Eletricista que sofreu queimaduras no corpo vai ser indenizado por danos a projeto de vida

Os graves danos comprometeram a vida pessoal e profissional do empregado.

A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho fixou em R$ 240 mil a indenização a ser paga pela Nova Palma Energia Ltda., do Rio Grande do Sul, a um eletricista que teve o corpo gravemente queimado em decorrência de choque elétrico. Segundo a Turma, o valor arbitrado nas instâncias anteriores, de R$ 120 mil, era desproporcional ao dano sofrido pelo empregado, que teve 70% do corpo atingido pelas queimaduras.

Acidente

Na reclamação trabalhista, o eletricista disse que, em 2010, sofreu queimaduras de segundo e terceiro graus em várias partes do corpo ao substituir postes de madeira por de concreto numa propriedade rural. Ele trabalhava na empresa desde 2003 na montagem de linhas elétricas de alta e baixa tensão. O acidente resultou, entre outras sequelas, na redução de um dos testículos e o obrigou a se submeter a cirurgia para enxertos no pênis. No laudo dermatológico, o perito atestou que as cicatrizes resultantes das queimaduras cobriam aproximadamente 70% da superfície corporal.

Lesões

O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) registrou que o empregado tinha apenas 29 anos de idade na época do acidente e que as graves e extensas lesões físicas e neurológicas sofridas por ele comprometeram sua possibilidade de seguir um plano de vida pessoal e profissional. Segundo o TRT, a culpa da empresa, por negligência e imperícia na análise do risco da atividade realizada pelo empregado, é grave, e o fato de ter auxiliado em sua recuperação não a isenta da obrigação de reparar os danos estéticos e o comprometimento do projeto de vida. Fixou, assim, a indenização em R$ 120 mil.

Desproporcionalidade

A relatora do recurso de revista do eletricista, ministra Kátia Arruda, considerou demonstrada a falta de proporcionalidade entre os fatos e os montantes arbitrados pelo TRT pelas lesões extrapatrimoniais relativas aos danos estéticos e aos danos ao projeto de vida. Ela destacou que o empregado teve diversas limitações de movimento, apresenta cicatrizes extensas pelo corpo e não pode realizar esforço físico ou se expor ao sol. “Teve ceifado o direito de seguir a carreira de eletricista escolhida, ou mesmo de iniciar outra carreira por meio do estudo, especialmente em razão do déficit de cognição resultante do acidente”, assinalou.

Projeto de vida

Para a ministra, é evidente o dano ao projeto de vida do empregado decorrente de lesão nos órgãos reprodutores (0% de vitalidade), que lhe retirou a possibilidade de reprodução e, com isso, de criação de uma família natural. Ela observou ainda que essa perda estética também atinge a imagem do eletricista, repercute em sua esfera íntima e gera dano de difícil mensuração.

De acordo com a perícia, as lesões se estendem pelo dorso, pelos membros inferiores e superiores, pelo pescoço e pelo abdome. O laudo indica ainda extensa retração fibrótica no pé esquerdo, com perda de substância, que dificulta a locomoção.

Dano material

Além da majoração do valor da indenização pelos danos estéticos e ao projeto de vida, a relatora determinou a inclusão dos valores relativos ao auxílio-alimentação no cálculo da pensão decorrente da incapacidade permanente para o trabalho.

O recurso ficou assim ementado:

I – AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E ANTERIORMENTE À IN Nº 40/2016 E À LEI Nº 13.467/2017. PRELIMINAR DE NULIDADE PROCESSUAL – DEVIDO PROCESSO LEGAL. ACIDENTE DE TRABALHO – CULPA DO EMPREGADOR. INCAPACIDADE PERMANENTE PARA TRABALHO. DANO MORAL E MATERIAL – VALORES ARBITRADOS. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA

1 – A Lei nº 13.015/2014 exige que a parte indique, nas razões recursais, o trecho da decisão recorrida no qual se consubstancia o prequestionamento. Frise-se que é dever da parte não só indicar o trecho da controvérsia, mas também, em observância ao princípio da dialeticidade, fazer o seu confronto analiticamente com a fundamentação jurídica invocada pela parte nas razões recursais.

2 – Caso em que a parte deixou de transcrever em recurso de revista qualquer trecho do acórdão do TRT que demonstrasse o prequestionamento das matérias objeto do pedido de reforma.

3 – Não atendido o requisito de que trata o art. 896, §1º-A, I, da CLT.

4 – Agravo de instrumento a que se nega provimento.

 

II – RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E ANTERIORMENTE À IN Nº 40/2016 E À LEI Nº 13.467/2017. ACIDENTE DE TRABALHO. INDENIZAÇÕES POR DANOS EXTRAPATRIMONIAIS (MORAIS, ESTÉTICOS E “PROJETO DE VIDA”). ARBITRAMENTO DE VALORES.

