TRF3 reconhece tempo especial e concede aposentadoria a trabalhador que atuou em distribuidora de gás

Autor esteve exposto de forma habitual e permanente a agentes inflamáveis

O desembargador federal Sérgio Nascimento, da Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), manteve sentença que reconheceu como especial tempo em que um segurado trabalhou em distribuidora de gás e determinou a concessão da aposentadoria.

Para o magistrado, ficou comprovado que nos períodos de 16/4/1985 a 24/6/1989 e de 19/8/1996 a 12/10/2016, o autor exerceu suas atividades nas funções de assistente administrativo, comercial e gerente de filial, exposto a explosivos, com risco à sua integridade física.

“Saliento que a periculosidade decorrente da exposição habitual e permanente a agentes inflamáveis não é passível de neutralização por nenhum equipamento de proteção individual, sobretudo por conta do risco de explosão”, explicou.

O desembargador federal também destacou que nas atividades com caráter de periculosidade, a caracterização em tempo especial independe da exposição do segurado durante toda a jornada de trabalho, pois a mínima exposição oferece potencial risco de morte ao trabalhador.

Em primeira instância, a 4ª Vara Federal de Campinas havia reconhecido a especialidade dos períodos e determinado ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.

A autarquia recorreu ao TRF3 sob a alegação de que o autor não comprovou exposição a agente nocivos de forma habitual e permanente por meio de laudo técnico contemporâneo.

Ao negar o pedido, o magistrado citou jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido de que pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10/12/1997 coma apresentação de informativos da época que descreviam as condições das atividades profissionais (SB-40, DSS-8030) ou Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS).

Assim, o desembargador federal manteve integralmente a sentença. O benefício por tempo de contribuição foi concedido a partir de 19/1/2018, data do requerimento administrativo, com correção monetária e juros de mora.

O recurso ficou assim decidido:

D  E  C  I  S  Ã O

Vistos, etc.

Trata-se de apelação de sentença que julgou procedente o pedido formulado em ação previdenciária para reconhecer a especialidade dos períodos de 16.04.1985 a 24.06.1989 e 19.08.1996 a 12.10.2016. Consequentemente, condenou o réu a conceder ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, sem a incidência do fator previdenciário, a teor do art. 29-C da Lei nº 8.213/1991, desde a data do requerimento administrativo, observando-se, quanto à correção monetária e juros, o disposto na Resolução nº 267 do Conselho da Justiça Federal. Antecipados os efeitos da tutela para a implantação do benefício no prazo de 10 dias. O réu foi condenado no pagamento dos honorários advocatícios, a ser liquidado oportunamente, no percentual mínimo previsto no inciso I, do §3º, respeitada a proporção dos incisos II a V, conforme previsto no §5º, todos do art. 85 do Código de Processo Civil.  Sem custas.

Noticiada pelo réu a implantação do benefício em comento.

Em suas razões de inconformismo recursal, busca o réu a reforma da sentença alegando, em síntese, que o autor não logrou êxito em comprovar a exposição a agente nocivos de forma habitual e permanente por meio de laudo técnico contemporâneo. Assevera, outrossim, que não é possível o reconhecimento da especialidade da atividade em razão de exposição à periculosidade após 05.03.1997, data em que deixou de ser previsto na legislação como agente nocivo para fins previdenciários. Ademais, o reconhecimento da especialidade do labor sem a comprovação da exposição a agentes nocivos, encontra óbice na ausência de prévia fonte de custeio.

Com a apresentação de contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

Após breve relatório, passo a decidir.

Nos termos do artigo 1.011 do CPC, recebo o recurso de apelação interposta pelo réu.

Da decisão monocrática

De início, cumpre observar que as matérias veiculadas no caso dos autos já foram objeto de precedentes dos tribunais superiores, julgadas no regime de recursos repetitivos e de repercussão geral, o que autoriza a prolação da presente decisão monocrática, nos termos do artigo 932, IV, “a” e “b”, do Novo Código de Processo Civil de 2015, e da Súmula/STJ n.º 568. Nesse sentido:

Conversão de tempo de serviço especial em comum: ARE 664335 (USO DE EPI. INSALUBRIDADE. RUÍDO. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DA ATIVIDADE ESPECIAL EM RAZÃO DA DECLARAÇÃO DE NEUTRALIZAÇÃO DO AGENTE NO PPP. CUSTEIO DA ATIVIDADE ESPECIAL); REsp 1398260/PR (INSALUBRIDADE. LIMITES. RUÍDO. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO); REsp 1310034/PR (POSSIBILIDADE DA CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM DE ATIVIDADE EXERCIDA ANTES DA LEI N. 6.887/1980); REsp 1151363/MG (POSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS A LEI N. 9.711/1998. FATOR DE CONVERSÃO) e; REsp 1306113/SC (ELETRICIDADE. INSALUBRIDADE. NATUREZA EXEMPLIFICATIVA DO ROL DOS AGENTES NOCIVOS PREVISTOS EM REGULAMENTO).

Ressalte-se que o julgamento monocrático atende aos princípios da celeridade processual e da observância aos precedentes judiciais, ambos contemplados na nova sistemática processual civil, sendo passível de controle por meio de agravo interno, nos termos do artigo 1.021 do CPC, cumprindo o princípio da colegialidade.

