O ministro Luís Roberto Barroso, relator, ressaltou na decisão que, de acordo com a Constituição, cabe à União dispor sobre as diretrizes e bases da educação nacional e estabelecer normas gerais sobre a matéria.
O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, concedeu liminar para suspender parte de dispositivo de lei do Município de Palmas (TO) que proíbe o ensino sobre gênero e sexualidade na rede pública municipal. Segundo o ministro, a supressão de um domínio do saber do universo escolar desrespeita o direito à educação “com o alcance pleno e emancipatório que lhe confere a Constituição”.
A decisão foi tomada na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 465, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra parte do artigo 1º da Lei Municipal 2.243/2016, que versa sobre o plano municipal de educação. O trecho impugnado veda “a discussão e a utilização de material didático e paradidático sobre a ideologia ou teoria de gênero, inclusive promoção e condutas, permissão de atos e comportamentos que induzam à referida temática, bem como os assuntos ligados à sexualidade e erotização”.
Alicerces
Na decisão, o ministro explicou que, de acordo com a Constituição, cabe à União dispor sobre as diretrizes e bases da educação nacional e estabelecer normas gerais sobre a matéria, a serem complementadas pelos estados. Aos municípios, cabe suplementar as normas federais e estaduais.
Segundo Barroso, as bases do ensino dizem respeito aos alicerces que servem de apoio à educação. “Ocorre que a Constituição estabelece expressamente como diretrizes para a organização da educação a promoção do pleno desenvolvimento da pessoa, do desenvolvimento humanístico do país, do pluralismo de ideias, bem como da liberdade de ensinar e de aprender”, afirmou.
Na avaliação do relator, a norma que veda a adoção de política educacional que trate de gênero ou de sexualidade “e proíbe até mesmo que se utilizem tais termos” suprime campo do saber das salas de aula e do horizonte informacional de crianças e jovens, “interferindo sobre as diretrizes que, segundo a própria Constituição, devem orientar as ações em matéria de educação”. O ministro lembrou ainda que a lei local conflita com a Lei 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases de Educação), editada pela União, “que prevê o respeito à liberdade, o apreço à tolerância e a vinculação entre educação e práticas sociais como princípios que devem orientar as ações educacionais”.
Educação emancipadora
Outro ponto destacado pelo ministro foi que a educação assegurada pela Constituição tem natureza emancipadora, e não se deve recusar aos alunos acesso a temas com os quais inevitavelmente travarão contato na vida em sociedade. “A educação tem o propósito de prepará-los para ela”, ressaltou.
Para o ministro, há uma relação de causa e efeito entre a exposição dos alunos aos mais diversos conteúdos e a aptidão da educação para promover o seu pleno desenvolvimento. “Quanto maior é o contato do aluno com visões de mundo diferentes, mais amplo tende a ser o universo de ideias a partir do qual pode desenvolver uma visão crítica, e mais confortável tende a ser o trânsito em ambientes diferentes dos seus”, observou.
Com esses e outros fundamentos, o relator considerou presente a plausibilidade da inconstitucionalidade formal e material do dispositivo questionado. O perigo na demora, segundo requisito para a concessão da liminar, também é, na avaliação do ministro, igualmente inequívoco. “A norma compromete o acesso imediato de crianças, adolescentes e jovens a conteúdos relevantes, pertinentes à sua vida íntima e social, em desrespeito à doutrina da proteção integral”, concluiu.
ADI
A liminar concedida determina ainda a suspensão do trâmite de ação direta de inconstitucionalidade proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil contra a mesma lei no Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins. A jurisprudência do STF, destacou Barroso, determina a adoção dessa providência quando a ação na corte estadual tramita paralelamente com ADI no STF, tendo por objeto a mesma lei estadual.
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