A ausência de contrato de serviço autônomo definiu a competência da Justiça do Trabalho
A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o exame do recurso da Concordia Logística Ltda., de Sapucaia do Sul (RS), que pretendia anular o reconhecimento do vínculo de emprego com um motorista. Para a maioria do colegiado, a não apresentação do contrato de transportador autônomo de carga afasta a necessidade de submissão do caso inicialmente à Justiça comum.
Natureza comercial
Na reclamação trabalhista originária, ajuizada pelo motorista em 2014, a empresa foi condenada a anotar a carteira do trabalhador e pagar as parcelas trabalhistas decorrentes. Antes da fase de execução, a Concordia apresentou a ação rescisória, visando anular a condenação.
Segundo a empresa, a decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), que confirmara a sentença, teria ignorado a Lei 11.442/2007, que dispõe sobre o transporte rodoviário de cargas e, na redação vigente na época (artigo 5º, parágrafo único), previa expressamente a competência da Justiça Comum. A norma também estabelece que as relações decorrentes do contrato de transporte de cargas são sempre de natureza comercial, não caracterizando, “em nenhuma hipótese”, o vínculo de emprego.
Tese do STF
O relator da ação, ministro Sérgio Pinto Martins, em decisão monocrática, havia acolhido a ação rescisória e determinado a remessa do processo à Justiça comum. O fundamento de sua decisão foi a tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 48, de que, uma vez preenchidos os requisitos da Lei 11.442/2007, está configurado o vínculo comercial e afastado o vínculo trabalhista – e, consequentemente, a competência da Justiça do Trabalho para o exame da controvérsia.
Contrato
Contudo, no julgamento de agravo interposto pelo motorista, prevaleceu o voto do ministro Amaury Rodrigues Pinto Júnior, para quem o caso apresenta uma distinção importante em relação ao entendimento do STF. Ele explicou que, conforme o artigo 4º da Lei 11.442/2007, é o contrato celebrado entre a transportadora e o motorista, ou entre o dono ou embarcador da carga e o transportador, que define a forma de prestação de serviço.
No caso, porém, a empresa não apresentou o contrato, não preenchendo, assim, o requisito legal. “Não se pode cogitar de transferir a competência para o Poder Judiciário Estadual, na medida em que não se está diante da relação comercial prevista na legislação”, observou. “Não é concebível que, em completo desvirtuamento dos critérios de definição de competência, a empresa, mediante singela alegação, escolha o ramo do Poder Judiciário que decidirá a pretensão do autor”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO. RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA. INCS. II E V DO ART. 966 DO CPC. AUSÊNCIA DO CONTRATO DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE CARGA. LEI Nº 11.442/2007. MERA ALEGAÇÃO QUE NÃO PODE DEFINIR A COMPETÊNCIA JURISDICIONAL.
1. Não se desconhece que o Supremo Tribunal Federal e especialmente a Primeira Turma da Excelsa Corte tem firmado entendimento de que compete à Justiça Comum decidir a respeito de eventual desvirtuamento do contrato do Transportador Autônomo de Cargas, porém, é preciso realçar que o caso dos autos apresenta importante “distinguishing”.
2. É que no caso dos autos o réu nem mesmo apresentou o contrato de Transportador Autônomo de Cargas que, conforme exigência do art. 4º da Lei n. 11.442/2007, é necessariamente escrito, “verbis”: “Art. 4º O contrato a ser celebrado entre a ETC e o TAC ou entre o dono ou embarcador da carga e o TAC definirá a forma de prestação de serviço desse último, como agregado ou independente”.
3. Não se está, portanto, diante de um contrato de transportador autônomo de cargas que precisará ser primeiramente submetido à jurisdição da Justiça Comum, pois essa modalidade contratual não passa de mera alegação por parte do réu e não é concebível que, em completo desvirtuamento dos critérios de definição de competência, o réu, mediante singela alegação, escolha o ramo do Poder Judiciário que decidirá a pretensão do autor.
Agravo conhecido e provido para negar provimento ao recurso ordinário.
Ficaram vencidos os ministros Sérgio Pinto Martins e Aloysio Corrêa da Veiga.
Processo: ROT-22192-95.2017.5.04.0000