Sendo assim, por estarem presentes os requisitos extraídos das normas fundamentais do Código de Processo Civil (artigos 1º ao 12) e artigo 932, todos do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), passo a decidir monocraticamente.

Da remessa oficial tida por interposta.

Retomando o entendimento inicial, aplica-se ao caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica às sentenças ilíquidas.

Do mérito

Na petição inicial, busca o autor, nascido em 24.06.1976, o reconhecimento da especialidade dos intervalos de 16.04.1985 a 24.06.1989 e 19.08.1996 a 19.01.2018. Consequentemente, requer a concessão do benefício de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo (19.01.2018).

A controvérsia recursal cinge-se à insurgência do réu, ante ausência de recurso autor.

No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida.

Pode, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS. Neste sentido, confira-se a jurisprudência STJ, Resp 436661/SC, 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini, julg. 28.04.2004, DJ 02.08.2004, pág. 482.

Destarte, devem ser mantidos os termos da sentença que reconheceu a especialidade dos períodos de 16.04.1985 a 24.06.1989 e 19.08.1996 a 12.10.2016, laborado na ServGás Distribuidora de Gás S/A, nas funções de assistente administrativo e comercial e gerente de filial, por exposição a inflamáveis, conforme PPP encartado aos autos, tendo em vista que o autor exerceu suas atividades exposto a agentes nocivos explosivos, com risco à sua integridade física, nos termos do artigo 58 da Lei 8.213/1991.

Saliento que a periculosidade decorrente da exposição habitual e permanente a agentes inflamáveis não é passível de neutralização por nenhum equipamento de proteção individual, sobretudo por conta do risco de explosão. Ademais, cabe destacar que, em se tratando de atividades que tem o caráter de periculosidade, a caracterização em atividade especial independe da exposição do segurado durante toda a jornada de trabalho, pois que a mínima exposição oferece potencial risco de morte ao trabalhador, justificando o enquadramento especial.

Ressalte-se que os artigos 57 e 58 da Lei 8.213/91, que regem a matéria relativa ao reconhecimento de atividade exercida sob condições prejudiciais, não vinculam o ato concessório do benefício previdenciário à eventual pagamento de encargo tributário.

Somados os períodos especiais ora reconhecidos aos demais incontroversos, o autor totalizou 37 anos 6 meses e 11 dias de tempo de serviço até 19.01.2018, data do requerimento administrativo, conforme planilha da sentença, que ora se adota.

Cumpre observar que a Medida Provisória n. 676, de 17.06.2015 (D.O.U. de 18.06.2015), convertida na Lei n. 13.183, de 04.11.2015 (D.O.U. de 05.11.2015), inseriu o artigo 29-C na Lei n. 8.213/91 e criou hipótese de opção pela não incidência do fator previdenciário, denominada “regra 85/95”, quando, preenchidos os requisitos para a aposentadoria por tempo de contribuição, a soma da idade do segurado e de seu tempo de contribuição, incluídas as frações, for:

a) igual ou superior a 95 (noventa e cinco pontos), se homem, observando o tempo mínimo de contribuição de trinta e cinco anos;

b) igual ou superior a 85 (oitenta e cinco pontos), se mulher, observando o tempo mínimo de contribuição de trinta anos.

Ademais, as somas referidas no caput e incisos do artigo 29-C do Plano de Benefícios computarão “as frações em meses completos de tempo de contribuição e idade” (§ 1º), e serão acrescidas de um ponto ao término dos anos de 2018, 2020, 2022, 2024 e 2026, até atingir os citados 90/100 pontos.

Ressalve-se, ainda, que ao segurado que preencher o requisito necessário à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição sem a aplicação do fator previdenciário será assegurado o direito à opção com a aplicação da pontuação exigida na data do cumprimento do requisito, ainda que assim não o requeira, conforme disposto no artigo 29-C, § 4º, da Lei 8.213/1991.

Portanto, totalizando a parte autora 37 anos 6 meses e 11 dias de tempo de serviço até 19.01.2018, e contando com 59 anos de idade na data da DER, atinge 96 pontos, suficientes para a obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição sem a aplicação do fator previdenciário.

Mantido o termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo (19.01.2018), conforme entendimento jurisprudencial sedimentado nesse sentido.

A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência, observando-se as teses firmadas pelo E. STF no julgamento do RE 870.947, trânsito em julgado em março de 2020. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta de poupança a partir de 30.06.2009, devidos a contar da citação.

Tendo em vista o trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, com a apresentação de contrarrazões, nos termos do artigo 85, § 11, do Novo Código de Processo Civil de 2015, os honorários advocatícios, fixados pela sentença, deverão incidir sobre o valor das prestações vencidas até a data da presente decisão.

As autarquias são isentas das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei 9.289/96), devendo reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º, parágrafo único).

As parcelas em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença, compensados os valores recebidos a título de antecipação de tutela.

Diante do exposto, com fulcro no artigo 932 do CPC, nego provimento à remessa oficial tida por interposta e à apelação do réu.

Decorrido in albis o prazo recursal, retornem os autos à Vara de origem.

Intimem-se.

Apelação Cível 5008640-70.2018.4.03.6105

 

Deixe uma resposta

Iniciar conversa
Precisa de ajuda?
Olá, como posso ajudar