A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu início ao julgamento de recurso repetitivo em que se decidirá se é lícito o corte administrativo do serviço de energia elétrica por falta de pagamento de dívidas antigas. A seção decidirá, ainda, qual o período em que as concessionárias de energia poderão fazer cobranças administrativamente, com possibilidade de suspensão do fornecimento.
Atualmente, a jurisprudência do tribunal admite o corte de energia quando há atraso de contas recentes.
O relator, ministro Herman Benjamin, propôs uma leve alteração na jurisprudência a fim de permitir o corte decorrente de cobrança regular de consumo com limitação temporal. Após ponderação dos demais ministros, pediu vista regimental para rever a redação da tese.
No caso em julgamento, o Tribunal de Justiça gaúcho declarou a ilegalidade do corte de energia por se basear em débitos não atuais, decorrentes de recuperação de consumo em razão de fraude no relógio, referente ao período retroativo de cinco anos (dezembro de 2000 a dezembro de 2015). “A questão é exatamente essa. É lícito cobrar? Sim, desde que em juízo. Para efetuar o corte administrativo é preciso impor limitação temporal”, afirmou o relator.
Evolução jurisprudencial
Ao abordar a evolução histórica das decisões da corte, o relator lembrou que a jurisprudência de 1990 aos anos 2000 não admitia, sob nenhuma hipótese, o corte administrativo no serviço de energia, por extrapolar os limites da legalidade. As concessionárias de energia eram proibidas de interromper o fornecimento com o fim de compelir o consumidor a pagar tarifas em atraso.
Tal orientação mudou após os anos 2000, e o STJ passou a permitir o corte, mas foi definindo, caso a caso, aspectos que limitariam as suspensões. Como exemplo, o relator citou as definições quanto à necessidade de aviso prévio ao consumidor e a possibilidade de suspensão do serviço em caso de furto comprovado de energia.
“Agora não discutimos mais a possibilidade ou não do corte administrativo, pois esse já é aceito pelo STJ em vários precedentes. O que se busca é definir um limite pretérito para o corte de energia para a cobrança administrativa, para que não haja quebra do devido processo legal”, explicou o ministro, deixando claro que o debate não envolve a cobrança de dívidas em juízo.
Consumidor
Herman Benjamin fez veemente crítica à ausência de qualquer entidade representativa dos consumidores entre os amici curiae e procuradores que fizeram sustentação oral na sessão. “Hoje somos 210 milhões de brasileiros e aqui só tivemos a voz do setor produtivo e do poder público, representando exclusivamente o equilíbrio econômico-financeiro. Até a Aneel só falou disso”, criticou o ministro.
“Onde está o poder público para representar os interesses dos destinatários finais do serviço? Onde está a União? Onde estão os estados e a sociedade civil organizada para falar em nome do consumidor em um caso de imenso interesse e de repercussão absolutamente nacional?”, questionou.
O julgamento deverá ser retomado na próxima sessão, prevista para 14 de dezembro.