Cervejas com graduação alcoólica de até 0,5% não podem usar expressão “sem álcool”

Em julgamento finalizado na tarde desta segunda-feira (24), a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou indevido o uso da expressão “sem álcool” adotada nos rótulos de cervejas com graduação alcoólica inferior a 0,5%.

Por maioria de votos, o colegiado acolheu embargos interpostos pelo Ministério Público Federal (MPF) contra decisão da Quarta Turma que havia considerado válida a utilização da expressão com base na legislação aplicável à classificação, produção e fiscalização de bebidas.

A presidente do STJ, ministra Laurita Vaz, relatora dos embargos de divergência, disse que, de fato, o artigo 12, inciso I, do Decreto 6.871/09, utilizado como referência para o julgamento da Quarta Turma, determina que bebidas com até meio por cento em volume de álcool etílico sejam classificadas como não alcoólicas.

Todavia, a ministra ressaltou que a manutenção da informação nos rótulos prejudica os consumidores e viola o Código de Defesa do Consumidor, que proíbe a oferta de produtos com informação inverídica.

“O fato de existir decreto regulamentar que classifica como ‘sem álcool’ a cerveja com teor alcoólico de até 0,5% não autoriza que a embargada desrespeite os direitos mais básicos do consumidor, garantidos em lei especial, naturalmente prevalecente na espécie”, ressaltou a relatora em seu voto.

Ofensa à dignidade

A finalização do julgamento pelo colegiado, formado pelos 15 ministros mais antigos do tribunal, ocorreu após a apresentação de voto-vista do ministro Herman Benjamin. O ministro confirmou a tese da impossibilidade da venda de cerveja rotulada como livre de álcool caso ela apresente qualquer nível etílico em sua fórmula.

“Sem dúvida, a ingestão de cerveja ‘sem álcool’ por erro de consentimento, por aqueles que se impõem à proibição de ingerir a aludida substância química, seja por convicção religiosa ou moral, seja por restrições médicas, constitui fato causador de grave ofensa à dignidade humana. E o que dizer dos pais que permitem que seus filhos menores consumam cervejas ‘sem álcool’ por não saberem que ela, em verdade, contém álcool? ”, ponderou o ministro Benjamin em seu voto.

A decisão da Corte restabelece sentença que havia julgado procedente ação civil pública promovida pela Associação Brasileira de Defesa da Saúde do Consumidor (Saudecon) contra a empresa Cervejarias Kaiser Brasil. Em primeira instância, o magistrado determinou a supressão da expressão “sem álcool” nas cervejas da marca Bavaria, sob pena de multa diária de mil salários mínimos. A decisão foi confirmada em segunda instância pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

O recurso ficou assim ementado:

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. CONSUMIDOR, CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CERVEJA COM A EXPRESSÃO “SEM ÁLCOOL” NO RÓTULO. PRESENÇA DE TEOR ALCOÓLICO DE ATÉ 0,5%. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AO DIREITO À INFORMAÇÃO CLARA E ADEQUADA. EXISTÊNCIA DE DECRETO REGULAMENTAR QUE PERMITE A CLASSIFICAÇÃO. IRRELEVÂNCIA. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA ACOLHIDOS.
1. O mero erro no endereçamento dos embargos de divergência não gera o não conhecimento do recurso, pois não se verificou má-fé da parte Embargante, tampouco prejuízo ao direito de defesa da Embargada. Precedentes.
2. Questão referente à possibilidade de exposição à venda de cerveja que, embora classificada em seu rótulo com a expressão “sem álcool”, possua teor alcoólico de até 0,5%. Similitude entre os acórdãos embargado e paradigma, que trataram da matéria à luz das normas legais vigentes, notadamente do Código de Defesa do Consumidor.
3. A informação “sem álcool”, constante do rótulo do produto,  é falsa e, por isso, está em clara desconformidade com o que dispõe o Código de Defesa do Consumidor, notadamente em prejuízo do direito à informação clara e adequada.
4. O fato de existir decreto regulamentar que classifica como “sem álcool” a cerveja com teor alcoólico de até 0,5% não autoriza que a Empresa, Embargada, desrespeite os direitos mais básicos do consumidor, garantidos em lei especial, naturalmente prevalecente na espécie.
5. Embargos de divergência acolhidos. Acórdão embargado reformado para restabelecer a sentença que julgou procedente a ação civil pública.
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Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): EREsp 1185323

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