Correção dos benefícios de previdência privada foi desvinculada do salário mínimo antes da Constituição de 88

Os reajustes anuais dos benefícios de previdência privada calculados com base na variação do salário mínimo se deram apenas até a entrada em vigor da Lei 6.435/77.

Esse foi o entendimento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar recurso especial em que se discutia se a desindexação do salário mínimo para fins de correção de benefícios de previdência privada teve início antes ou depois da Constituição de 1988.

No recurso, alegou-se que o tribunal de origem, ao considerar a Constituição como o início da desvinculação, afrontou jurisprudência pacífica dos tribunais superiores.

Em seu voto, o relator, ministro Villas Bôas Cueva, explicou que desde 1975 o governo federal, na tentativa de frear a inflação, editou normas instituindo novo regime monetário para desvincular a economia baseada no salário mínimo como fator de reajustes e instituir, em seu lugar, a Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional (ORTN).

No caso específico dos planos de previdência privada, o magistrado ressaltou que, com a edição da Lei 6.435/77, os reajustes dos benefícios também poderiam ocorrer de acordo com outro índice previamente aprovado pelo órgão normativo competente.

Índices substitutos

O ministro afirmou que, em consonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a mudança do parâmetro de reajuste dos benefícios não fere direito adquirido do beneficiário. Portanto, ele não tem direito à manutenção do salário mínimo como índice de correção, mas sim ao índice adotado pela legislação em vigor no momento do recebimento.

“O assistido possui direito adquirido ao benefício previdenciário complementar em si mesmo e à efetiva atualização monetária de seu valor, mas não a determinado índice de correção monetária. A substituição de um indexador por outro é possível desde que idôneo para medir a inflação, recompondo a obrigação contratada”, disse Villas Bôas Cueva.

Segundo o ministro, “com a vedação legal da utilização do salário mínimo como fator de correção monetária para os benefícios da previdência privada (advento da Lei 6.435/77), devem ser aplicados em substituição os índices estipulados, ao longo dos anos, pelos órgãos do Sistema Nacional de Seguros Privados, sobretudo para os contratos de previdência privada aberta: na ordem, ORTN, OTN, IPC, BTN e TR. Após o reconhecimento da inadequação da TR para corrigir tais benefícios, deve ser adotado um Índice Geral de Preços de ampla publicidade.”

“A lei que modifica o regime monetário e a economia nacionais possui natureza institucional e estatutária, o que justifica a sua incidência imediata, inclusive em contratos em curso de execução”, concluiu o relator.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PREVIDÊNCIA PRIVADA ABERTA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. POSSIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. AFASTAMENTO. PRESCRIÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. RENÚNCIA TÁCITA. APOSENTADORIA SUPLEMENTAR VITALÍCIA. RECONHECIMENTO. CORREÇÃO MONETÁRIA. VARIAÇÃO DO SALÁRIO MÍNIMO. VEDAÇÃO LEGAL. LEI Nº 6.435⁄1977. DIREITO ADQUIRIDO. DESCARACTERIZAÇÃO. NORMA COGENTE. SUBSTITUIÇÃO POR ÍNDICES OFICIAIS.
1. Ação ordinária em que se discute se a correção monetária da aposentadoria suplementar vitalícia pode ser feita com base na variação do salário mínimo.
2. É possível o julgamento antecipado da lide quando as instâncias ordinárias entenderem substancialmente instruído o feito, declarando a existência de provas suficientes para o seu convencimento (art. 130 do CPC⁄1973), sendo desnecessária a produção de perícia.
3. Havendo o exaurimento do prazo prescricional, os fatos concernentes ao reconhecimento inequívoco do direito do credor pelo devedor podem receber a qualificação jurídica de renúncia à prescrição (art. 161 do CC⁄1916 e art. 191 do CC⁄2002). Com efeito, a emissão de documento pelo prescribente admitindo a existência da obrigação previdenciária (direito do participante à aposentadoria complementar), propondo inclusive “acordos amigáveis”, é ato incompatível com a prescrição, a evidenciar a sua renúncia tácita.
4. Inexiste violação a direito adquirido, consistente na manutenção de determinado índice (salário mínimo), como atualizador dos benefícios e contribuições previdenciárias privadas, ante a incidência imediata de norma de ordem pública (Lei nº 6.435⁄1977, art. 22), que instituiu novo fator de reajuste (ORTN) para tanto, até para as obrigações de execução sucessiva. Vedação de utilização, na Previdência Complementar, da variação do salário mínimo como indexador mesmo antes da edição da Constituição Federal de 1988 (art. 7º, IV). Precedentes.
5. O assistido possui direito adquirido ao benefício previdenciário complementar em si mesmo e à efetiva atualização monetária de seu valor, mas não a determinado índice de correção monetária. A substituição de um indexador por outro é possível desde que idôneo para medir a inflação, recompondo a obrigação contratada. Não pode incidir, dessa forma, índice aleatório, que privilegie, por um lado, a entidade de previdência privada ou, por outro, o participante.
6. Com a vedação legal da utilização do salário mínimo como fator de correção monetária para os benefícios da previdência privada (advento da Lei nº 6.435⁄1977), devem ser aplicados em substituição os índices estipulados, ao longo dos anos, pelos órgãos do Sistema Nacional de Seguros Privados, sobretudo para os contratos de previdência privada aberta: na ordem, ORTN, OTN, IPC, BTN e TR. Após o reconhecimento da inadequação da TR para corrigir tais benefícios, ou seja, a partir da vigência da Circular⁄SUSEP nº 11⁄1996, deve ser adotado um Índice Geral de Preços de Ampla Publicidade (INPC⁄IBGE, IPCA⁄IBGE, IGPM⁄FGV, IGP-DI⁄FGV, IPC⁄FGV ou IPC⁄FIPE). Na falta de repactuação, deve incidir o IPCA (art. 1º, parágrafo único, do Anexo I da Circular⁄SUSEP nº 255⁄2004).
7. Recurso especial parcialmente provido.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1520012

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