Paciente teve negado atendimento de emergência; ele e a esposa receberão R$ 40 mil por danos morais
O segurado, vítima de uma tentativa de homicídio com arma de fogo, teve negado pedido de internação devido ao prazo de carência
O Bradesco Saúde S.A. deverá indenizar um segurado e sua esposa em R$ 40 mil por danos morais, por ter negado a ele atendimento de urgência. A decisão é da 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que modificou parcialmente sentença da Comarca de Juiz de Fora, região da Zona da Mata mineira.
O casal narrou nos autos que firmou com o plano um seguro de reembolso saúde, com início a partir das 24h do dia 2 de maio de 2013. Em 25 de outubro do mesmo ano, o homem deu entrada no Hospital Albert Sabin com ferimentos de arma de fogo, após uma tentativa de homicídio.
De acordo com o casal, após os primeiros atendimentos, diante da necessidade de internação, o seguro de saúde foi acionado. Entretanto, a cobertura foi negada, sob a justificativa de existência de carência. O homem precisou ser transferido para outra instituição hospitalar, o HPS.
Na Justiça, os autores da ação pediram que tanto o hospital quanto a seguradora fossem condenados a indenizá-los pelos danos morais, por terem submetido o paciente ao risco de morrer.
Os autores da ação declararam ainda que a negativa de atendimento diminuiu as chances de o paciente obter um melhor resultado estético com a cirurgia. Assim, pediram também que os réus arcassem com a cirurgia plástica reparadora.
Defesa dos réus
Em sua defesa, o plano de saúde afirmou que o casal não tinha prova de que a seguradora negou o atendimento e que não cabia a sua condenação por eventual erro médico do hospital que atendeu o segurado.
O plano de saúde sustentou ainda que sua responsabilidade era apenas reembolsar as despesas médicas, e que qualquer cirurgia acarreta cicatriz, não podendo o plano ser condenado a arcar com cirurgia reparadora.
Entre outros pontos, o Bradesco Saúde declarou também não poder ser condenado a arcar com indenização decorrente de uma má interpretação das cláusulas do contrato, e que não ocasionou qualquer sofrimento aos autores que justificasse os danos morais.
O hospital, por sua vez, afirmou que o paciente, ao chegar lá, foi recebido por sua equipe médica, que providenciou os primeiros socorros necessários e o acompanhamento devido. Afirmou ainda que a transferência para o HPS ocorreu em consenso com a esposa da vítima.
Em primeira instância, a 8ª Vara Cível de Juiz de Fora condenou o plano de saúde a pagar R$ 5 mil por danos morais a cada um dos autores da ação. O pedido de dano moral em relação ao hospital foi julgado improcedente, bem como o pedido de pagamento, por parte os réus, de cirurgia reparadora.
Diante da sentença, o Bradesco Saúde e os autores da ação recorreram, reiterando suas alegações e pedindo a modificação do valor dano moral fixado – o casal, para que fosse aumentado; a seguradora, para que fosse diminuída a indenização, se mantida a condenação.
Indicação de urgência
Ao analisar os autos, o relator, desembargador Marcos Henrique Caldeira Brant, observou que a cirurgia a que o paciente precisou se submeter tinha caráter de urgência/emergência.
Por esse motivo, indicou, “não se mostrava necessário o cumprimento do prazo de carência”, senão aquele estipulado em cláusula do contrato, ou seja, 24 horas. Assim, para o magistrado, a recusa de cobertura pela seguradora ensejava indenização por dano moral.
O relator não verificou, contudo, a responsabilidade do Hospital Albert Sabin pelo ocorrido. Julgou também que não cabia aos réus custearem cirurgia estética de reparação, por não ser possível aferir se o dano estético estava associado ao ferimento com a arma de fogo ou à má prestação de serviço.
Quanto ao valor da indenização por dano moral a ser paga pela seguradora, o relator observou que deveria ser levada em conta a gravidade da lesão, o caráter punitivo da medida, a condição social e econômica do lesado, bem como a repercussão do dano, além do necessário efeito pedagógico da condenação.
Tendo em vista esses diversos aspectos, julgou necessário aumentar a indenização para R$ 20 mil para cada um dos autores, mantendo a sentença, no restante.
Em seu voto, foi seguido pelos desembargadores Otávio de Abreu Portes e Pedro Aleixo.
O recurso ficou assim ementado:
APELAÇÕES CÍVEIS – SEGURO SAÚDE – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS -INTERNAÇÃO HOSPITALAR E PROCEDIMENTO CIRÚRGICO – NEGATIVA DE COBERTURA- CARÊNCIA.AUSÊNCIA – FERIMENTO ABDOMINAL CAUSADO POR ARMA DE FOGO – SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA E URGÊNCIA CONFIGURADA – TRANSFERÊNCIA PARA OUTRO NOSOCOMIO – NEGATIVA DE ATENDIMENTO PELO HOSPITAL CONVENIADO – ATO ILÍCITO – AUSÊNCIA – INDENIZAÇÃO DEVIDA PELA SEGURADORA -MAJORAÇÃO – POSSIBILIDADE – CIRURGIA REPARADORA – IMPROCEDÊNCIA MANTIDA.Os contratos de plano de saúde estão abrangidos pelo Código de Defesa do Consumidor, consoante disposição do seu art. 3º, § 2º; art. 35 da Lei n.º 9.656/98 e súmula 469 do STJ.Incontroverso nos autos que o primeiro autor deu entrada no hospital com urgência e indicação de procedimento cirúrgico, em face de ferimento causado por arma de fogo.Não obstante a urgência do procedimento, o autor foi surpreendido com a negativa de cobertura do seguro Réu, sob a justificativa de carência, tendo sido transferido para outro hospital conveniado do SUS, onde foi internado para a realização de cirurgia.Os documentos juntados aos autos atestam que a internação do autor se deu em virtude de situação de urgência,cuja carência é de vinte e quatro horas, restando afastada tal hipótese como justificativa para a negativa de cobertura.O Réu segurador do plano de saúde não produziu provas robustas, hábeis a rechaçar a tese dos autores.O hospital não pode ser responsabilizado por qualquer ato ilícito, tão somente pela transferência do primeiro autor para outro hospital, quando não restou comprovada a sua recusa em interna-lo, nem mesmo de forma particular.Por conseguinte, apenas a seguradora do plano de saúde deve ser condenada a indenizar os autores pelos danos morais por eles sofridos.Em situações em que a parte necessita de tratamento de urgência, cujo quadro clínico implicaria em risco de vida ou de lesões irreparáveis, presumido esta o dano moral, pois verificam-se “in re ipsa”, ou seja, decorre da força dos próprios fatos, pouco importando inexista prova nos autos quanto ao efetivo prejuízo sofrido pela vítima em face do evento danoso.Levando em consideração as questões fáticas da presente ação, a extensão do prejuízo, bem como a quantificação da conduta ilícita e capacidade econômica do ofensor, a indenização deve ser majorada.Inexistentes elementos nos autos para a configuração de dano estético capaz de responsabilizar os Réus pela cicatriz decorrente de ferimento causado por terceiros, ao primeiro autor, não há que se falar em custeio de cirurgia reparadora.
Leia a íntegra da decisão e a movimentação processual.
PROCESSO 0161043-37.2015.8.13.0145