Para a 3ª Turma, o enquadramento de atividades como insalubres não pode ser flexibilizado
Uma servente de limpeza de Florianópolis (SC) deverá receber adicional de insalubridade em grau máximo (40%), apesar de a convenção coletiva da categoria prever o pagamento da parcela em grau médio (20%). Ao rejeitar o recurso da empresa, a Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho observou que enquadramento das atividades tipificadas como insalubres é matéria de ordem pública e não pode ser objeto de negociação coletiva.
Limpeza de banheiros
A servente alegou que, desde a sua contratação, em março de 2015, sempre havia trabalhado na limpeza de banheiros, na manutenção e no recolhimento de lixo em locais com grande fluxo de pessoas. Entre eles, citou a Câmara de Vereadores de Florianópolis e o Centro de Hemoterapia e Hemoterapia de Santa Catarina (Hemosc), responsável pela captação de doações voluntárias de sangue, onde, segundo ela, limpava áreas de laboratório e retirava lixo hospitalar.
Após ser demitida sem justa causa, em 2018, ela procurou a Justiça do Trabalho e reivindicou o pagamento do adicional de 40% durante todo o período da contratação. Justificou, para isso, que estava permanentemente em contato com agentes biológicos e produtos químicos nocivos à saúde humana.
Convenção coletiva
Na defesa, a empresa salientou que o adicional previsto na Convenção Coletiva de Trabalho da categoria era de 20% (grau médio).
Grau máximo
O juízo da 1ª Vara de Florianópolis negou o pedido, por considerar que as atividades não se enquadram na Norma Regulamentadora (NR) 15 do Ministério do Trabalho, que trata das atividades e operações insalubres. Mas o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região reconheceu o direito à parcela em grau máximo, com base em laudo técnico e na jurisprudência da Justiça do Trabalho.
Segundo o TRT, a Súmula 448 do TST pacificou o entendimento de que a limpeza e a coleta de lixo de sanitários em locais de grande circulação de pessoas devem ser enquadradas como atividade insalubre em grau máximo.
Direitos que não podem ser flexibilizados
O relator do recurso de revista da empresa, ministro Alberto Balazeiro, lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a validade de normas coletivas, ainda que limitem ou afastem direitos, “desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis” (Tema 1046 da repercussão geral).
Para o ministro do TST, o conceito de direitos absolutamente indisponíveis envolve a garantia de um patamar civilizatório mínimo, diretamente ligado à dignidade da pessoa humana e ao conceito de trabalho decente. “Embora a CLT assegure a prevalência do negociado sobre o legislado, o enquadramento das atividades tipificadas como insalubres deve sempre ter em vista o princípio da dignidade da pessoa humana em conjunto com a necessidade de garantir segurança, higidez e saúde do empregado”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO DE REVISTA. LEIS NºS 13.015/2014 E 13.467/2017 . RITO SUMARÍSSIMO. SERVENTE. DIFERENÇAS DE ADICIONAL DE INSALUBRIDADE . PAGAMENTO DO ADICIONAL EM GRAU MÁXIMO. SÚMULA 448, II, DO TST. PREVISÃO EM NORMA COLETIVA DE PAGAMENTO EM GRAU MÉDIO. ANÁLISE DOS ARTS. 611-A, XII E 611-B, XVII E XVIII, DA CLT. TEMA 1.046 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA
1. A controvérsia diz respeito à possibilidade de enquadramento das atribuições da reclamante na atividade tipificada como insalubre em grau máximo (40%), nos termos do anexo 14 da NR 15 e da Súmula 448/TST, tendo em vista a previsão normativa de que a composição salarial da reclamante está acrescida de adicional de insalubridade em grau médio (20%).
2. A jurisprudência desta Corte pacificou o entendimento de que a limpeza e coleta de lixo de sanitários, em locais de grande circulação de pessoas, devem ser enquadradas como atividade insalubre (em grau máximo), nos termos da Súmula 448, II, do TST.
3. O STF no julgamento do ARE 1121633 (Tema 1046 da Tabela de Repercussão Geral) fixou a tese jurídica de que “São constitucionais os acordos e convenções coletiva que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis” , excepcionando, portanto, os direitos absolutamente indisponíveis . Assim, a regra geral é de validade das normas coletivas, ainda que pactuem limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas.
4. Infere-se do conceito de direitos absolutamente indisponíveis , a garantia de um patamar civilizatório mínimo, diretamente ligado à dignidade da pessoa humana e ao conceito de trabalho decente, e que, portanto, não podem ser flexibilizados.
5. Assim, muito embora a CLT assegure a prevalência do negociado sobre o legislado, o enquadramento das atividades tipificadas como insalubres deve sempre ter em vista o princípio da dignidade da pessoa humana em conjunto com a necessidade de garantir segurança, higidez e saúde do empregado (arts. 611-A, XII e 611-B, XVII e XVIII, da CLT), constituindo, portanto, matéria de ordem pública, nos termos do art. 7º, XXIII, da Constituição da República, insuscetível de negociação coletiva.
6. Logo, a existência de norma infraconstitucional que expressamente veda a redução do adicional de insalubridade (art. 611-B, XVII e XVIII, da CLT), ao fundamento de que são normas de saúde, higiene e segurança do trabalho, coaduna-se e faz incidir a exceção prevista no Tema 1046 da Tabela de Repercussão Geral do STF, por tratar-se de direito absolutamente indisponível.
Recurso de revista de que não se conhece.
A decisão foi unânime.
Processo: RR-401-40.2020.5.12.0001