Ele foi acusado de ser o causador do acidente, em que morreram dois empregados.
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) se manifeste sobre a possível responsabilidade da CSN Mineração S. A. pelo acidente envolvendo um motorista que sustenta ter desenvolvido doença psiquiátrica após ter sido acusado pela empresa de ser o causador da morte de dois colegas de trabalho. Segundo a Turma, esse aspecto não foi examinado nas instâncias anteriores.
Acidente
Na reclamação trabalhista, o empregado disse que, na madrugada de 20/4/2012, um acidente vitimou dois empregados na área de mineração da CSN em Congonhas (MG), quando um caminhão modelo fora de estrada, semelhante ao que costumava operar, passou sobre a caminhonete onde eles estavam. Segundo ele, a empresa o acusou de ter sido o causador do acidente, e isso resultou no surgimento de transtornos psiquiátricos que causaram sua total incapacidade para o trabalho.
Condições de risco
Ele argumentou, ainda, que o local do acidente é uma área aberta de mineração, sem sinalização ou regras de tráfego apontando preferências de passagem e sem iluminação, onde os empregados trabalhavam em condições de risco, em descumprimento à Norma Regulamentadora 22, que trata de saúde e segurança na área de mineração.
Ao pedir indenizações por danos materiais e morais, ele disse que, desde 2012, estava afastado de suas atividades profissionais por auxílio-doença acidentário, em razão dos problemas psiquiátricos adquiridos após ter vivenciado situação traumatizante no trabalho e ter sido acusado de ser o causador do acidente.
Indícios
A CSN, em sua defesa, sustentou que em momento algum culpou o empregado pelo acidente ou moveu ação contra ele e que deu toda a assistência, buscando preservá-lo psicologicamente. De acordo com sua versão, assim que tomou conhecimento do episódio, deu início à apuração dos fatos, ouvindo o empregado e diversos outros que trabalhavam próximo ao local ou que transitavam pela estrada em em horário próximo ao da ocorrência. Ainda segundo a CSN, as próprias declarações do empregado e os indícios encontrados no caminhão que ele conduzia permitiram concluir que ele esteve envolvido no acidente.
Ausência de provas
O juízo da Vara do Trabalho de Congonhas (MG) indeferiu o pedido de indenização, por considerar que não foi comprovada a alegação de que a empresa havia imputado ao trabalhador a culpa pelo acidente. Ainda, de acordo com a sentença, não havia prova de que o empregado estaria inapto para o trabalho.
O Tribunal Regional do Trabalho da 3º Região (MG) manteve a decisão pelos mesmos fundamentos e rejeitou os embargos de declaração em que o empregado sustentava que o fundamento de seu pedido não se limita à falsa acusação, mas, principalmente, na negligência da empresa ao descumprir as normas e os procedimentos de segurança. Segundo ele, isso teria ocasionado o acidente, que, desde aquela época, vinha “destruindo a sua vida”.
Omissão
No recurso de revista, ele insistiu no argumento de que o TRT teria se omitido na apreciação do caso, ao examinar apenas se ele era ou não motorista de caminhão, ignorando o nexo de causalidade entre a doença ocupacional e o acidente.
O relator, ministro Mauricio Godinho Delgado, verificou ser incontroverso que o empregado se envolveu no acidente e que, em relatório interno de apuração de irregularidades, consta a conclusão da existência de indícios de sua responsabilidade. Assinalou, ainda, que o pedido de indenização não se limitava à falsa acusação, mas, também, ao descumprimento das normas de segurança pela empresa.
Todavia, o TRT não se manifestou sobre a ocorrência do acidente e a invalidez por doença psíquica nem sobre a responsabilidade civil da empresa de mineração. Segundo o relator, o expresso pronunciamento pelo TRT acerca da matéria é imprescindível à adequada prestação jurisdicional, considerando-se que o acesso ao TST está condicionado ao requisito do prequestionamento explícito sobre pontos considerados relevantes ao perfeito enquadramento jurídico da controvérsia (Súmulas 126 e 297).
