Corte Especial pode rever posicionamento da Terceira Seção do STJ, que vem concedendo habeas corpus com base no decreto presidencial questionado
Com o objetivo de pacificar as decisões que tratam da aplicação do Decreto Presidencial 11.302/2022 (indulto natalino), enquanto a constitucionalidade da norma não é examinada em definitivo pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o Ministério Público Federal (MPF), em recurso subscrito pelo subprocurador-geral da República Augusto Aras, requer que a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) analise a validade de dispositivos do decreto. A medida está amparada pela Súmula Vinculante 10 do STF, que determina a necessidade de análise do Plenário dos Tribunais para afastar a incidência de uma norma, no todo ou em parte, tida por inconstitucional.
Segundo o subprocurador-geral, o caso envolve a interpretação e a aplicação dos artigos 5º e 11 do Decreto Presidencial 11.302/2022, que envolvem duas questões distintas. A primeira é objeto de questionamento na ADI 7.390, ajuizada por Augusto Aras em 2023, quando exercia o cargo de procurador-geral da República. A questão está com exame pendente pelo STF por meio do Recurso Extraordinário (RE) 1.450.100, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.267), e da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.390.
Diante da controvérsia, por meio de agravo regimental (recurso) no HC 892.573, Augusto Aras pede a análise do caso pela Corte Especial do STJ para apreciação dos temas. Aras aponta que, ao conceder o habeas corpus a um condenado por porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, com base no referido indulto de Natal, sem levar em conta o cumprimento de pena por condenação por delito impeditivo (tráfico de drogas), a decisão violou as restrições estabelecidas pelo próprio decreto.
No recurso, ele aponta que, nos casos de condenação por vários crimes, o limite de cinco anos adotado para a concessão do benefício leva em consideração a pena máxima prevista na lei para cada um dos ilícitos cometidos e não o total aplicado na sentença. Ou seja, segundo Aras, essa possibilidade “premia com excessiva generosidade” aqueles que cometeram quantidade maior de crimes, uma vez que fica perdoada a totalidade da condenação, independentemente da punição concretamente imposta na sentença.
No agravo, Aras pontua que, na decisão monocrática questionada, todos os crimes foram considerados isoladamente, em interpretação que chega a um resultado diametralmente oposto ao pretendido pelo decreto. Para ele, o parágrafo único do artigo 5º da norma “contém regra especial voltada apenas para os crimes cometidos em concurso, em um mesmo contexto fático”, ou seja, caso constituam o único evento criminoso no histórico do apenado, inexistindo na ficha criminal “infrações diversas”. Tal situação não se encaixa no caso em análise.
Crimes impeditivos – A segunda questão levantada pelo subprocurador-geral é se o indulto de crime não impeditivo depende do cumprimento da pena de crime impeditivo e se isso estaria condicionado a terem sido cometidos em concurso de crimes. De acordo com Aras, o parágrafo único do artigo 11 é claro ao determinar que não será concedido indulto natalino correspondente a crime não impeditivo enquanto a pessoa condenada não cumprir a pena pelo crime impeditivo do benefício. “Tem-se, assim, que é condição para o indulto do crime não impeditivo o cumprimento integral das penas alusivas aos crimes impeditivos listados no art. 7º do Decreto 11.302/2022”, pontua.
O STJ vem concedendo habeas corpus com base em interpretação que concede, indevidamente, habeas corpus a condenados, gerando insegurança jurídica. Nesse contexto, o STF já decidiu, por meio da Suspensão Liminar (SL)1.698, suspender as decisões do STJ em quatro habeas corpus, que possibilitaram a concessão de indulto a pessoas que cometeram crimes não impeditivos, embora cumprissem pena por crimes que impediriam a concessão de indulto, conforme determina o artigo 11 do decreto presidencial.
Nesse sentido, conclui que não há que se cogitar, no caso concreto, a concessão do indulto previsto no Decreto Presidencial 11.302/2022, em razão das duas questões analisadas. Tanto porque ainda não foram cumpridas integralmente as penas dos dois crimes impeditivos (roubo e tráfico de drogas), quanto porque a soma das penas ultrapassa o limite impeditivo de cinco anos.