Ela era alvo de insultos de perseguição por estar acima do peso.
A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho confirmou a condenação da Sodexo do Brasil Comercial S.A. a pagar indenização a uma cozinheira que sofreu assédio moral praticado por sua chefe. O tipo de constrangimento praticado pode ser classificado, em tese, como gordofobia. Pela reiteração ostensiva do assédio durante todo o contrato de trabalho e por considerar gravíssimo o grau de culpa da empresa, a Turma decidiu que o valor arbitrado para reparação por danos morais deveria ser majorado de R$ 15 mil para R$ 30 mil.
Cotidiano de assédio
Na petição que deu início à ação, a cozinheira contou que, além dessa função, fazia trabalho de açougueira e serviços gerais de limpeza. Ela relatou que, no cotidiano de trabalho, era constantemente alvo de insultos, pressões psicológicas desproporcionais e perseguição praticados por sua superiora hierárquica, uma nutricionista, por estar acima do peso e pelas limitações geradas em decorrência de doenças que sofria.
Chamada de “gorda”, “burra”, “incompetente” e “irresponsável aos gritos, diante dos outros empregados, ela disse ainda que, após se submeter a cirurgia bariátrica, passou a sofrer de depressão e teve de ficar afastada por cerca de três anos.
Conduta abusiva
A empresa foi condenada pelo juízo de primeiro grau a pagar R$ 15 mil de indenização, valor mantido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR). O TRT considerou abusiva a conduta da nutricionista, mas entendeu que a quantia era “condizente e razoável” com o dano provocado.
No recurso de revista, a cozinheira sustentou que, apesar de reconhecer o assédio, o TRT não elevou o valor da indenização, segundo ela “extremamente módico e irrisório” para as empresas envolvidas.
Culpa gravíssima
Para a relatora do recurso, ministra Kátia Magalhães Arruda, o valor arbitrado não observou o princípio da proporcionalidade. “Além da gravidade dos infortúnios e da extensão dos danos, importa ponderar a culpa da empresa, que, ao contrário do que diz o TRT, não foi mediana, mas gravíssima”, afirmou.
Na avaliação da ministra, a Sodexo não zelou pelo ambiente de trabalho de maneira mínima para impedir que sua preposta tratasse a empregada de maneira reiteradamente abusiva durante todo o contrato. “A ela eram constantemente atribuídos adjetivos constrangedores, de maneira agressiva, aos gritos, na frente dos demais funcionários”, assinalou.
Segundo a ministra, a conduta da nutricionista poderia, em tese, ser enquadrada na hipótese de discriminação (tratamento abusivo em razão de condição pessoal da trabalhadora, ou gordofobia).
O recurso teve a seguinte ementa:
I- AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.015/2014 E INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RECLAMADA. INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. DOENÇA OCUPACIONAL.
1 – O art. 5º, X, da CF/88 foi invocado apenas nas razões de agravo de instrumento, caracterizando-se inovação recursal, o que não se admite.
2 – Os trechos da decisão recorrida, transcritos no recurso de revista, não demonstram o prequestionamento quanto à alegada violação dos arts. 5º, II, da CF/88, 818 da CLT e 373, I, do CPC (art. 896, § 1º-A, I, da CLT) .
3 – Agravo de instrumento a que se nega provimento .
HORAS EXTRAS. PRESTAÇÃO HABITUAL. ACORDO DE COMPENSAÇÃO DE JORNADA. INVALIDADE.
O TRT consignou que não houve a juntada dos controles de jornada pela reclamada, o que enseja a presunção de veracidade da jornada descrita na exordial e de que havia constante labor extraordinário, conforme se verifica na jornada fixada em sentença. Diante desse contexto, concluiu aquela Corte que o sistema de compensação de jornada era materialmente inválido. Também disse o TRT que a norma coletiva não foi observada do ponto de vista formal.
Por conseguinte, para se concluir de modo contrário, seria necessário analisar o conjunto fático probatório dos autos, o que é vedado, nos termos da Súmula nº 126 do TST.
Quanto a matéria de direito, relativamente à distribuição do ônus da prova, aplica-se a Súmula nº 338 do TST.
Agravo de instrumento a que se nega provimento.
INTERVALO INTRAJORNADA.
Aplica-se a Súmula nº 437 desta Corte, que em seu texto aglutinou a OJ nº 307 da SBDI-1, que interpreta o art. 71, § 4º, da CLT: ” I – Após a edição da Lei nº 8.923/94, a não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento total do período correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT), sem prejuízo do cômputo da efetiva jornada de labor para efeito de remuneração” .
Agravo de instrumento a que se nega provimento .
INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ASSÉDIO MORAL.
As premissas do acórdão recorrido, a partir da análise da prova produzida, permitem concluir que ficou configurado o assédio moral sofrido pela reclamante, situação que lhe causava abalo de ordem emocional (tratamento grosseiro e desrespeitoso no ambiente de trabalho).
Para acolher a versão recursal de que não ficaram configurados os requisitos caracterizadores da responsabilidade civil seria necessário o revolvimento dos fatos e provas dos autos, inviável em recurso de revista a teor da Súmula nº 126 do TST .
Agravo de instrumento a que se nega provimento .
II – AGRAVOS DE INSTRUMENTO EM RECURSOS DE REVISTA. RECLAMADA E RECLAMANTE. MATÉRIA COMUM. ANÁLISE CONJUNTA. LEI Nº 13.015/2014 E INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. VALOR ARBITRADO.
Demonstrada a viabilidade do conhecimento do recurso de revista da reclamante por provável violação do art. 5º, V, da Constituição da República.
Agravo de instrumento da reclamante a que se dá provimento para melhor exame do recurso de revista no qual se pretende a majoração da indenização por danos morais.
Prejudicado o agravo de instrumento da reclamada no qual se pretende a redução do montante da indenização por danos morais.
III – RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.015/2014. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RECLAMANTE. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. VALOR ARBITRADO.
No caso dos autos, constata-se que o valor arbitrado em R$ 15.000,00 a título de indenização por danos morais não observou o princípio da proporcionalidade.
Além da gravidade dos infortúnios e da extensão dos danos, importa ponderar a culpa da reclamada que, ao contrário do que diz o TRT, não foi mediana, mas gravíssima .
A empresa não zelou pelo ambiente de trabalho de maneira mínima, com o fim de impedir que sua preposta tratasse a reclamante de maneira reiteradamente abusiva, gerando, nas palavras da própria Corte Regional, indescritível constrangimento, vergonha e humilhação.
A autora sofreu persistente assédio moral por parte da preposta durante todo o contrato de trabalho .
No cotidiano do ambiente laboral a autora era insultada, menosprezada, sofria com pressões psicológicas desproporcionais, era perseguida em virtude de estar acima do peso e pelas limitações geradas em decorrência das doenças sofridas.
À reclamante eram constantemente atribuídos adjetivos constrangedores, de maneira agressiva, aos gritos, na frente dos demais funcionários . Em tese seria possível enquadrar a conduta da preposta até mesmo na hipótese de discriminação (tratamento abusivo em razão de condição pessoal da reclamante – gordofobia) . Dada a gravidade dos fatos, a reiteração ostensiva durante todo o contrato de trabalho, e o grau de culpa gravíssimo da empresa, deve ser majorado o valor arbitrado a título de indenização por danos morais para R$ 30.000,00 (trinta mil reais).
Recurso de revista a que se dá provimento.
Por unanimidade, a Turma deu provimento ao recurso de revista e fixou o valor de R$ 30 mil para a reparação.
Processo: ARR-1036-93.2014.5.09.0072