A 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal manteve decisão que condenou a Gol Linhas Aéreas S/A ao pagamento de indenização à cliente em razão de extravio de bagagem. A sentença fixou o valor R$ 12 mil, a título de danos materiais, e R$ 5 mil para reparação moral.
De acordo com o processo, uma mulher estava no aeroporto de Salvador/BA para retornar a Brasília/DF. Lá, foi informada, pela funcionária da ré, que sua bagagem de mão deveria ser despachada, contra a vontade da passageira. Ao chegar no destino, tomou conhecimento de que a sua mala, que estava aos cuidados da empresa aérea, foi extraviada.
Em sua defesa, a ré argumenta que os danos materiais não podem ser presumidos e que a mulher deve comprovar o que efetivamente tinha na bagagem. Também informou que “a parte autora não comprovou ter, efetivamente, suportado qualquer prejuízo de ordem patrimonial decorrente da conduta da ré”.
Na decisão, o Colegiado explicou que é de responsabilidade da empresa transportadora a exigência de declaração do valor da bagagem. Caso não o faça, diante da verossimilhança das alegações da autora, será considerado verdadeiro o rol de pertences mencionados pelo passageiro, considerando a compatibilidade com o que ordinariamente é embarcado. Finalmente, decidiu que “na espécie, inafastáveis os maus sentimentos gerados pela situação sob exame, restando clarividente a violação dos direitos de personalidade da autora/recorrida hábil a compor indenização por dano moral”.
O recurso ficou assim ementado:
JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. DIREITO CIVIL. TRANSPORTE AÉREO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. BAGAGEM. EXTRAVIO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MATERIAL. CONFIGURAÇÃO. DANO MORAL. CABIMENTO. QUANTUM. MANUTENÇÃO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. Acórdão lavrado de acordo com a disposição inserta nos artigos 2º e 46, da Lei 9.099, de 26.09.1995 e artigo 60, §§ 1º e 2º, do Regimento Interno das Turmas Recursais. Presentes os pressupostos específicos, conheço do recurso.
2. Cuida-se de recurso inominado interposto pela ré contra a sentença que julgou procedentes os pedidos iniciais, condenando-a ao pagamento de R$ 12.000,00, a título de danos materiais, e R$ 5.000,00, por danos morais, em virtude de falha na prestação do serviço de transporte aéreo, consistente no extravio permanente de bagagem.
3. A relação jurídica estabelecida entre as partes é de natureza consumerista, devendo a controvérsia ser solucionada sob a ótica do sistema jurídico autônomo instituído pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei n.8.078/1990).
4. À luz do Código de Defesa do Consumidor (artigos 14 e 20) e do Código Civil (art. 734), o transportador é objetivamente responsável pelos danos causados ao passageiro ou sua bagagem, em razão do risco de sua atividade, da qual aufere lucro – teoria do risco do negócio.
5. Com efeito, a empresa aérea obriga-se, mediante pagamento, a efetuar o transporte do passageiro e dos seus pertences, de forma indene, até o local de destino. Nesse ínterim, gera ao transportador o dever de resultado, qual seja, reiterando-se, transportar com segurança tanto o passageiro como seus pertences. Outrossim, ao entregar a sua bagagem para a empresa aérea, o passageiro confia no dever de guarda, gerando a legítima expectativa de administração e cuidados necessários, em consonância com a prescrição legal (art. 749, do Código Civil), confira-se: “O transportador conduzirá a coisa ao seu destino, tomando todas as cautelas necessárias para mantê-las em bom estado e entregá-la no prazo ajustado ou previsto”.
6. No caso, incontroverso o extravio permanente de bagagem pertencente à autora/recorrida e transportada pela ré/recorrente em voo nacional, conforme, inclusive, documentação anexada (ID 45215671, 45215672 e 45215673), saltando à evidência a falha na prestação do serviço.
7. Consoante jurisprudência desta Corte Distrital, é ônus da transportadora exigir a declaração do valor da bagagem, o que serviria para limitar eventual valor de indenização. Não o fazendo, e diante da verossimilhança das alegações da passageira, aplica-se a teoria da redução do módulo da prova, em que se presume verdadeiro o rol dos pertences apresentado pelo consumidor, se compatível com o que ordinariamente é embarcado (Acórdão n.1113001, 07063423920188070016, Relator: Asiel Henrique de Sousa, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Julgamento: 31/07/2018). Ademais, na hipótese, os bens listados como constantes da bagagem extraviada, tanto no formulário de inventário da bagagem quanto na petição inicial, são compatíveis com as fotos da mala aberta (ID 45215672 – p. 4), assim como os preços relativos aos itens são razoáveis, notadamente considerando a pesquisa de valores de ID 45215674, fazendo exsurgir o dever de indenizar, nos exatos termos da sentença.
8. Na espécie, inafastáveis os maus sentimentos gerados pela situação sob exame, restando clarividente a violação dos direitos de personalidade da autora/recorrida hábil a compor indenização por dano moral. Decerto, o rasgo da confiabilidade da fruição idônea do serviço contratado, in casu, extrapola o mero dissabor cotidiano tolerável e impõe o dever de indenização.
9. A fixação do valor a título de dano moral deve levar em conta critérios doutrinários e jurisprudenciais, tais como o efeito pedagógico e inibitório para o ofensor e a vedação ao enriquecimento sem causa do ofendido ou empobrecimento do ofensor. Ainda, a indenização deve ser proporcional à lesão à honra, à moral ou à dignidade do ofendido, às circunstâncias que envolvem o fato, às condições pessoais e econômicas dos envolvidos, e à gravidade objetiva do dano moral. Logo, sob tais critérios, entendo adequado o valor fixado na origem.
10. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. Sentença mantida pelos seus próprios fundamentos.
11. Condeno a parte recorrente ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação, na forma do art. 55, da Lei 9.099/95.
A decisão da Turma Recursal foi unânime.
Acesse o PJe2 e confira o processo: 0739931-80.2022.8.07.0016