Por unanimidade, a Turma anulou a decisão do TRT, por negativa de prestação jurisdicional, e determinou o retorno dos autos para que se manifeste sobre a questão trazida nos embargos de declaração, sobretudo quanto ao pedido de indenização por danos morais e materiais sob o enfoque da responsabilidade civil da empresa em decorrência da alegada doença ocupacional psiquiátrica que acomete o trabalhador.
O recurso ficou assim ementado:
A) AGRAVO DE INSTRUMENTO . RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017 . NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. OMISSÃO CONFIGURADA. Demonstrado no agravo de instrumento que o recurso de revista preenchia os requisitos do art. 896 da CLT, quanto ao tema em epígrafe, dá-se provimento ao agravo de instrumento, para melhor análise da arguição de violação ao art. 93, IX, da CF, suscitada no recurso de revista . Agravo de instrumento provido.
B) RECURSO DE REVISTA . PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017 . NULIDADE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. OMISSÃO CONFIGURADA. Há omissão no julgado quando o órgão julgador deixa de analisar questões fáticas e jurídicas relevantes para o julgamento – suscitadas pelas partes ou devolvidas ao exame da Corte Regional em razão dos efeitos devolutivos. No caso dos autos , a controvérsia suscitada pela Reclamante, em sede de embargos de declaração, e devolvida ao exame desta Corte Superior, mediante a arguição de nulidade por negativa de prestação jurisdicional, decorreu da manutenção, pelo TRT, da sentença que indeferiu o pleito obreiro de indenização por danos morais e materiais por fatores da infortunística do trabalho. Conforme se extrai do acórdão recorrido, restou incontroverso nos autos que o Reclamante, no desempenho de suas atividades laborais em prol da Reclamada, se envolveu em acidente automobilístico, que culminou no óbito de dois empregados da empresa . Compulsando a inicial, verifica-se que o Reclamante afirma que, desde 2012, encontra-se afastado de suas atividades profissionais, percebendo auxílio-doença espécie 91, em virtude de problemas psiquiátricos adquiridos após ter vivenciado situação traumatizante em seu ambiente de trabalho e ser acusado pela Reclamada de ser o causador do acidente automobilístico que vitimou outros dois empregados . Sabe-se que a indenização resultante de acidente do trabalho e/ou doença profissional ou ocupacional supõe a presença de três requisitos: a) ocorrência do fato deflagrador do dano ou do próprio dano, que se constata pelo fato da doença ou do acidente, os quais, por si sós, agridem o patrimônio moral e emocional da pessoa trabalhadora (nesse sentido, o dano moral, em tais casos, verifica-se pela própria circunstância da ocorrência do malefício físico ou psíquico); b) nexo causal ou concausal, que se evidencia pelo fato de o malefício ter ocorrido em face das condições laborativas; c) culpa empresarial, excetuadas as hipóteses de responsabilidade objetiva. Embora não se possa presumir a culpa em diversos casos de dano moral – em que a culpa tem de ser provada pelo autor da ação -, tratando-se de doença ocupacional, profissional ou de acidente do trabalho, essa culpa é presumida, em virtude de o empregador ter o controle e a direção sobre a estrutura, a dinâmica, a gestão e a operação do estabelecimento em que ocorreu o malefício. Frise-se que é do empregador, evidentemente, a responsabilidade pelas indenizações por dano moral, material ou estético decorrentes de lesões vinculadas à infortunística do trabalho, sem prejuízo do pagamento pelo INSS do seguro social. O Juízo de origem julgou improcedentes os pleitos formulados pelo Obreiro na inicial, por assentar que as ” provas produzidas nos autos não comprovam a alegação de que a reclamada teria imputado ao autor a culpa pelo acidente ocorrido”. A Corte Regional, a partir da premissa de que o Reclamante pleiteou indenização