O reclamante desde a petição inicial postulou indenização por danos morais no valor de R$ 500.000,00, indenização por danos estéticos no valor de R$ 300.000,00 e indenização por danos ao projeto de vida de R$ 400.000,00.

Não há como discutir o montante dos danos morais em sentido estrito, pois não consta nos trechos transcritos qual foi o montante fixado no TRT. Nesse particular, aplica-se o art. 896, § 1º-A, I, da CLT.

Está demonstrada a falta de proporcionalidade entre os fatos provados, constantes nos trechos transcritos, e os montantes fixados pelo TRT a título de lesões extrapatrimoniais relativos a danos estéticos (R$ 60 mil) e a danos a projeto de vida (R$ 60 mil).

Devem ser majorados os montantes para R$ 120 mil (danos estéticos) e R$ 120 mil (danos ao projeto de vida).

Caso em que o TRT delimitou os seguintes aspectos fáticos: Cumpre referir que a culpa da reclamada, no caso, é grave, tendo agido com negligência e imperícia na análise de risco da atividade a ser realizada por seu empregado”; “observo que o reclamante contava com apenas 29 anos à época do acidente,  tendo sofrido graves e extensas lesões, físicas e neurológicas, que comprometem sua possibilidade de seguir um plano de vida pessoal e profissional. Com efeito, não há como entender que um trabalhador com diversas limitações de movimento, que apresenta cicatrizes extensas pelo corpo e não pode realizar esforço físico ou se expor ao sol tenha as mesmas condições de construir uma carreira que um trabalhador sem esses problemas. O reclamante, no caso, teve ceifado o seu direito a seguir na carreira inicialmente escolhida, como eletricista, ou mesmo a iniciar outra carreira, através do estudo, especialmente em razão do déficit de cognição resultante do acidente; “evidente o dano ao projeto de vida do empregado em decorrência da lesão sofrida em seus órgãos reprodutores, tendo sido constatado, após o acidente, o grau de vitalidade 0%, conforme espermograma da fl. 101. O reclamante foi atingido, dessa forma, em esfera extremamente íntima de sua natureza humana, tendo-lhe sido retirada a possibilidade de reprodução e, com isso, a possibilidade de criação de uma família natural”; Com efeito, o laudo dermatológico confirma a existência de cicatrizes das queimaduras sofridas (que cobriam aproximadamente 70% da superfície corporal do empregado), referindo que apresentam coloração castanho atrófico, sendo discrômicas e se estendendo pelo dorso, membros inferiores e superiores, pescoço e abdome. Também indica a existência de extensa retração fibrótica na planta e cavum do pé esquerdo, com perda de substância, que dificultam a deambulação. A prova dos autos indica, ainda, a existência de lesões nos órgãos genitais do autor, que sofreu enxertos no pênis e teve redução de um dos testículos; As queimaduras sofridas pelo reclamante, bem como a perda de substância do pé e a deambulação claudicante, acarretam evidente e grave impacto à imagem pessoal do autor, influenciando não apenas em sua relação com a sociedade na qual convive, mas também, em suas relações afetivas. Além disso,  a perda estética relativa aparte dos órgãos genitais também atinge fortemente a imagem do empregado, repercutindo em sua esfera íntima e gerando dano de difícil mensuração”.

Recurso de revista a que se dá provimento parcial.

ACIDENTE DE TRABALHO. INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. PENSÃO MENSAL.

1 – A remuneração engloba todos os ganhos referentes ao contrato de trabalho e que possam ser usufruídos pelo trabalhador, a exemplo de benefício para custeio da alimentação.

2 – Por tal razão, o cálculo da pensão mensal decorrente da perda permanente de capacidade para o trabalho deve ter como base a remuneração integral do reclamante.

3 – Recurso de revista a que se dá provimento.

ACIDENTE DE TRABALHO. INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. PRETENSÃO DE PAGAMENTO EM PARCELA ÚNICA. ALEGADO ATRASO NO PAGAMENTO DE PENSÃO MENSAL.

O reclamante alega que, não obstante não tenha formulado pedido de pagamento da pensão mensal em parcela única em “instâncias inferiores”, aduz referido pedido neste momento processual porque há atrasos nos pagamentos desde agosto de 2015. Fundamenta o pedido no art. 950, parágrafo único, do Código Civil.

O fato superveniente vem desacompanhado de prova. Por outro lado, a controvérsia sobre atraso na execução provisória deve ser submetida à apreciação do juízo da execução.

Recurso de revista de que não se conhece.

A decisão foi unânime.

Processo: ARR-35-38.2012.5.04.0701

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