A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, decidiu que, na hipótese de aval simultâneo, o avalista não tem o direito de exigir do coavalista, em ação de regresso, a sua parte proporcional nos encargos de empréstimo contratado exclusivamente para liquidar o débito avalizado. Segundo o colegiado, o direito de regresso do avalista que paga sozinho toda a dívida garantida abrange apenas aquilo que foi objeto do aval, na proporção da quota-parte de cada um.
De acordo com o processo, dois empresários prestaram aval, simultaneamente, em favor de uma empresa, tendo por objeto a integralidade de dívida representada por Cédulas de Crédito Bancário. Cobrado, um dos avalistas pagou a totalidade da dívida e, em seguida, ajuizou ação de regresso contra o coavalista.
Além de metade do valor da obrigação avalizada, o autor da ação cobrou a metade dos encargos de um empréstimo que ele contratou exclusivamente para liquidar a dívida. O juízo de primeiro grau julgou a ação parcialmente procedente, condenando o coavalista a pagar sua parte em relação à dívida liquidada, mas afastando o dever de dividir os encargos do empréstimo contratado.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), ao analisar o caso, entendeu que o réu não foi parte do contrato celebrado para quitar a dívida original e, portanto, não poderia ser submetido aos seus encargos.
Direito de regresso do avalista abrange somente o objeto do aval
A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso no STJ, afirmou que o aval simultâneo é regido pela regra comum da solidariedade passiva: os garantidores poderão cobrar do devedor principal a totalidade da dívida e terão o direito de regresso contra o coavalista apenas pela quota-parte de cada um.
“Assim, é possível concluir que, na hipótese de aval simultâneo, o avalista pode cobrar, regressivamente, do coavalista aquilo que despendeu sozinho para pagamento da dívida, na proporção da sua quota-parte”, declarou.
Entretanto, a relatora destacou que a eficácia do aval se limita àquilo que foi pactuado, não podendo o avalista ser cobrado para além da garantia ofertada. Desse modo, explicou a ministra, se um dos avalistas contrata empréstimo para poder pagar o débito avalizado, não será possível estender os efeitos desse contrato ao coavalista que dele não fez parte e que com ele não concordou, salvo se houver uma estipulação negocial em contrário.
“O empréstimo em questão foi celebrado entre avalista e mutuante, produzindo efeitos, portanto, somente entre as partes, sendo absolutamente estranho ao coavalista que com ele não guarda qualquer relação. Nesse sentido, o direito de regresso do avalista que paga, sozinho, toda a dívida garantida abrange, tão somente, aquilo que foi objeto do aval, na proporção da quota-parte de cada um”, concluiu a relatora ao negar provimento ao recurso especial.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. CIVIL E EMPRESARIAL. TÍTULOS DE CRÉDITO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. OMISSÃO. NÃO INDICAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO ART. 1.022 DO CPC. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. AVAL SIMULTÂNEO. SOLIDARIEDADE ENTRE AVALISTAS. DIREITO DE REGRESSO. PRINCÍPIO DA RELATIVIDADE DOS EFEITOS CONTRATUAIS.
1. Ação de cobrança ajuizada em 12/1/2015, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 21/9/2021 e concluso ao gabinete em 14/12/2022.
2. O propósito recursal consiste em dizer se: a) o acórdão recorrido conteria omissão; e b) o avalista pode cobrar regressivamente do coavalista os encargos do empréstimo contratado exclusivamente para liquidar a dívida em que ambos figuram como garantidores simultâneos.
3. O recorrente deixou de suscitar, como lhe competia, nas razões do recurso especial, ofensa ao art. 1.022 do CPC, o que evidencia a ausência de prequestionamento (Súmula 211 do STJ).
4. O aval “é uma garantia pessoal, específica para títulos cambiais, do cumprimento da obrigação contida no título. Trata-se de declaração unilateral de vontade autônoma e formal. O avalista não se equipara à figura do devedor principal, nada obstante a solidariedade quanto à obrigação de pagar” (REsp 1.560.576/ES, Terceira Turma, julgado em 02/08/2016, DJe de 23/08/2016).
5. Salvo estipulação negocial em contrário, em atenção ao princípio da relatividade dos efeitos contratuais, na hipótese de aval simultâneo, não pode o avalista cobrar, regressiva e proporcionalmente, do coavalista, além daquilo que foi despendido para pagamento da dívida avalizada, também os encargos de empréstimo contratado exclusivamente para liquidar o referido débito.
6. Na hipótese dos autos, não merece reforma o acórdão recorrido, pois não é dado ao recorrente o direito de cobrar do recorrido parcela dos encargos assumidos em contrato de mútuo celebrado com o objetivo de adimplir a dívida avalizada, notadamente porque não é possível estender os efeitos deste contrato ao coavalista que dele não fez parte e que com ele não anuiu.
7. Recurso especial conhecido em parte e, nesta extensão, não provido.
Leia o acórdão no REsp 2.060.973.