A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve decisão que condenou a Interbroker Transportes e Logística Ltda. a indenizar por danos morais um motorista impedido de trabalhar enquanto cumpria aviso-prévio. Nesse período, ele disse que ficava sentado no depósito da empresa durante as seis horas de jornada, sem serviço e escutando chacotas de colegas devido à inatividade causada pela própria transportadora.
O trabalhador sentiu-se humilhado, pediu reparação pelos danos e quis obter da Justiça a declaração de nulidade do aviso-prévio para recebê-lo como indenização. Por outro lado, a Interbroker alegou que ele se recusava a realizar as entregas com o argumento de que não iria trabalhar durante o aviso, mesmo diante das ordens de seu superior. Segundo a defesa, a conduta representou descaso com o serviço.
O juízo da 4ª Vara do Trabalho de Bauru (SP) condenou a empresa a pagar indenização de mil reais. Conforme a sentença, a tese de que o motorista se negou a trabalhar é inconsistente porque a transportadora, apesar de não ter tido mais interesse em seus serviços, o obrigou a cumprir o aviso somente para ter mais tempo para pagar as verbas rescisórias. O juiz concluiu que houve abuso de direito e declarou a nulidade, determinando o pagamento do aviso-prévio indenizado.
A decisão foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas-SP), para quem a transportadora poderia até ter punido disciplinarmente o motorista caso ele se negasse a entregar as encomendas, mas, ao não determinar a realização dos serviços, expôs o empregado a situação vexatória.
TST
O relator do recurso da transportadora ao TST, ministro Cláudio Brandão, deu-lhe provimento para validar o aviso-prévio e afastar seu pagamento indenizado. De acordo com o relator, a atitude da empresa não foi suficiente para motivar a anulação, porque se cumpriu a finalidade do aviso – garantir ao trabalhador um período mínimo para ele buscar recolocação no mercado de trabalho, nos termos dos artigos 487 e 488 da CLT.
No entanto, Cláudio Brandão manteve a indenização por danos morais tendo em vista que a jurisprudência do TST proíbe este tipo de inatividade forçada. O ministro afirmou que exigir a presença do empregado durante o aviso-prévio sem cobrar a prestação dos serviços caracteriza “desprezo pela força de trabalho, uma das principais fontes de representação da dignidade de um indivíduo”.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA A PARTIR DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. AVISO-PRÉVIO. OBSERVÂNCIA DAS EXIGÊNCIAS NECESSÁRIAS PARA SUA VALIDADE. Agravo de instrumento a que se dá provimento para determinar o processamento do recurso de revista, em face de haver sido demonstrada possível afronta ao artigo 487, II, da CLT.
RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA A PARTIR DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 . AVISO-PRÉVIO. OBSERVÂNCIA DAS EXIGÊNCIAS NECESSÁRIAS PARA SUA VALIDADE. O instituto do aviso-prévio, previsto no artigo 487 da CLT, com as alterações promovidas pelo artigo 7º, XXI, da Constituição Federal e pela Lei nº 12.506/2011, consiste na comunicação realizada por um dos contratantes sobre o interesse no término, imotivado, da relação laboral – em regra, por tempo indeterminado – a fim de que a parte adversa possa, com o tempo que lhe foi concedido e ante as consequências advindas do rompimento do vínculo, realizar os ajustes necessários. Nas hipóteses de extinção do contrato pelo empregador, o aviso-prévio poderá ser concedido de forma trabalhada ou indenizada. No caso da primeira modalidade, em que o empregado permanece prestando seu labor, para que seja reconhecida a validade do aviso concedido, além do prazo proporcional ao tempo de serviço, deverá ser observada a exigência contida no artigo 488, caput e parágrafo único, da CLT, que se refere à redução da jornada de trabalho, sem prejuízo do salário integral. A não observância desse requisito ou de qualquer outra condição que desvirtue a finalidade precípua do instituto, qual seja, garantir ao trabalhador um período mínimo para que possa buscar a sua recolocação no mercado de trabalho, implica nulidade e o consequente reconhecimento do direito ao pagamento do período de forma indenizada (entendimento que se extrai da Súmula nº 230 desta Corte Superior). Por outro lado, constatado que a comunicação ocorreu com a antecedência necessária, que houve o cumprimento regular do prazo, bem como atendidas a demais exigências, não se há de falar em nulidade. No caso dos autos, o Tribunal Regional reconheceu a invalidade sob o argumento de que ” a reclamada deixou de conferir atividades ao autor durante o período de aviso prévio com o intuito de deixar fruir o prazo a fim de frustrar o recebimento da respectiva indenização “. Contudo, o procedimento adotado pela ré, por si só, não é suficiente para eivar de nulidade o prazo por ela conferido, pois, repita-se, tal circunstância somente será possível quando desrespeitado o escopo principal previsto pelo instituto – fato este que não se pode depreender dos elementos contidos no acórdão regional . Vale esclarecer que a ociosidade criada pela reclamada no prazo do aviso-prévio pode gerar outros direitos ao trabalhador, como por exemplo: 1) o deferimento de eventual indenização por danos morais; 2) ou, até mesmo, a equiparação de tal situação àquelas em que o aviso-prévio é considerado como cumprido em casa, para fins do deferimento da multa contida no artigo 477 da CLT, nos termos da Orientação Jurisprudencial nº 14 da SBDI-1 do TST. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.