por danos morais pelo fato de a Reclamada tê-lo acusado de causar um acidente e ter matado dois colegas , manteve a sentença que rejeitou os pedidos formulados na inicial, por assentar que o Reclamante não produziu “prova alguma de que tivesse sido acusado, como alega na inicial”, não vislumbrando, desse modo, a prática de qualquer ato ilícito por parte da Reclamada, que ensejasse sua responsabilização civil . Contudo, extrai-se, processualmente, que, tanto em sede de recurso ordinário, quanto em sede de embargos de declaração, o Reclamante sustentou que o fundamento de origem do pedido inicial não se limita à falsa acusação feita pela Reclamada, ” mas busca guarida também, e talvez, principalmente, na negligência daquela empresa ao descumprir os preceitos da NR 22 e demais procedimentos de segurança do trabalhador, ocasionando o acidente em comento, o qual, desde aquela época, vem destruindo a vida do Embargante “. Alegou, ainda, que o TRT não levou em consideração ” a ocorrência do acidente e o prejuízo moral (invalidez por doença psíquica) do Embargante “. R Contudo, apesar de opostos os competentes embargos de declaração, a Corte Regional permaneceu silente sobre os esclarecimentos de aspectos fáticos imprescindíveis à exaustão da prestação jurisdicional, notadamente no que diz respeito a responsabilidade civil da Reclamada em decorrência da alegada doença ocupacional psiquiátrica que acomete o Reclamante, que resultou, inclusive, em afastamento previdenciário . O expresso pronunciamento pelo TRT acerca da citada matéria, levantada nos embargos declaratórios, é imprescindível à exaustão da prestação jurisdicional, considerando-se que o acesso a este Tribunal se encontra fortemente jungido ao requisito do prequestionamento explícito sobre pontos considerados relevantes ao perfeito enquadramento jurídico da controvérsia (Súmulas 126 e 297). Agregue-se que, no Processo do Trabalho, é apta a inicial que contém os requisitos do art. 840 da CLT, não se aplicando, neste ramo especializado, o rigor da lei processual civil (art. 282 do CPC/73; art. 319 do CPC/15), pois é a própria CLT quem disciplina a matéria, norteando-se pela simplicidade. Outrossim, é vedado ao magistrado extrapolar o que foi pedido (decisão ultra petita) ou conhecer de questões não suscitadas na lide (decisão extra petita). Nesse sentido, o art. 460 do CPC/1973 (art. 492 do CPC/2015) dispõe ser defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado. Com efeito, compreende-se que os fatos que compuseram as causas de pedir – que inclui o acidente de trabalho sofrido e as lesões dele decorrentes (doença psíquica que culminou em afastamento previdenciário do Obreiro) – são claros e possuem correspondência com o pleito reparatório, não cabendo falar em limitação da causa de pedir à alegação de que a Reclamada teria imputado ao autor a culpa pelo acidente ocorrido. Por fim, não se olvide que as decisões regionais devem se revestir da desejada amplitude, visto ser vedado a este Tribunal Superior o reexame de fatos e provas (óbice da Súmula 126 do TST). Recurso de revista conhecido e provido no aspecto. Prejudicado o exame do tema remanescente.
Os Embargos de Declaração ficaram assim ementados:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017 . OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. A matéria sobre a qual a Embargante alega ter havido omissão – ” nulidade por negativa de prestação jurisdicional ” – foi devidamente analisada e fundamentada no acórdão embargado, em consonância com o princípio constitucional da motivação das decisões judiciais (art. 93, IX, da CF), também referido na lei ordinária – arts. 832 , da CLT; e 489 , do CPC/2015. Se a argumentação posta nos embargos não se insere em nenhum dos vícios mencionados nos arts. 897-A , da CLT; e 1.022 , do CPC/2015, deve ser desprovido o recurso. Embargos de declaração desprovidos.
Processo: RR-12583-84.2016.5.03.0054