A compradora desconhecia que tramitava ação trabalhista contra o vendedor.
A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho desconstituiu a constrição judicial de um automóvel marca VW Gol, que fora penhorado para garantir as verbas rescisórias de um ajudante de caminhoneiro de um microempresário de São Paulo (SP). O colegiado concluiu que a atual proprietária do veículo agiu de boa-fé ao adquiri-lo, pois desconhecia que, na época do negócio, havia uma reclamação trabalhista em tramitação contra o vendedor.
Restrição
O microempresário foi condenado pela Justiça do Trabalho ao pagamento de diversas parcelas ao ajudante, como saldo de salário, 13º, férias e FGTS, totalizando, na época, R$ 5,8 mil. Como não foram encontrados outros bens para a quitação da dívida, o juízo, por meio do sistema Renajud, que interliga o Judiciário ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), localizou o veículo e determinou a sua penhora, em novembro de 2017.
Ocorre que, em agosto daquele ano, o veículo fora vendido a uma dona de casa de Ferraz de Vasconcelos (SP) por R$ 16 mil e a seu marido. Ao tentar regularizar a compra, em maio de 2018, eles foram informados que o carro estava com restrição de transferência.
Por meio de recurso (embargos de terceiro), a dona de casa afirmou que ela e o marido haviam comprado o carro de boa-fé e que precisavam dele para trabalhar. Sustentou, ainda, que, na data da transação, não havia qualquer restrição sobre o veículo.
Certidões
A penhora, no entanto, foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), que entendeu que a venda havia sido realizada “em evidente fraude à execução”, pois, na época, a empresa pertencente ao proprietário já havia sido condenada na ação trabalhista. Segundo o TRT, se a compradora tivesse agido com cautela, teria se cientificado da ação trabalhista e da potencial insolvência do vendedor, uma vez que é fácil obter certidões e, por meio do CPF do vendedor, é possível saber se há ações judiciais em seu nome, até mesmo pela internet.
Boa-fé
O relator do recurso de revista da dona de casa, desembargador convocado João Pedro Silvestrin, afirmou que o negócio jurídico pactuado foi realizado de boa-fé, pois, quando o automóvel foi adquirido, conforme documento com reconhecimento de firma em cartório, não havia ainda direcionamento da sua execução ou registro da constrição do veículo. Segundo ele, é imprescindível a existência de má-fé do comprador para legitimar a constrição judicial do bem, não se sustentando a presunção do TRT de que apenas o vendedor, por ser executado em processo trabalhista, teria agido dessa forma.
Cautela
Segundo o relator, deve-se levar em consideração o costume social de aquisições de bens sem a devida cautela do adquirente, “principalmente envolvendo pessoas de pouca ou nenhuma escolaridade, de quem não se pode exigir a adoção das cautelas recomendadas no recurso julgado pelo Tribunal Regional”. No caso, ainda que as cautelas tivessem sido adotadas, não havia nenhuma constrição sobre o bem no momento da aquisição.
A decisão foi unânime.
Processo: RR-1000648-58.2018.5.02.0322