Um pedido de vista antecipado do ministro Raul Araújo suspendeu, na Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o julgamento do recurso especial que vai determinar se há possibilidade de símbolos políticos serem registrados como marca pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).
O relator do processo, ministro Marco Buzzi, entendeu que não há impedimento na Lei da Propriedade Industrial (Lei 9.279/1996) para que a autarquia reconheça tais emblemas como propriedade dos partidos.
Buzzi analisou ainda, entre outras questões, a possibilidade de agremiações políticas explorarem economicamente o uso de marca em produtos ou serviços, embora não exerçam precipuamente atividade empresarial.
Aguardam o voto-vista do ministro Raul Araújo os ministros Luis Felipe Salomão, Maria Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira.
Árvore estilizada
O recurso teve origem em ação ajuizada pelo Partido Federalista contra o Democratas (DEM), antigo Partido da Frente Liberal (PFL), com o objetivo de impedir que este continue a utilizar símbolo adotado na campanha de 2008. Segundo o Partido Federalista, o símbolo em questão imita marca de sua propriedade.
O Federalista alegou que, após a transformação do PFL em DEM, o partido modificou seu emblema, que passou a ser uma árvore estilizada, formada por caule simples, sem galhos e com copa feita de três círculos irregulares, alinhados triangularmente.
De acordo com o Federalista, a confusão entre o novo emblema utilizado pelo DEM e o seu – uma árvore estilizada com a mesma forma básica, que na versão colorida tem o caule vermelho escuro e os círculos da copa azul, amarelo e verde – é notória, com constantes publicações equivocadas na mídia impressa e digital. O partido informou que em 2005 já havia solicitado o registro do símbolo como marca.
A ação foi julgada improcedente nas instâncias ordinárias.
Personalidade
Em seu voto, o ministro Marco Buzzi destacou que a discussão é afeta ao direito marcário, regulado pela Lei 9.279/1996, o que reserva a competência para julgar o tema ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Buzzi ressaltou que o Partido Federalista, apesar de ter tido seu requerimento de registro negado no TSE por duas vezes, possui personalidade como pessoa jurídica de direito privado, pois efetuou o registro de sua ata de constituição e de seu estatuto social em cartório, obtendo, assim, o registro de sua marca mista, composta por um desenho e nome, em 10 de maio de 2011.
“Não possui, portanto, apenas personalidade eleitoral, porquanto lhe faltou a implementação de seu registro na Justiça Eleitoral”, afirmou o ministro.
Ao falar sobre eventual perda de objeto da ação pelo fato de o Democratas ter, no curso do processo, em 2018, modificado seu emblema oficial, Buzzi salientou o efeito declaratório do reconhecimento do uso indevido de marca. Lembrou que houve também um pedido expresso de inutilização de todo material ainda existente com o símbolo anterior do Democratas.
“As pretensões manifestadas na petição inicial da ação de conhecimento, inobstante a mudança do símbolo do réu ocorrida apenas no ano de 2018, permanecem hígidas”, disse.
O relator observou que a proteção da marca retroage à data do depósito e que, nos autos, é possível constatar que o Partido Federalista, apesar de só ter reconhecida a exclusividade de marca pelo INPI em maio de 2011, requereu o registro de seu sinal distintivo em 15 de dezembro de 2005. Houve, desse modo, segundo Marco Buzzi, um grande período de uso do símbolo pelo Democratas durante a vigência da proteção da marca do Federalista.
Exploração econômica
O ministro afirmou que não há razão para proibir os partidos de terem seus símbolos registrados como marca, visto que a Lei 9.279/1996 não impõe essa vedação.
“O Poder Judiciário não pode dar interpretação extensiva proibitiva sobre aquilo que não está contido no texto legal e que não corresponde à vontade literal do legislador, sobretudo, para justificar a retirada de um direito ou o tolhimento de uma pretensão, como ocorreu na presente hipótese.”
Buzzi disse também que o símbolo partidário, regulamentado pelo artigo 7º, parágrafo 3º, da Lei 9.096/1995, assegura, após registro no TSE, proteção no âmbito eleitoral com “a finalidade única de evitar a confusão de siglas partidárias perante os eleitores durante o processo democrático de votação”, inexistindo qualquer restrição em relação aos atos submetidos à regulação da lei civil.
Já a marca, segundo ele, regulamentada pelos artigos 122 e 123 da Lei 9.279/1996, identifica e distingue produtos e serviços, não havendo nesse diploma legal qualquer restrição de sua exploração econômica por pessoa jurídica de direito privado que não exerça propriamente atividade empresária.
“Vedar a criativa e lícita exploração financeira do símbolo político enquanto marca é sufocar indevida e injustificadamente o já restrito aporte material do financiamento eleitoral privado, contribuindo para a majoração do gasto público com o fundo partidário já bilionário”, avaliou.
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