas diversas gratificações e instituídas duas parcelas, visando à compensação dos empregados dispensados das funções depois de cinco a dez anos de exercício, de forma a não prejudicar a sua saúde financeira. O assistente, conforme a empresa, se enquadrava nessa situação e, a partir de então, passou a receber a parcela compensatória temporária.
Parcelas distintas
Para o juízo da 22ª Vara do Trabalho de Brasília, no entanto, a chamada Gratificação Provisória por Tempo de Função, recebida pelo assistente entre 2012 e 2013, não se confunde com gratificação de função, que visa remunerar o empregado que assumeas atribuições mais complexas e de maior responsabilidade no exercício de cargo de confiança. Por isso, não poderia integrar o cômputo para o cálculo da média das funções exercidas, nem ser incorporada definitivamente ao salário.
O Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO) confirmou a sentença. Segundo o TRT, apesar da diferença de apenas sete meses, a incorporação da gratificação, de acordo com a Súmula 372 do TST, só é devida quando a parcela tiver sido recebida por dez anos ou mais.
Justo motivo
Para o relator do recurso de revista do assistente, ministro Agra Belmonte, houve má aplicação da Súmula 372. “Considerando o período ínfimo entre a destituição da função e a data em que a incorporação seria devida, e tendo em vista o direito à estabilidade financeira e o princípio da razoabilidade, a decisão do TRT contraria a jurisprudência do TST”, assinalou.
No entendimento do ministro, a ECT deveria ter comprovado um justo motivo para retirar a gratificação, o que não foi feito. “Presume-se, assim, a atitude obstativa da empregadora, diante dos poucos meses restantes para a sua incorporação”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSO ANTERIOR À LEI Nº 13.467/2017.
I – AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO DO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. Ante a imprescindível necessidade de se imprimir celeridade ao processo, sem nenhum prejuízo ao direito das partes litigantes, e considerando a possibilidade de, no mérito, ser provido o recurso, julgo PREJUDICADO o exame da preliminar, nos termos do art. 282, § 2º, do CPC.
GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. EXERCÍCIO POR QUASE DEZ ANOS. ESTABILIDADE FINANCEIRA. SUPRESSÃO. IMPOSSIBILIDADE. Diante de possível má-aplicação da Súmula nº 372 do TST, dá-se provimento ao agravo de instrumento para melhor exame do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido.
II – RECURSO DE REVISTA. GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. EXERCÍCIO POR QUASE DEZ ANOS. ESTABILIDADE FINANCEIRA. SUPRESSÃO. IMPOSSIBILIDADE. O eg. Tribunal Regional manteve a r. sentença de origem que indeferira a incorporação da gratificação de função ao salário do reclamante, em observação ao disposto na Súmula 372 do TST, tendo em vista que este a recebeu por nove anos e cinco meses. Considerando o contexto fático delineado pelo acórdão regional, o reclamante recebeu gratificação por mais de nove anos. Tal situação sedimentou uma condição financeira diferenciada, que foi constituída ao longo desses anos e não pode a reclamada, ao seu livre arbítrio, sem comprovar justo motivo para tanto, simplesmente suprimi-la. Percebe-se que não restou comprovado o justo motivo para a supressão da função gratificada recebida pelo reclamante, ônus que cabia à reclamada. Assim sendo, nos termos do artigo 129 do CCB, presume-se a atitude obstativa da empregadora, diante dos poucos meses restantes para a sua incorporação e do entendimento consagrado pela Súmula 372 desta Corte e por isso não devemos nos ater à simples análise da existência ou não da percepção da gratificação por dez anos, devendo ser mantida a sua incorporação ao salário do reclamante. Precedentes. Recurso de revista conhecido por má-aplicação da Súmula nº 372 do TST e provido.
A decisão foi unânime.
Processo: RR-2505-06.2014.5.10.0022