Comunicação pelo Banco Central à polícia de fato que pode configurar crime é cumprimento do dever legal e não enseja indenização a investigado

A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais a um homem que, por suposta fraude, teria sido forçado a devolver indenização que lhe foi paga no âmbito do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro). Segundo o processo, seu nome foi incluído no cadastro de pessoas impedidas de contratar pelo Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR). Ele apelou ao TRF1 da sentença que negou seu pedido de indenização por dano material e moral, lucros cessantes, e pronunciou a prescrição de seu direito.

Na ação contra o Banco Central do Brasil e a União, o autor pediu ainda a devolução do valor que teve de restituir ao Proagro, mas o juízo federal da 1ª Vara da Seção Judiciária de Goiás (SJGO) pronunciou a prescrição quinquenal (de cinco anos) e excluiu a União do polo passivo (ré) da ação, o que não foi questionado no recurso.

O recorrente sustentou na apelação que o fato lesivo à sua pessoa ocorreu mais de 10 anos antes do novo Código Civil (NCPC) e, com isso, a prescrição seria de 20 anos, de acordo com o código civil antigo. Argumentou ainda que a instauração do inquérito policial teria suspendido a contagem do prazo de prescrição.

Danos morais – Relator do processo, o juiz federal convocado pelo TRF1, Paulo Ricardo de Souza Cruz, verificou que o art. 1º do Decreto 20.910/1932 e o art. 2º do Decreto-lei 4.597/1942 combinados indicam que a prescrição de ações contra o Banco Central é de 5 anos, não cabendo a aplicação das normas sobre o tema contidas no CC.

Em recurso administrativo o autor já tinha recebido o valor da indenização pelo Proagro, e o Banco Central já tornou sem efeito o impedimento para operar com o crédito rural mais de 5 anos antes de proposta a ação indenizatória, constatou o magistrado.

“Por outro lado, a referida prescrição quinquenal não se suspendeu durante a tramitação do inquérito policial instaurado contra o autor para apurar eventual participação na falsificação de documento (nota-fiscal)”, prosseguiu Souza Cruz.

Quanto ao pedido de indenização pelos danos morais “único pedido em relação ao qual não se operou a prescrição”, destacou o relator, conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), está “correta a sentença recorrida, uma vez que o Banco Central do Brasil tinha o dever do comunicar às autoridades policiais possível ocorrência de ilícito penal, não decorrendo o dever de indenizar do posterior arquivamento da apuração”, concluiu.

O recurso ficou assim ementado:

ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL DAS AÇÕES DE RESPONSABILIDADE DAS AUTARQUIAS. COMUNICAÇÃO DE FATO SUPOSTAMENTE DELITUOSO QUE LEVA À INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL POSTERIORMENTE ARQUIVADO. ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL. INEXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.

1. Na origem, trata-se de ação em que o autor formulou pedido de indenização por, em virtude de suposta fraude, ter sido forçado a devolver indenização que inicialmente lhe foi paga no âmbito do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária – Proagro, com a proibição de realizar operações de crédito rural e a submissão a inquérito policial.

2. Não tendo havido qualquer tipo de ataque específico ao fundamento da sentença para proclamar a ilegitimidade passiva da União, é de ser mantida a extinção do processo sem julgamento do mérito em relação a esta.

3. Por força do art. 1º do Decreto 20.910/1932 c/c art. 2º do Decreto-lei nº 4.597, de 19 de agosto de 1942, a prescrição aplicável às ações contra o Banco Central do Brasil é a quinquenal, incabível a pretensão de aplicação das normas do Código Civil.

4. Se em 06/01/1998 o autor já havia recebido administrativamente o valor da indenização pelo Proagro que lhe foi reconhecida em recurso administrativo e em 02/06/1997 o Banco Central já havia tornado sem efeito o impedimento para operar com crédito rural, é certo que, em 17/03/1998, quando ajuizada a ação, já haviam decorridos mais de 5 anos dos fato que são apontados como fundamento da pretensão indenizatória, não tendo a pendência de inquérito policial relativo a alegação de falsidade de documento fiscal o condão de suspender o prazo prescricional, salvo quanto à pretensão indenizatória decorrente da própria existência do inquérito.

5. “Em regra, a comunicação à autoridade policial de fato que, a princípio, configuraria crime ou o pedido de apuração de sua existência e autoria, suficientes a ensejar a abertura de inquérito policial, corresponde ao cumprimento de um dever legal e exercício regular de direito, não ensejando responsabilidade indenizatória o posterior malogro do procedimento criminal.“ (STJ, AgInt no AREsp 1.955.126/MG, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 14/02/2022).

6. Apelação não provida.

O colegiado, por unanimidade, manteve a sentença e negou provimento ao recurso.

Processo: 0003739-84.2003.4.01.3500

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