É de competência da Justiça comum estadual o julgamento de ações que discutem o direito de ex-empregado, aposentado ou demitido sem justa causa, de permanecer em plano de saúde coletivo oferecido pela empresa empregadora aos trabalhadores ativos, na modalidade de autogestão.
O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao analisar recurso especial que discutia a Justiça competente – se a comum ou a trabalhista – para julgar a validade de decisão de empresa empregadora que, na qualidade de operadora de plano de saúde de autogestão destinado ao pessoal ativo, negou pedido de permanência feito por um ex-empregado.
“A Justiça competente para o exame e julgamento de feito (fundado nos artigos 30 e 31 da Lei 9.656/98) que discute direitos de ex-empregado aposentado ou demitido sem justa causa de permanecer em plano de saúde coletivo oferecido pela própria empresa empregadora aos trabalhadores ativos, na modalidade de autogestão, é a Justiça comum estadual, visto que a causa de pedir e o pedido se originam de relação autônoma nascida com a operadora de plano de saúde, a qual possui natureza eminentemente civil, envolvendo tão somente, de maneira indireta, os aspectos da relação de trabalho”, afirmou o relator do recurso especial, ministro Villas Bôas Cueva.
Evolução jurisprudencial
O ministro explicou que, em relação aos planos de saúde em geral, o STJ possui o entendimento de que compete à Justiça comum estadual o julgamento das ações relativas aos contratos de cobertura médico-hospitalar, a exemplo da manutenção em planos de saúde.
Nos casos em que a ex-empregadora mantém o próprio plano de saúde em favor de seus empregados na modalidade de autogestão, todavia, o STJ tinha jurisprudência no sentido de reconhecer a competência da Justiça do Trabalho, já que a discussão sobre o direito à permanência no plano tinha relação direta com o contrato de trabalho extinto.
Segundo o ministro, esse posicionamento se justificava antes da edição da Lei 9.656/98 (que regulamenta os planos de saúde), da Lei 9.961/00 (que criou a Agência Nacional de Saúde – ANS) e da Lei 10.243/01 (que deu nova redação ao artigo 458 da Consolidação das Leis do Trabalho). À época, a relação jurídica entre usuário e entidade de autogestão era apenas uma derivação da relação de emprego, já que a regulação era feita por contrato de trabalho.
Após o surgimento desses diplomas legais, explicou o ministro, a saúde suplementar – incluídas as autogestões – adquiriu autonomia em relação ao direito do trabalho, e essas entidades, mesmo as empresariais, passaram a ser enquadradas como operadoras de planos de saúde e foram submetidas à fiscalização da ANS.
Relação civil
Com essa modificação de cenário, o relator apontou que as ações originadas de controvérsias entre usuário e entidade de autogestão não se adequam mais à esfera trabalhista, tendo em vista o caráter predominantemente civil da relação entre as partes, mesmo porque a assistência médica não integra o contrato de trabalho.
“Com maior razão, por já ter sido encerrado o seu contrato de trabalho, a pretensão do ex-empregado de manutenção no plano de assistência à saúde fornecido pela ex-empregadora não pode ser vista como simples relação de trabalho. Ao contrário, trata-se da busca de direito próprio de usuário contra a entidade gestora do plano de saúde, que pode ser a própria empresa antes empregadora, mas que, para efeitos de atuação na saúde suplementar, deverá possuir tanto um registro independente de funcionamento no órgão regulador quanto a aprovação de seus produtos (planos) pelo setor técnico”, concluiu o ministro ao confirmar a competência da Justiça comum.
Com a decisão da Terceira Turma, os autos serão remetidos à Justiça comum de São Paulo para julgamento da apelação.
Leia o acórdão.