Ofende os princípios da isonomia e legalidade o sistema de cotas que dá prioridade aos estudantes inscritos residentes na região da instituição de ensino

Decidiu a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que é ilegítima a aplicação, pela Universidade Federal do Acre (UFAC), de bônus regional de 15% aos candidatos que tenham cursado ensino médio no Acre e nos municípios vizinhos do Estado. A sentença recorrida denegou a segurança a uma aluna que visava o recálculo de sua nota para obtenção de vaga no curso de medicina, e que não alcançou a pontuação necessária no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) devido à aplicação do bônus regional aos estudantes locais.

Ao relatar o processo, o desembargador federal Carlos Augusto Pires Brandão analisou que, para além do sistema de cotas étnicas e sociais destinado aos alunos de escola pública, instituído pela Lei 12.711/2012, a UFAC criou um critério de inclusão regional, aplicável às vagas destinadas à ampla concorrência.

Prosseguiu destacando que, a despeito da autonomia didático-científica das instituições de ensino superior (IES), prevista no art. 207 da Constituição Federal de 1988 (CF/88), e da legitimidade da adoção de critérios para ingresso no ensino superior, as normas dos editais de seleção devem observar os critérios de legalidade e razoabilidade, e harmonia com as leis reguladoras do tema.

Verificou o relator que o critério de inclusão regional extrapola o poder regulamentador da IES e afronta o acesso à educação, previsto nos art. 205. 206 e 208 da CF/88, além de afrontar o art. 19, III, da CF/88, que veda a criação de distinções entre brasileiros.

Concluiu o magistrado que, afastado o critério de inclusão estadual e considerando a nota obtida no Enem, a apelante encontra-se dentro das vagas ofertadas previstas na ampla concorrência e possui direito líquido e certo à matrícula pleiteada, devendo ser provida sua apelação, sem prejuízos aos demais alunos já matriculados na graduação, de forma a não ferir direitos adquiridos.

O recurso ficou assim ementado:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. MATRÍCULA. CRITÉRIO ESTADUAL. BONIFICAÇÃO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. ILEGALIDADE.

1. O sistema de cotas destinado aos alunos de escolas públicas visa a diminuir a exclusão e a desigualdade social, democratizando o acesso ao ensino superior. No caso presente, no entanto, a Universidade Federal, além da reserva de vagas para o sistema de cotas para alunos de baixa renda egressos de instituições públicas de ensino, fundamentada na Lei n. 12.711/2012, criou um critério de inclusão estadual, aplicável às vagas destinadas à ampla concorrência.

2. Embora se reconheça a autonomia didático-científica das Instituições de Ensino Superior, prevista no art. 207 da CF/1988, e a legitimidade da adoção de critérios para ingresso no ensino superior, tais regras devem observar os critérios da legalidade e da razoabilidade. A criação de um bônus de inclusão estadual contraria os princípios da igualdade e da isonomia no acesso à educação, maculando, ainda, o próprio princípio federativo. Conforme o art. 19, III, da CF, “É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios […] III – criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si”.

3. Honorários advocatícios incabíveis por força da Lei n. 12.016/2009.

4. Apelação provida.

Foi unânime o provimento à apelação, pelo colegiado.

Processo 1004357-61.2020.4.01.3000

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