HORAS EXTRAS. TRABALHO EXTERNO . CONTROLE INDIRETO DA JORNADA. A exceção prevista no artigo 62, I, da CLT não depende apenas do exercício de trabalho externo, mas também da impossibilidade de controle de horário pelo empregador. No caso, o acórdão regional registrou que no contrato de trabalho foi estabelecida a jornada a ser cumprida pelo autor, sem qualquer ressalva, bem como que havia o controle mediante o formulário preenchido pelos motoristas. Indubitável, portanto, que o empregador exercia o controle indireto sobre os horários cumpridos pelo empregado. Somente quando se revelar inteiramente impossível o controle, estará afastado o direito ao pagamento de horas extraordinárias, em razão da liberdade de dispor do seu próprio tempo, a exemplo do que ocorre, mesmo nesses casos, com o intervalo para refeição, cujo gozo é presumido, diante a autorização legal para dispensa do registro. Incólume o artigo 62, I, da CLT. Recurso de revista de que não se conhece.
RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. DANOS MORAIS CAUSADOS AO EMPREGADO. CARACTERIZAÇÃO. INATIVIDADE FORÇADA. A responsabilidade civil do empregador pela reparação decorrente de danos morais causados ao empregado pressupõe a existência de três requisitos, quais sejam: a conduta (culposa, em regra), o dano propriamente dito (violação aos atributos da personalidade) e o nexo causal entre esses dois elementos. O primeiro é a ação ou omissão de alguém que produz consequências às quais o sistema jurídico reconhece relevância. É certo que esse agir de modo consciente é ainda caracterizado por ser contrário ao Direito, daí falar-se que, em princípio, a responsabilidade exige a presença da conduta culposa do agente, o que significa ação inicialmente de forma ilícita e que se distancia dos padrões socialmente adequados, muito embora possa haver o dever de ressarcimento dos danos, mesmo nos casos de conduta lícita. O segundo elemento é o dano que, nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho, consiste na “[…] subtração ou diminuição de um bem jurídico, qualquer que seja a sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial, quer se trate de um bem integrante da própria personalidade da vítima, como a sua honra, a imagem, a liberdade etc. Em suma, dano é lesão de um bem jurídico, tanto patrimonial como moral, vindo daí a conhecida divisão do dano em patrimonial e moral”. Finalmente, o último elemento é o nexo causal, a consequência que se afirma existir e a causa que a provocou; é o encadeamento dos acontecimentos derivados da ação humana e os efeitos por ela gerados. No caso, o TRT reconheceu que ” o fato de a reclamada deixar o autor comparecer ao trabalho para cumprir o aviso prévio sem lhe exigir a prestação de serviços, caracteriza uma conduta abusiva ao se considerar que o autor se viu totalmente exposto a situação vexatória diante dos colegas, fato este comprovado pela testemunha do autor que afirmou ‘ que os colegas de trabalho tiravam sarro do reclamante pelo fato de estar parado durante o aviso prévio’ “. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior , é vedada tal prática adotada pelo empregador, denominada ociosidade ou inatividade forçada, uma vez que o desprezo pela força de trabalho, uma das principais fontes de representação de dignidade de um indivíduo, gera a este, por óbvio, situação de extremo constrangimento e humilhação no ambiente da empresa, com repercussão, inclusive, em sua autoestima. Precedentes. Evidenciado o dano, assim como a conduta culposa do empregador e o nexo causal entre ambos, deve ser mantido o acórdão regional que condenou a reclamada a indenizá-lo. Recurso de revista de que não se conhece.
A decisão foi unânime.
Processo: RR-1246-90.2012.5.15.0091