Para a 2ª Turma, a manutenção do sigilo do inquérito não foi abusiva.
A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho cassou decisão em que o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região havia determinado ao Ministério Público do Trabalho (MPT) que informasse o nome do empregado que apresentou representação contra a Alarm Control Equipamentos Eletrônicos para Segurança Ltda., de São Paulo (SP), por supostas irregularidades trabalhistas. Para a Turma, a manutenção pelo MPT do sigilo dos dados do inquérito, entre eles a identidade do denunciante, não foi abusiva nem violou direito líquido e certo da empresa.
Acesso negado
Em janeiro de 2011, a empresa foi denunciada no MPT por práticas como assédio moral e atitudes discriminatórias. A denúncia, no entanto, foi arquivada em razão da escassez de elementos e do não comparecimento do denunciante para prestar informações. Após o arquivamento, de acordo com o MPT, a empresa requereu acesso aos dados pessoais do denunciante e à denúncia formalizada. O pedido foi negado pelo procurador responsável pelo caso.
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Em mandado de segurança, a Alarm disse estar irresignada com fato de não saber quem havia feito a denúncia. Afirmou que está no mercado há mais de 20 anos e que sempre cumpriu as leis trabalhistas e observou sua função social. Para a empresa, a forma como foi solicitada a se manifestar no MPT, “e, pior, sem saber quem são seus acusadores”, teria causado prejuízo a sua imagem e desestabilizado o bom convívio entre os colaboradores e seus sócios.
Apenas ilação
O juízo de primeiro grau concedeu a segurança para que o MPT desse à empresa acesso aos nomes do denunciante, e a sentença foi mantida na íntegra pelo Tribunal Regional. Na interpretação do TRT, a possibilidade de que o fornecimento dos dados desencadeasse perseguição ou assédio moral é apenas ilação, e não questão concreta. Ainda de acordo com o Tribunal Regional, apesar da regra da hipossuficiência do trabalhador, “o empregador tem o direito de se resguardar de alegações vazias que possam afetar a sua credibilidade e lhe gerar danos”.
Dever de agir
Para o ministro José Roberto Freire Pimenta, relator do recurso de revista do MPT, o ato do procurador de resguardar, no curso do inquérito, a identidade do denunciante está plenamente justificada e respaldada pelo ordenamento jurídico. Ele explicou que, diante da denúncia de irregularidades trabalhistas (que pode até ser anônima, desde que acompanhada de elementos suficientes para a instauração do procedimento investigatório), o MPT tem o dever de agir de forma independente. Segundo o relator, o inquérito civil é um procedimento administrativo, de natureza inquisitiva e informativa, para formar a convicção do órgão a respeito dos fatos. “Devido ao caráter meramente instrutório, não se admite contraditório, por não produzir prova absoluta, mas apenas valor probante relativo”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL
Deixa-se de analisar a preliminar de nulidade por negativa de prestação jurisdicional, nos termos do artigo 249, § 2º, do CPC/73 (artigo 282, § 2º, do CPC/2015), por verificar, no mérito, possível decisão favorável ao recorrente.
MANDADO DE SEGURANÇA. DENÚNCIA QUE ORIGINOU DIVERSAS REPRESENTAÇÕES CONTRA A EMPRESA IMPETRANTE. SIGILO DO DENUNCIANTE NO CURSO DO PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO. INOCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO A DIREITO LÍQUIDO E CERTO DO IMPETRANTE.
Cinge-se a controvérsia em se verificar a existência de violação a direito líquido e certo do impetrante, que teve negado o pedido de obtenção de dados da pessoa que fez a denúncia que ensejou a instauração de procedimentos administrativos no âmbito do Ministério Público do Trabalho. Destaca-se, inicialmente, que a Constituição Federal, no seu inciso III do artigo 129, legitimou o Ministério Público do Trabalho para promover o inquérito civil, in verbis: “III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”. Por sua vez, a Lei Complementar nº 75/93 trouxe, em seu artigo 83, inciso III, uma das maneiras de exercer a referida proteção, qual seja a ação civil pública. Assim, a Constituição da República estabeleceu a importante proteção, e a lei veio trazer os meios necessários para exercitá-la. Registre-se que se trata o inquérito civil de procedimento administrativo, de natureza inquisitiva e informativa, destinado à formação da convicção do Ministério Público a respeito de fatos determinados, com vistas à propositura, ou não, de ações civis públicas ou à celebração de termo de ajustamento de conduta. Portanto, em face de seu caráter meramente instrutório, não se admite contraditório, por não produzir prova absoluta, mas apenas valor probante relativo. Com efeito, diante de denúncia de irregularidades trabalhistas, que pode ser até anônima, desde que acompanhada de elementos suficientes para a instauração do procedimento investigatório, o Ministério Público do Trabalho tem o dever de agir, de forma independente. Nesse cenário, no caso em apreço, não se verifica a presença dos requisitos ensejadores da concessão da medida mandamental, pois a decisão do Ministério Público de manter sob sigilo dados do inquérito civil, incluindo a identidade do denunciante, não foi abusiva ou violadora de direito líquido e certo, mas, sim, encontra-se plenamente justificada e respaldada pelo ordenamento jurídico. Nesse contexto, o ato do representante do Ministério Público do Trabalho de resguardar, no curso do inquérito civil público, a identidade do denunciante não importou em violação do artigo 5º, inciso IV, da Constituição Federal, não havendo falar em afronta a direito líquido e certo da empresa impetrante.
Recurso de revista conhecido e provido.
A decisão foi unânime.
Processo: RR-1747-80.2012.5.02.0002