Prova de concurso com questões já existentes previamente na internet não caracteriza ato de improbidade administrativa

Prova de concurso com questões não inéditas que constavam na internet e em apostilas que poderiam ser consultadas previamente não configura ato de improbidade administrativa. Foi o que decidiu a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) ao julgar a apelação da sentença que negou o pedido de condenação do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas (Ifam), dos membros da banca examinadora do concurso para o cargo de professor de química e do presidente da Comissão Permanente de Exames do instituto.

Em seu recurso, o Ministério Público Federal (MPF) argumentou que ocorreu a inserção de questões não inéditas nas provas de informática básica e de conhecimentos específicos, acessíveis previamente pela internet e em apostilas, e que os apelados quebraram o dever de sigilo de forma deliberada. O MPF ainda sustentou que a anulação causará prejuízo ao erário, configurando ato de improbidade previsto nos art. 10 e 11 da Lei de Improbidade Administrativa (LIA, Lei 8.429/1992 alterada pela Lei 14.230/21) e atraindo a punição do art. 12 da lei.

Na relatoria do processo, o juiz federal convocado pelo TRF1 Antônio Oswaldo Scarpa entendeu que não cabe a condenação dos acusados. Ele explicou que a responsabilização do agente público e eventualmente do cidadão comum por improbidade administrativa passa pela análise do dolo (intenção) ou da má-fé para possibilitar a punição.

Ausência de culpabilidade – “É necessário que a conduta do agente seja direcionada (dolosa) à finalidade de enriquecer ilicitamente (art. 9º, LIA), causar prejuízo ao erário (art. 10, LIA) ou atentar contra princípios administrativos (art. 11, LIA)”, prosseguiu o relator, destacando que não foi comprovada a atuação dolosa ou a má-fé dos apelados.

Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do TRF1, não se pode converter uma falha administrativa em ato de improbidade administrativa quando não provada a culpabilidade, uma vez que a ação de improbidade visa punir apenas o agente público corrupto e desonesto, concluiu o magistrado, votando no sentido de manter a sentença que concluiu pela inexistência do ato de improbidade por parte dos apelados.

O recurso ficou assim ementado:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. IRREGULARIDADES NA ELABORAÇÃO DA PROVA DO CONCURSO PARA PROFESSOR DO IFAM. QUESTÕES NÃO INÉDITAS, COM POSSIBILIDADE DE ACESSO PRÉVIO. AUSÊNCIA DE DOLO OU MÁ-FÉ. IRREGULARIDADE QUE NÃO SE CARACTERIZA COMO ATO DE IMPROBIDADE TIPIFICADO EM LEI. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. Apelação interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença que, em ação por ato de improbidade administrativa ajuizada em desfavor de servidores públicos e do IFAM (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas), julgou improcedente o pedido de condenação dos réus nas penas do artigo 12, II, da Lei 8.429/92, pelas supostas irregularidades ocorridas no concurso promovido pelo IFAM (Edital 008/2009).

2. Os atos de improbidade administrativa previstos em lei (Lei 8429/92, com as alterações da Lei 14.230/21) podem ser de três espécies: os que importam em enriquecimento ilícito, os que causam lesão ao erário e os que atentam contra os princípios da administração pública.

3. A improbidade administrativa importa na responsabilização de agente público (e eventualmente um terceiro) por matriz normativa de sede constitucional (art. 37, § 4º, da CF) e concretização legislativa (Lei 8.429/92 e Lei 14.230/21), com conteúdo sancionatório em que impera a análise da culpabilidade, do elemento subjetivo da conduta para possibilitar a punição.

4. Embora, ao inserir, na prova do concurso, questões constantes de sites que poderiam ser previamente acessados pelos candidatos, os apelados não tenham agido com o devido zelo para com a função que lhes foi atribuída, não restou demonstrada a má fé, necessária à caracterização do ato ímprobo.

5. Não é possível converter, automaticamente, qualquer falha administrativa em ato de improbidade administrativa, uma vez que a ação de improbidade visa punir apenas o agente público corrupto e desonesto. Precedentes: REO 1011242-24.2017.4.01.3800, Rel. Desembargador Federal Ney Bello, Terceira Turma, PJe 23/04/2020; AC 0004274-14.2006.4.01.3304, Rel. Desembargador Hilton Queiroz, Terceira Turma, e-DJF1 21/06/2019.

6. Apelação do Ministério Público Federal a que se nega provimento.

A decisão do Colegiado foi unânime nos termos do voto do relator.

 

Processo: 0009301-57.2010.4.01.3200

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