A 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) deu provimento parcial a União e negou a apelação do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) contra a sentença que julgou procedente o pedido de uma mulher de concessão da pensão vitalícia, cabendo ao INSS operacionalizar o pagamento da indenização.
A União argumentou que a sua ilegitimidade passiva, uma vez que o responsável pela execução e manutenção da pensão vitalícia é o INSS, por isso não haveria motivo para que permaneça na ação. O INSS, por sua vez, alegou que a indenização é de responsabilidade da União, além de afirmar que não haveria provas da relação entre a deficiência física da autora e o uso de talidomida, por essa razão a mulher não teria direito ao benefício.
A relatora, desembargadora federal Candice Lavocat Galvão Jobim, sustentou que a apelação da União merece ser acolhida, visto que, apesar de a União repassar o recurso financeiro, o responsável pelo pagamento e manutenção é o INSS. A relatora destacou que, apesar de não conclusivos os dois laudos periciais, realizados por um clínico geral e um geneticista, ficou comprovada a deficiência física no braço esquerdo, como possível decorrência do uso da talidomida, feito pela sua mãe durante a gestação. Logo, há indícios que conduzem a essa narrativa, inclusive diante do fato de ter sido gerada na década de 1960, ocasião em que não havia proibição da substância no mercado brasileiro.
“Como bem assinalou a sentença, há em favor da conclusão pela síndrome da talidomida a idade da acionante, que condiz com o histórico trazido do uso indevido da substância no Brasil, a compatibilidade entre a deformidade apresentada e as consequências características da ingestão da substância na gravidez, bem como a ausência de histórico de doenças genéticas na parte autora e nos seus familiares” afirmou a relatora.
O recurso ficou assim ementado:
PENSÃO ESPECIAL VITALÍCIA. LEI 7.070/1982. “SÍNDROME DE TALIDOMIDA”. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. ELEMENTOS COMPROBATÓRIOS NÃO INFIRMADOS EM RECURSO. CABIMENTO DA PENSÃO. APELAÇÃO DA UNIÃO PARCIALMENTE PROVIDA E APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA.
1. Trata-se de recursos de apelação, interpostos pela União Federal e pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, contra sentença (ID 270186138) que julgou “procedente o pedido de concessão da pensão especial vitalícia prevista na Lei nº 7.070/1982, extinguindo o processo com resolução do mérito, com espeque no art. 487, I, do CPC, devendo o INSS proceder à operacionalização do pagamento da indenização devida, cabendo à União a inclusão, e respectivo repasse, de dotações específicas em seu orçamento, para essa finalidade.”
2. A União, nas suas razões recursais, alega ilegitimidade passiva, uma vez que o órgão responsável pela execução e pela manutenção da Pensão Vitalícia pleiteada é o INSS. Afirma não haver razão “que justifique a permanência da União no presente feito, na condição de litisconsorte passivo necessário, posto que restou cabalmente demonstrado que cabe à União apenas o aporte dos recursos financeiros necessários à manutenção dos referidos benefícios, o que, todavia, não é suficiente para legitimá-la para a lide.”
3. O INSS, na sua peça recursal, alega ilegitimidade passiva quanto ao pedido indenizatório, com base na Lei nº 12.190/2010, argumentando que tal indenização é de responsabilidade da União. No mérito, afirma inexistência de prova da síndrome da talidomida, uma vez que não demonstrada que a causa da deficiência decorre de ingestão da talidomida, devendo, ainda, revelar o laudo pericial o grau de incapacidade para o trabalho e para a vida independente.
4. A controvérsia central diz respeito ao pleito de pensão mensal vitalícia prevista na Lei nº 7.070, de 20 de dezembro de 1982, em razão de deformidade congênita atribuída ao uso do medicamento Talidomida durante a gestação.
5. A preliminar de ilegitimidade passiva da União para a demanda, em litisconsórcio com o INSS, merece acolhida. Dispõe o art. 4º da Lei nº 7.070/1982 que “a pensão especial será mantida e paga pelo Instituto Nacional de Previdência Social, por conta do Tesouro Nacional.” Acerca do tema, já decidiu o STJ que, apesar de ser a dotação orçamentária proveniente da União, o INSS é o responsável pelo pagamento e pela manutenção do benefício previsto na Lei nº 7.070/82. Portanto, não há que se falar em litisconsórcio passivo necessário, à analogia dos casos de benefícios assistenciais, sendo certo que o litisconsórcio passivo é indispensável apenas se a União for responsável diretamente pelo pagamento.
6. A Lei nº 7.070/1982 dispõe sobre a pensão especial mensal, vitalícia e intransferível aos portadores da “Síndrome da Talidomida”. Por sua vez, a Lei nº 12.190/2010, regulamentada pelo Decreto 7.235, de 19 de julho de 2010, concedeu o direito à reparação por danos morais às pessoas portadoras da mesma enfermidade. Na hipótese dos autos, concluiu a sentença pela ocorrência de prescrição da pretensão indenizatória relativamente ao pagamento da indenização por dano moral às pessoas portadoras de talidomida, com previsão na Lei nº 12.190/2010, decisão que se mantém por ausência de impugnação.
7. Relativamente ao pagamento da pensão vitalícia, ponderou a sentença que, apesar de não conclusivos os dois laudos periciais elaborados, um por médico clínico geral, outro por geneticista, ficou comprovada a deficiência física no membro superior esquerdo como possível decorrência de uso da substância talidomida por sua genitora durante a gestação. Logo, há indícios que conduzem a essa inferência, inclusive diante do fato de ter sido gerada na década de 1960, ocasião em que não havia proibição do fármaco no mercado brasileiro. Nessa perspectiva, diante do contexto narrado e da ausência de óbice que impeça a configuração da hipótese da teratogenia pelo uso da talidomida, não prevalecem as razões dos recursos de apelação.
8. Apelação da União parcialmente provida, no que se refere à sua ilegitimidade passiva para a causa. Apelação do INSS improvida. Honorários recursais, a teor do art. 85, §11, do CPC, ora acrescidos em 2% do valor originalmente arbitrado, em desfavor do INSS.
Por unanimidade, a 2ª Turma manteve a sentença.
Processo: 1000001-64.2018.4.01.3300