O Supremo Tribunal Federal reconhece às uniões homoafetivas o status de entidade familiar
A Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do Tribunal Superior do Trabalho deferiu a fixação de cláusula de acordo coletivo que reconhece a paridade de tratamento entre as uniões estáveis homoafetivas e heteroafetivas com relação aos benefícios concedidos pelas empresas aéreas a seus empregados. A decisão fundamentou-se em precedentes da SDC e na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que reconheceu às uniões homoafetivas o status de entidade familiar.
No julgamento do dissídio coletivo envolvendo o Sindicato dos Aeroviários de Porto Alegre e o Sindicato Nacional das Empresas Prestadoras de Serviços Auxiliares de Transporte Aéreo (Sineata) com relação ao acordo 2014/2015, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) rejeitou a cláusula, por entender que ela só seria cabível em caso de ajuste entre as partes ou de regulação em lei.
Relevância social e jurídica
Para o relator do recurso do sindicato dos aeroviários, ministro Mauricio Godinho Delgado, a cláusula tem alta relevância social e jurídica, pois busca resguardar o tratamento isonômico entre as famílias dos empregados compostas de casais heteroafetivos e pares homoafetivos sem, no entanto, gerar encargo financeiro novo ao empregador. “A cláusula apenas fixa, no plano específico das relações de trabalho abrangidas pela sentença normativa, a obrigação de que sejam atendidas regras constitucionais de proteção da instituição família e de vedação a condutas discriminatórias”, afirmou.
STF
O ministro lembrou que o STF, em 2011, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277, decidiu que o reconhecimento da paridade de direitos entre os casais heterossexuais e as uniões homoafetivas é uma exigência constitucional. Nessa decisão, o STF afastou qualquer interpretação do artigo 1.723 do Código Civil que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, sujeitas às mesmas regras e às mesmas consequências da união estável heteroafetiva.
SDC
Além disso, o ministro salientou que a SDC já se manifestou em duas oportunidades sobre a possibilidade de fixação de cláusula com conteúdo similar, em casos que envolviam os mesmos sindicatos.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ORDINÁRIO DO SINDICATO DOS AEROVIÁRIOS DE PORTO ALEGRE. PROCESSO ANTERIOR À LEI 13.467/2017. DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA ECONÔMICA. 1. CLÁUSULAS DE NATUREZA ECONÔMICA. As cláusulas de natureza econômica reivindicadas pela categoria profissional não encontram respaldo em normas coletivas preexistentes (discutidas e fixadas por livre negociação entre as partes em acordo ou convenção coletiva ou sentença normativa homologatória de acordo). Por outro lado, também não constam elementos nos autos que comprovem a configuração de conquista histórica da categoria profissional (benefício que tenha sido objeto de negociação pelos Sujeitos Coletivos, em instrumento normativo autônomo, por dez anos consecutivos, no mínimo, segundo a Jurisprudência desta SDC – ressalva do Relator, neste ponto). Assim, indeferem-se as reivindicações, na medida em que acarretam acréscimo no encargo financeiro da Empregadora, devendo ser negociadas diretamente entre os Sujeitos Coletivos. Recurso ordinário desprovido, no aspecto. 2. CLÁUSULA 48ª – PARCEIRO(A) DO MESMO SEXO. Trata-se de reivindicação que tem como objetivo evitar que o empregador deixe de conceder aos companheiros de empregados de união estável homoafetiva os eventuais benefícios concedidos a companheiros de empregados de uniões heteroafetivas. A cláusula, portanto, detém alta relevância social e jurídica, uma vez que busca resguardar o tratamento isonômico entre as famílias dos empregados compostas de casais heteroafetivos e pares homoafetivos, não gerando encargo financeiro novo ao empregador. Com efeito, a cláusula apenas fixa, no plano específico das relações de trabalho abrangidas pela sentença normativa, a obrigação de que sejam atendidas regras constitucionais de proteção da instituição família (art. 226, caput, da CF) e de vedação a condutas discriminatórias. Atente-se que o sistema de proteções constitucionais contra discriminações tem um caráter abrangente e diversificado, contando, no título magno que fixa os “Princípios Fundamentais” da República Brasileira, com a expressa disposição no sentido de que é um objetivo fundamental da República Federativa do Brasil promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, IV, da CF). Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.277, em decisão publicada no ano de 2011, proclamou ser exigência constitucional o reconhecimento da paridade de direitos entre os casais heterossexuais e as uniões homoafetivas, conferindo, a esta última, também o status de entidade familiar. Esta SDC já se manifestou, em duas oportunidades, sobre a possibilidade de fixação de cláusula com conteúdo similar ao ora discutido. Por essas razões, dá-se provimento ao recurso ordinário para deferir a fixação da CLÁUSULA 48ª – PARCEIRO(A) DO MESMO SEXO na sentença normativa, adequando-se a redação aos moldes fixados por esta Corte no julgamento dos recursos ordinários nº 20424-81.2010.5.04.0000 e nº 8919-25.2012.5.04.0000. Recurso ordinário provido para deferir a fixação da CLÁUSULA 48ª – PARCEIRO(A) DO MESMO SEXO. 3. DEMAIS CLÁUSULAS. Recurso ordinário parcialmente provido para deferir algumas cláusulas reivindicadas e indeferir outras, a fim de manter a sentença normativa em consonância com a jurisprudência desta SDC/TST.
A decisão foi unânime.
Processo: RO-21596-19.2014.5.04.0000