A 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a sentença que garantiu a uma candidata o direito de tomar posse e entrar em exercício no cargo de Especialista em Regulação e Vigilância Sanitária, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A autora afirmou que se submeteu ao concurso público e foi aprovada, pediu licença sem vencimentos do local da qual já era servidora pública, e foi impedida de tomar posse na Anvisa sob o argumento de haver incompatibilidade de acúmulo dos dois cargos públicos, conforme a Lei 8.112/90.
De acordo com os autos, a candidata nomeada ocupava cargo na Fundação Ezequiel Dias, no município de Belo Horizonte/MG. Após a nomeação na Anvisa, a impetrante solicitou licença sem vencimentos para tratar de interesses particulares pelo prazo de dois anos. Como não conseguiu ser empossada na Anvisa, buscou a Justiça, obtendo êxito na demanda pretendida.
Porém, o processo chegou ao TRF1 por meio de remessa oficial, instituto do Código de Processo Civil (artigo 496), também conhecido como reexame necessário ou duplo grau obrigatório, exige que o juiz encaminhe o processo ao tribunal, havendo ou não apelação das partes, sempre que a sentença for contrária a algum ente público.
Fato consumado – Ao analisar o caso, o relator, juiz federal convocado Marcelo Albernaz, observou que a sentença se baseou em julgado anterior do próprio Juízo e em jurisprudência do TRF1 e argumentou que: “não existindo remuneração de um dos cargos públicos por força de licença para tratar de interesses particulares, não existe desrespeito à norma constitucional”.
Porém, o magistrado explicou que, de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), não é possível a acumulação de cargos públicos quando o servidor está licenciado de um dos cargos para tratar de interesses particulares e sem remuneração.
No entanto, “a impetrante informou já ter sido exonerada a pedido do cargo originariamente ocupado junto à Fundação Ezequiel Dias (Funed), não mais subsistindo a acumulação indevida de cargos públicos. Logo, a situação foi regularizada, devendo-se manter a sentença por outros fundamentos (fato consumado)”, afirmou o magistrado. Para ele, também “resta afastada a má-fé da impetrante diante do princípio da confiança legítima.” Assim, julgou que se deve assegurar a ela o exercício da opção prevista no art. 133 da Lei n. 8.112/90.
O recurso ficou assim ementado:
CONCURSO PÚBLICO.POSSE EM CARGO PÚBLICO. CANDIDATO QUE JÁ OCUPA CARGO DIVERSO. LICENÇA PARA TRATAR DE INTERESSES PARTICULARES. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. VEDAÇÃO. JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. REGULARIZAÇÃO DA SITUAÇÃO.
1. Trata-se de remessa necessária de sentença, proferida em mandado de segurança versando sobre direito a posse em cargo público, na qual a segurança foi deferida para confirmar liminar no sentido de “determinar à autoridade coatora que se abstenha de impedir a posse da impetrante em razão dos cargos acumulados”.
2. São fundamentos da sentença: a) “a impetrante ocupa o cargo de Analista e Pesquisador de Saúde e Tecnologia na Fundação Ezequiel Dias, Estado de Minas Gerais, desde 2007, e obteve licença para tratar de interesses particulares pelo prazo de dois anos. Posteriormente, obteve êxito no concurso público realizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA no cargo efetivo de Especialista em Regulação e Vigilância Sanitária, Classe ‘A’, Padrão I, pretendendo, assim, seja determinada a sua posse”; b) “como a impetrante comprova estar em gozo de licença sem vencimentos legalmente prevista e concedida, desaparece o óbice constitucional, uma vez que fica afastada a percepção de remuneração e, portanto, excluído o fato que enseja a proibição”.
3. “A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido da impossibilidade de acumulação de cargos, mesmo que o servidor esteja licenciado de um deles para tratar de interesses particulares, sem recebimento de vencimentos” (RE 129.6557 AgR, relator Ministro Dias Toffoli, 1T, DJe-096 20/05/2021). Igualmente: RE 180.597, relator Ministro Ilmar Galvão, 1T, DJ 27/02/1998, p. 621. Na mesma linha de entendimento, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:AgInt nos EDcl no REsp 1.975.290/RS, relator Ministro Herman Benjamin, 2T, DJe de 29/6/2022; REsp 1.742.926/MS, relator Ministro Sérgio Kukina, 1T, DJe 16/05/2019; RMS 57.573/BA, relator Ministro Mauro Campbell Marques, 2T, DJe 20/08/2018.
4. No entanto, tendo havido posse em segundo cargo público inacumulável com base em decisão judicial, resta afastada a má-fé da impetrante diante do princípio da confiança legítima. Nesse cenário, atendendo à diretriz do art. 21, parágrafo único, da LINDB, deve-se assegurar a ela o exercício da opção prevista no art. 133 da Lei n. 8.112/90.
5. Ocorre que a impetrante informou já ter sido exonerada a pedido do cargo originariamente ocupado junto à Fundação Ezequiel Dias – FUNED (id 2295806), não mais subsistindo a acumulação indevida de cargos públicos. Logo, a situação foi regularizada, devendo-se manter a sentença por outros fundamentos (fato consumado).
6. Remessa necessária não provida.
O Colegiado acompanhou o voto do relator.
Processo: 1001142-17.2015.4.01.3400