A compensação de ICMS cobrado sobre mercadorias dadas em bonificação não exige comprovação de inexistência de repasse econômico, e dessa forma não há violação ao artigo 166 do Código Tributário Nacional (CTN).
Com esse entendimento, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu o recurso de uma empresa para inviabilizar ação rescisória contra decisão que considerou a compensação legítima.
O ministro relator do recurso no STJ, Gurgel de Faria, explicou que o acórdão recorrido considerou possível a ação rescisória contra a compensação com base em julgamentos do STJ que não se aplicam à hipótese de mercadorias dadas em bonificação. Segundo o magistrado, os precedentes utilizados pelo tribunal de origem dizem respeito a majoração de alíquota, casos em que a compensação, quando feita, exige comprovação de não repasse econômico.
“O acórdão recorrido, para afastar o óbice estampado na Súmula 343 do Supremo Tribunal Federal, elencou diversos precedentes desta corte superior que, embora condicionem a compensação (creditamento) de ICMS à prova do não repasse econômico do tributo, não guardam similitude fática com a decisão rescindenda, que versa sobre indébito de ICMS incidente sobre mercadorias dadas em bonificação”, resumiu o ministro.
Falta de proveito
Dessa forma, segundo o relator, não há violação ao artigo 166 do CTN, tornando a Súmula 343 do STF aplicável ao caso e inviabilizando a ação rescisória quanto à alegada violação do código tributário.
“Por ostentar peculiaridade não sopesada em nenhum dos arestos indicados, não é possível chegar à conclusão de que a decisão rescindenda tenha afrontado a jurisprudência do STJ então firmada acerca da aplicação do artigo 166 do CTN”, disse ele.
Compensação possível
Na sentença rescindenda, o juiz consignou que a compensação seria possível desde que comprovados os valores recolhidos indevidamente por meio de liquidação de sentença.
Os ministros aceitaram os argumentos da empresa, de que não é possível exigir prova de repercussão do tributo quando não há repasse econômico, o que se justifica pela graciosidade que configura a bonificação.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. ICMS. MERCADORIAS DADAS EM BONIFICAÇÃO. DECISÃO RESCINDENDA QUE AUTORIZA A COMPENSAÇÃO DO INDÉBITO. VIOLAÇÃO À LITERALIDADE DO ART. 166 DO CTN NÃO CONFIGURADA. SÚMULA 343 DO STF. APLICAÇÃO.1. O Plenário do STJ decidiu que “aos recursos interpostos com fundamento no CPC⁄1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça” (Enunciado Administrativo n. 2).2. A admissão de ação rescisória ajuizada com fulcro no art. 485, V, do CPC⁄1973 pressupõe a demonstração clara e inequívoca de que a decisão de mérito impugnada tenha contrariado a literalidade do dispositivo legal suscitado, atribuindo-lhe interpretação jurídica absolutamente insustentável.3. Em razão dessa premissa normativa, tem-se que a adoção, pela decisão rescindenda, de tese jurídica razoável, ainda que não fosse a melhor, não enseja a desconstituição da coisa julgada, mormente se fundada em disposição legal de interpretação controvertida nos tribunais, consoante inteligência da Súmula 343 do STF.4. A contrario sensu, o referido verbete de súmula pode ser afastado quando demonstrado que, à época em que prolatado o acórdão rescindendo, já havia jurisprudência pacífica sobre o tema no âmbito das cortes superiores.5. Hipótese em que o acórdão recorrido, para a afastar o óbice estampado na Súmula 343 do STF, elencou diversos precedentes desta Corte Superior que, embora condicionem a compensação (creditamento) de ICMS à prova do não repasse econômico do tributo, não guardam similitude fática com a decisão rescindenda, que versa sobre indébito de ICMS incidente sobre mercadorias dadas em bonificação.6. Por ostentar peculiaridade não sopesada em nenhum dos arestos indicados, de que não há contraprestação financeira alguma em relação às mercadorias dadas em bonificação a ensejar a possibilidade de repasse do encargo financeiro do tributo indevidamente cobrado do contribuinte de direito (vendedor), não é possível chegar à conclusão de que a decisão rescindenda, proferida em 25⁄06⁄2008, tenha afrontado a jurisprudência do STJ então firmada em torno da aplicação do art. 166 do CTN.7. A dispensa da providência preconizada no art. 166 do CTN para o reconhecimento do direito à repetição do indébito de ICMS no caso específico das bonificações não pode ser considerada como manifestamente ilegal, notadamente se considerado que a Primeira Turma já reconheceu a inexistência do repasse do encargo econômico do tributo para essas situações, por ocasião do julgamento do REsp 1.366.622⁄SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, publicado no DJe 20⁄05⁄2013.8. Não sendo possível concluir que o provimento alcançado pela decisão rescindenda seja flagrantemente ilegal ou tenha contrariado a jurisprudência desta Corte Superior existente à época em que proferida, é incabível a ação rescisória, na exegese da Súmula 343 do STF.9. Agravo conhecido para dar provimento ao recurso especial.